O primeiro caso da MIS-C foi reportado na Unidade de Infecciologia do Hospital Dona Estefânia, em Lisboa, em abril de 2020, mas a subida das infeções que ocorreu no início deste ano fez aumentar também o número de diagnósticos deste síndrome, noticia hoje o Jornal de Notícias.
Ao todo, três hospitais contactados pelo diário registam 83 casos, 47 dos quais concentrados no Hospital Dona Estefânia, resultado da explosão de novos casos de covid-19 em janeiro e fevereiro, o que fez com que esta instituição de saúde tivesse"três vezes mais casos do que no resto do ano inteiro", indica Maria João Brito, da Unidade de Infecciologia do hospital lisboeta.
Nos outros hospitais contactados —Hospital de Santa Maria, em Lisboa, e o Hospital de São João, no Porto — foram diagnosticados 16 casos em março no primeiro e 20 pelo final de dezembro no segundo.
Mais de metade dos casos diagnosticados obriga ao internamento nos Cuidados Intensivos. Tal explica-se pelo facto da MIS-C ser "uma complicação rara, mas grave da covid-19", já que "atinge múltiplos órgãos e pode deixar cicatrizes nos órgãos quando há envolvimento cardíaco, respiratório ou neurológico", indica Maria João Brito.
A doença atinge especialmente o coração, sendo que no Hospital Dona Estefânia,"o envolvimento cardíaco ocorreu em 93,3% dos doentes, com miocardite".
O alerta a nível europeu quanto a esta doença foi dado em novembro de 2020, quando foi publicado um estudo descrevendo os seus efeitos na segunda revista mundial com maior impacto em Cardiologia, a Circulação.
O estudo concluiu que crianças com síndrome inflamatória multissistémica pediátrica devem ter acompanhamento específico para afastar manifestações cardiovasculares, como choque, arritmias cardíacas, derrame pericárdico e dilatação das artérias coronárias.
Já em março, a diretora da Unidade de Cuidados Intensivos pediátricos, Marisa Vieira, do Hospital de Santa Maria, indicou que este síndrome tem aparecido cerca de quatro semanas após a infeção e que "a maioria destas crianças foram assintomáticas".
Como estes doentes não tinham tido quaisquer sintomas de covid-19, não havia nenhum teste positivo realizado anteriormente e foi apenas pela análise serológica no hospital que se percebeu que tinham tido contacto com o vírus.
"O que havia era infeção anterior em contexto familiar, com pais ou avós que tinham sido positivos ao novo coronavírus quatro a seis semanas antes", afirmou.
A febre alta (39,5 graus) e que não cede facilmente (reaparece de quatro em quatro ou de seis em seis horas) é dos primeiros sintomas a manifestar-se.
Além da febre, estes doentes apresentavam ainda “uma componente gastrintestinal importante, com dor abdominal, diarreia e vómitos”, e, nalguns casos, “alguma disfunção cardiovascular, com sensação de desmaio e falta de força, o que, quando são internados, se percebe que está associado a alguma disfunção do coração”, explicou.
A boa notícia é que, em comparação com adultos, a mortalidade em crianças com a síndrome é incomum, apesar de uma elevação significativa nos marcadores bioquímicos de inflamação ou envolvimento multissistémico. Para além disso, a maioria das crianças tem conseguido recuperar o estado funcional prévio.
No entanto, há casos, como no Dona Estefânia, de alterações em exames cardíacos ou respiratórios. "Se estas alterações são transitórias ou permanentes ainda não sabemos", disse Maria João Brito.
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