Dados da Ordem dos Médicos (OM) avançados à agência Lusa indicam que, em 2021, havia 4.360 médicos estrangeiros a exercer em Portugal, número que subiu para 4.503 em 2022, para 4.730 em 2023 e para 4.770 este ano.
Em 2024, as nacionalidades mais representadas entre esses médicos são: espanhola (35,4%), brasileira (26,9%), italiana (5,7%), ucraniana (3,9%), alemã (3,5%), cubana (3%), angolana (2%), colombiana (1,9%) e, com 1,5% cada, romena, francesa, cabo verdiana e guineense.
Comentando estes dados à Lusa, o bastonário da Ordem dos Médicos, Carlos Cortes, disse que para a OM não interessa a nacionalidade dos profissionais, mas sim as suas capacidades e habilitações para exercer a profissão.
“A ordem dos médicos tem inscrito um número crescente de médicos de outras nacionalidades e isso obviamente que é importante”, mas, defendeu, deviam ser dadas condições aos médicos portugueses a exercer no estrangeiro para que regressem ao Serviço Nacional de Saúde.
Anunciou a este propósito, que a OM vai remeter esta semana uma proposta à Assembleia da República, em que defende “condições especiais” de atratividade, além do programa Regressar, para estes médicos regressarem a Portugal.
Carlos Cortes defendeu ainda que há “um conjunto de esforços” que devem ser feitos para captar médicos para o SNS, independentemente da nacionalidade.
Sublinhou que a OM vê “com muito agrado” a presença de médicos estrangeiros em Portugal, mas vincou que têm de ser “médicos diferenciados”, com “as habilitações adequadas”, havendo um conjunto de mecanismos para fazer essa avaliação.
Os dados indicam que, em 2021, 122 médicos inscritos na OM necessitaram de requerer junto de uma universidade portuguesa o reconhecimento do título académico, número que subiu para 220 em 2022 e para 306 em 2023. Nos primeiros 10 meses deste ano, foram 212.
“Foram realizados 18 exames de especialidade em 2021 (um reprovado), 32 em 2022 (quatro reprovados), 35 em 2023 (quatro reprovados), e nove até ao momento em 2024 (dois reprovados)”, adiantam.
Trabalham também em Portugal 1.311 enfermeiros estrangeiros, a maioria do Brasil (469), seguidos de Espanha, com 294, segundo dados da Ordem dos Enfermeiros.
Há ainda profissionais dos países africanos de língua oficial portuguesa, nomeadamente de Angola (60), Cabo Verde (52), Guiné-Bissau (41), São Tomé (40) e Moçambique (5).
Os dados apontam também a existência de 55 profissionais oriundos da França, 39 da Ucrânia, 30 da Moldávia, 28 da Alemanha, 22 da Roménia, 18 da Inglaterra, 17 da Itália e outros 17 da Venezuela, entre outros países como a Rússia (17), Peru (15), Holanda (15), Polónia (12), Bélgica (8), Canadá (7) e EUA (7).
Em declarações à Lusa, o bastonário da OE, Luís Filipe Barreira, adiantou que o número de enfermeiros imigrantes se tem “mantido mais ou menos estável nos últimos anos”.
Questionado sobre a importância destes profissionais numa altura em que o SNS se debate com a falta de enfermeiros, o bastonário afirmou que o “mais importante” seria haver uma política de recursos humanos para fixar os enfermeiros portugueses.
“Formamos dos melhores enfermeiros do mundo” que depois emigram à procura de melhores condições de trabalho, lamentou, lembrando que faltam 14.000 enfermeiros no SNS, citando dados oficiais.
Para Luís Barreira, é preciso fazer um levantamento destas necessidades, “que são urgentes”, e delinear um plano de contratação.
“Este assunto tem sido alvo das reuniões pela senhora ministra da Saúde, que está sensibilizada para esta matéria, e espero que no ano de 2025 este levantamento venha a ser feito”, declarou, defendendo também ser necessário melhorar “as condições dos enfermeiros em Portugal” para que os que emigraram retornem.
Dados da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), publicados no documento “Plano de Recursos Humanos na Saúde 2030”, referem que o número de médicos estrangeiros no SNS aumentou de 902 em 2017 para 967 em 2023 (+7,2%) e o de enfermeiros de 515 para 684 (+32,8%).
A ACSS salienta que “o seu contributo pode ser determinante em certas regiões” como maiores dificuldade de recrutamento e da retenção de profissionais de saúde.
Justo veio com a ideia de ficar dois anos, agora já nã quer voltar
Justo Ruiz Lopez faz parte desta estatística desde que em 2003, com 24 anos, decidiu trabalhar em Portugal devido à dificuldade de conseguir trabalho em Espanha, onde a experiência era um requisito essencial para exercer em hospitais públicos ou num centro de saúde.
Incentivado pela irmã e pelo cunhado que já trabalhavam num hospital português, decidiu enviar currículos para vários hospitais e foi chamado pelo Hospital do Capuchos, em Lisboa, onde iniciou a sua carreira.
"Vim com a ideia de ficar por um ou dois anos e voltar. Mas muitas coisas mudaram e decidi ficar", disse o enfermeiro, que faz um balanço “totalmente positivo” da sua jornada em Portugal.
“Conheci muitas pessoas fantásticas que me ajudaram, me fizeram crescer a nível profissional e pessoal e não voltaria para Espanha”, sustentou, com convicção.
Ao ser questionado sobre as dificuldades que encontrou quando chegou ao país, Justo Ruiz Lopez comentou que “não foram muitas”, porque, por um lado, já vivia de uma forma independente e longe da família em Espanha, e por outro, foi “super bem acolhido” em Portugal.
Também não teve muita dificuldade com a Língua Portuguesa, pois a maioria de enfermeiros da sua equipa eram espanhóis e falavam português.
Embora reconheça que no início nem tudo “é um jardim de rosas”, o enfermeiro disse acreditar que a formação que teve em Espanha o preparou para o desafio. Apesar de nunca ter trabalhado no seu país, o que aprendeu nos estágios que realizou durante o curso era muito semelhante ao modo de trabalho que encontrou em Portugal.
Questionado sobre como observa a saída crescente de enfermeiros portugueses para trabalhar no estrangeiro, defendeu que é preciso o Estado valorizar mais os profissionais.
Ruiz Lopes reconhece que “a vida em Portugal não é fácil” e que os profissionais necessitem de ter um vencimento maior e por isso procuram uma oportunidade noutro país. “Não queremos ganhar mais do que os outros, queremos ganhar aquilo que merecemos”, defendeu.
Contou que, no seu caso, sempre teve como motivação “ter um contrato”, o que em Espanha não ia acontecer. “Em Portugal, embora ainda haja muita coisa que o Governo deve fazer pelos enfermeiros, tem uma coisa boa que é contratar enfermeiros”, comentou.
Enalteceu também a formação de enfermagem em Portugal, mais uma razão para o Governo tomar medidas para que os profissionais fiquem no seu país.
“Quando cheguei fiquei muito surpreendido, para o bem, porque realmente as pessoas são muito bem preparadas”, vincou, contando que foi em Portugal que se especializou em saúde materna e obstétrica, profissão que exerce na Maternidade Alfredo da Costa, em Lisboa.
Para este enfermeiro, “não há trabalho mais bonito” do que ajudar a nascer um bebé: “O nosso objetivo final é que acabe num final feliz” e que a família vá para casa com “uma experiência de parto positiva, um parto humanizado”.
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