“Tivemos uma oferta do senhorio e concluímos que não vale a pena estarmos aqui mais cinco anos”, conta à Lusa Manuel Figueiredo, atrás do balcão onde trabalha há 34 anos, no rés-do-chão do edifício do antigo hotel Frankfurt, na loja de que também é sócio.

Ao seu lado, Isabel Queiroz, 28 anos de Casa Frazão, sócia, funcionária, filha de um antigo funcionário, sublinha que a saída, “de comum acordo”, “foi uma decisão muito ponderada e tomada numa assembleia-geral de acionistas”.

“Ainda pensámos ir para outro lado, mas as rendas são insustentáveis. E a Casa Frazão é aqui”, afirma.

A partir dos anos 2000, os clientes começaram a diminuir, o que foi agravado com a crise em Portugal e, mais recentemente, com o decréscimo da procura por angolanos. As compras dos turistas foram compensando, mas não foram suficientes, apesar de a casa ter adaptado a oferta às “cores fortes” e aos “padrões grandes” de que “as estrangeiras gostam”.

À falta de clientes, assinalada por Manuel Figueiredo, junta-se a falta de seguidores para o negócio que o fundador, Manuel Alves Frazão, deixou em herança aos funcionários quando faleceu, num ramo em que “o serviço é muito personalizado”.

As mudanças na indústria têxtil também pesam nos ombros dos lojistas, refletidas numa difícil gestão de ‘stocks’, com os tecidos a virem quase totalmente do estrangeiro, a partir de encomendas fixas em cada estação.

“O risco fica todo do lado do lojista. Há 15, 20 anos, comprávamos 10 ou 20 metros, entretanto, se se vendia muito, mandava-se vir mais. Hoje em dia, só nos vendem o que está encomendado para cada estação”, explicou.

Nos últimos anos, a Frazão tem sido sobretudo a casa de partida para uma ‘toilette’, escasseando a procura por materiais para o guarda-roupa do dia-a-dia.

As Modistas de Lisboa, a funcionar desde 2012, confirmam esta tendência: “Vivemos essencialmente das festas, dos casamentos, dos bailes de finalistas, dessas tradições americanizadas que têm dado muito jeito estarem a ser importadas”, reconhece Susana Fernandes, ao som da rádio Radar, no pequeno ateliê da rua Luz Soriano com vista para os telhados do Bairro Alto e o rio Tejo.

“O fecho da Casa Frazão é uma preocupação para nós, enquanto modistas, porque há cada vez menos sítios onde as pessoas podem comprar tecidos, e isso também faz com que se retraiam de mandar fazer”, afirma Susana, corroborada pela sócia, Antoniya Boncheva, que trabalhou no ateliê da Casa Souza, estabelecimento histórico de tecidos da rua Garrett, até ao seu encerramento.

Recrutada pela Souza na Bulgária, país com fama de modistas competentes, através de um anúncio de jornal, Antoniya viu Lisboa mudar nos últimos 15 anos. Reconhece que “a cidade está menos degradada”, mas lamenta que “as lojas, agora, comecem a ter todas o mesmo aspeto”.

“Se um ET aterrar aqui não sabe se está na Baixa de Lisboa, Milão ou Bruxelas”, ironiza José Quadros, proprietário da Londres Salão, que vê “com pena” o encerramento do concorrente Frazão, admitindo que, tal como cresceu com o fecho da Casa Souza, vai “crescer seguramente agora também”.

José Quadros, inquilino da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, não tem falta de clientes, mas alerta: “O negócio corre bem, mas há rendas que, por muito bem que um negócio corra, não são possíveis de pagar, a não ser pelas grandes insígnias internacionais”.

“Há um ano e meio fomos chamados à Santa Casa e disseram-nos que tínhamos seis meses para sair. A Santa Casa acabou por rever a sua posição, nós entretanto ganhámos a classificação de Loja com História, e a situação, para já, é diferente”, contou, defendendo que os negócios históricos economicamente viáveis têm de ser defendidos, “com rendas razoáveis, em que os senhorios ganhem dinheiro, não financiem artificialmente os negócios, mas que não sejam rendas livres de mercado”.

Em busca das promoções da liquidação final, a Casa Frazão vive dias movimentados, a lembrar “a loucura” de outros tempos, mas só até dia 30 de junho, a data que ainda “parece um sonho” a Isabel Queiroz.

“Ainda não descemos à terra, quando formos entregar a chave é que vai ser mais complicado, mas já somos crescidos, temos de assumir os nossos atos. Foi melhor assim, as coisas estavam a ficar muito complicadas, muito no limite. Não se pode trabalhar no limite”, contou.