Em entrevista à agência Lusa a propósito das legislativas de 30 de janeiro, às quais o PAN – Pessoas–Animais–Natureza é candidato aos 22 círculos eleitorais, Inês Sousa Real considerou que “tem sido difícil fazer alguns avanços na nossa legislação”, no que diz respeito à proteção animal.

“Há aqui, de facto, uma tentativa de descrédito deste tema. Há forças conservadoras que se têm sentado ao lado dos lobbies que persistem nestas atividades, não só apenas no que respeita aos animais de companhia”, disse.

Em relação a estes animais, sublinha a vitória do PAN por ter conseguido “aprofundar o Código Penal e o Código de Processo Penal, há cerca de um ano, quando houve os incêndios de Santo Tirso”.

No caso dos demais animais, pelo contrário, “tem sido muito difícil”. E lamentou que, em pleno século XXI, persistam “atividades absolutamente bárbaras, como é o caso da tourada, que torturam um animal numa arena e procura-se elevar a espetáculo.

“Continua a existir uma franja do Parlamento que continua a dar eco a estes interesses, em contraciclo com aquela que é a vontade da sociedade civil, porque nós temos hoje a tauromaquia em declínio”, adiantou, indicando o CDS, o PCP, mas também a Iniciativa Liberal, o próprio PSD e algum PS como pertencentes a essa orla.

Para Inês Sousa Real, a situação deve-se “sobretudo a interesses sócio económicos”.

“Estamos a falar de setores que mexem com muito dinheiro. No caso da tauromaquia, por exemplo, estima-se que anualmente tenha beneficiado, em termos de apoios, mais de 18 milhões de euros. Se olharmos para outro tipo de apoios indiretos, como é o caso da Praça de Touros do Campo Pequeno [em Lisboa], estamos a falar de uma isenção de IMI [Imposto Municipal sobre Imóveis] de 12 milhões de euros anuais. Ao fim de uma década são 120 milhões de euros”.

“Se somarmos a isso os 90 milhões de euros que desapareceram no processo de insolvência da Sociedade de Renovação Urbana do Campo Pequeno, e que inclusivamente decorriam de um empréstimo do BCP, verificamos claramente que, quando andamos distraídos a discutir apaixonadamente o fim ou não da tauromaquia, há também todo um problema relacionado com a corrupção, neste caso do Campo Pequeno, e todo um problema também relacionado com os financiamentos públicos a esta atividade anacrónica”.

Para a líder do PAN, “se a torneira dos dinheiros públicos já tivesse sido fechada, essa atividade [tauromaquia] já teria acabado”.

O mesmo se passa com a caça: “Neste momento nós estamos a pagar à raposa para guardar o galinheiro. É o próprio governo que se posiciona ao lado do setor da caça, ao dizer que fazem serviços de apoio de vigilância da floresta. Nós não precisamos dos caçadores a guardar a floresta. Nós precisamos ter vigilantes da natureza a guardar a floresta, até porque os próprios vigilantes da natureza também têm um papel fiscalizador sobre a atividade cinegética que é hoje uma das atividades que mais prejudica as espécies e que mais nos conduz à extinção das espécies”.

E adiantou que, recentemente, o setor da caça levou “também mais 10 milhões de euros, por parte do Estado, para a atividade cinegética”.

Inês Sousa Real reconhece, contudo, que a proteção animal até registou avanços, mas porque “a matemática parlamentar” assim o exigiu.

“Tendo em conta que não temos um Governo com maioria absoluta, o voto do PAN torna-se imprescindível para que o Orçamento do Estado não seja rejeitado, em determinado tipo de contexto, com exceção deste ano, em que as forças políticas da esquerda optaram por rejeitar este Orçamento”.

Foi graças a essa evidência “matemática” que o PAN conseguiu “avançar estas causas, como foi o caso do aumento do IVA da tauromaquia ou até mesmo os menores de 16 anos deixarem de poder ir assistir às corridas de touros”.

O PAN reitera a disponibilidade para integrar um governo, com Inês Sousa Real a considerar essa possibilidade “um dos grandes desafios da democracia”.

“Se efetivamente queremos fazer avançar as nossas causas, temos de ter a capacidade de diálogo e a capacidade de negociar, sob pena de só fazermos oposição por oposição”, afirmou.

A decisão sobre o partido ou partidos para uma eventual aliança pós-eleitoral, com vista à formação de um governo, dependerá sempre de como isso poderá “fazer avançar mais” as causas do PAN.

“Independentemente daquela que seja a composição da Assembleia da República, aquilo que esperamos é que os populismos antidemocráticos não ganhem mais expressão, porque as pessoas não podem ver neste tipo de forças uma resposta para o que são as suas frustrações, as suas justas frustrações e preocupações”, referiu.

Disse ainda esperar que o Chega não aumente a sua votação. “Não precisamos de demagogia nem de circos montados. Precisamos de gente fortemente comprometida em combater a corrupção, em dar respostas para aquilo que é a crise sanitária, a própria crise socioeconómica, em garantir uma transição climática justa para todas as gerações e precisamos, de facto, de fazer essa reflexão na Assembleia da República”.

E é precisamente com o Chega que Inês Sousa Real se recusa a formular qualquer entendimento, sendo a sua “linha vermelha”. Isto apesar de reconhecer algumas dificuldades com outras forças políticas, como é o caso do CDS.

No entanto, ressalva que manteve alguma proximidade a este partido em algumas matérias, como a criminalização do abandono de pessoas idosas há matérias do ponto de vista social, a preocupação com as creches e o combate à pobreza infantil.

Lamenta ainda que uma das principais preocupações do seu partido – o combate à crise climática – não seja transversal a todas as forças políticas.

Para Inês Sousa Real, um bom resultado no dia 30 de janeiro passará por manter os quatro deputados eleitos em 2019 e aumentar esta representação, alargando as geografias dos seus eleitores.