A Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) aprovou esta quinta-feira a criação de um fundo para compensar financeiramente as vítimas de abusos sexual no seio da Igreja Católica em Portugal.
A decisão foi comunicada, em Fátima, no final da Assembleia Plenária da CEP, a qual determinou que estas compensações financeiras serão atribuídas com “caráter supletivo”.
O que significa isto?
Na prática, qualquer pessoa que tenha sofrido de abuso por parte de algum membro da Igreja Católica pode pedir esta compensação financeira. Neste sentido, o apoio pode chegar a casos que “já tenham prescrito”, tanto à luz da lei civil como do direito canónico.
Para ter esta compensação é preciso pedir. Porquê?
Para D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, a decisão de limitar a atribuição de compensações a quem avance com o pedido pretende mostrar “respeito” pela vontade das pessoas, uma vez que só avança com esta solicitação quem assim o entender.
“Há pessoas que, à partida, dizem que não querem receber nada, porque não tem preço” o sofrimento infligido, lembrou o bispo.
Há um prazo para fazer o pedido?
Sim. “Para dar seguimento a este processo, a Assembleia definiu que os pedidos de compensação financeira deverão ser apresentados ao Grupo Vita ou às Comissões Diocesanas de Proteção de Menores e Adultos Vulneráveis entre junho e dezembro de 2024”.
Depois de apresentado, o que se segue?
Segundo o episcopado, “posteriormente, uma comissão de avaliação determinará os montantes das compensações a atribuir”. Esta comissão será integrada por especialistas de diversas valências.
As normas concretas do processo e a constituição desta comissão serão tornadas públicas em breve, já que terão de estar prontas em junho, segundo D. José Ornelas.
D. José Ornelas mostrou-se convicto de que o processo de reparação financeira não demorará muito tempo após a conclusão do período em que decorrerá a apresentação dos pedidos e que decorrerá até ao final deste ano.
As compensações advém de um fundo. Há um valor dado por cada diocese?
Quanto ao fundo a criar pela Igreja, e que “pode ser aberto a outras entidades que queiram colaborar”, segundo D. José Ornelas, “não tem montante definido”, nem as reparações têm “teto” estabelecido, o mesmo acontecendo com o que cada diocese contribuirá para o montante global, tendo em conta que as realidades das dioceses são diferentes.
O que levou os bispos a organizarem este sistema de compensações?
“Estas decisões inserem-se no caminho percorrido na Igreja em Portugal. Em comunhão com o sofrimento das vítimas, os bispos portugueses reafirmam o total compromisso de tudo fazer para a sua reparação e manifestam o desejo de que este processo de acolhimento, acompanhamento e prevenção seja um contributo para a atuação da sociedade em geral neste tema”, acrescenta o documento.
Quantos pedidos são esperados?
Nos últimos dias, Rute Agulhas, coordenadora do Grupo Vita, disse que 20 vítimas de abuso sexual no seio da Igreja Católica em Portugal já manifestaram a vontade de serem indemnizadas financeiramente pelos danos sofridos.
Este organismo, criado pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) na sequência do trabalho da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica - que ao longo de quase um ano validou 512 testemunhos de casos ocorridos entre 1950 e 2022, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de 4.815 vítimas –, adiantou ter “realizado um total de 56 atendimentos” e que estão “mais atendimentos agendados ainda para o presente mês de abril”.
A Igreja não fala no termo indemnizações. Porquê?
D. José Ornelas explicou o motivo no início da Assembleia Plenária da CEP. "Desde o início deste programa se levantou a questão de uma reparação ou compensação monetária que possa ser requerida por pessoas que foram vítimas de tais abusos como forma de justo contributo na superação do mal que lhes foi injustamente causado. Tem-se evitado ligar diretamente esta forma de agir com o conceito de indemnização ditada por um tribunal. O que se encontra agora em estudo, na presente assembleia da CEP, é uma reparação financeira que reconheça a dor de quem sobreviveu a estes abusos e às consequências que teve de suportar", evidenciou", frisou na altura.
Assim, lembrava que a conversa sobre este tema surge "como forma concreta de acompanhar o pedido reiterado de perdão, que comporta o reconhecimento do mal perpetrado e sofrido, a possível reparação das feridas e a prevenção para que estes sofrimentos não se repitam".
Como estão os inquéritos a denúncias de abusos na Igreja?
Segundo a informação atualizada sobre denúncias de alegados abusos sexuais na Igreja Católica cometidos por clérigos ou outras pessoas ligadas à instituição, dos 15 inquéritos abertos na sequência das 25 denúncias anónimas remetidas pela Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja Católica em Portugal, 13 já conheceram despacho de arquivamento.
A falta de indícios de crime, a impossibilidade de identificar vítimas e alegados abusadores, a morte dos denunciados ou a prescrição dos factos são as principais causas destes arquivamentos.
Apenas dois inquéritos permanecem em investigação no que resultou do trabalho desta comissão independente, criada pela própria igreja católica para estudar o problema, à semelhança do que já havia sido feito noutros países.
Quanto às denúncias remetidas pelo Grupo Vita, foram arquivadas 13 das 20 denúncias encaminhadas, quase todas por prescrição.
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