“Ele já estava sob nossa vigilância e assim que a necessária documentação chegou prendemos este indivíduo, esta manhã, em Umhlanga Rocks, norte de Durban”, disse o porta-voz do comissário nacional da polícia sul-africana Vishnu Naidoo, à Lusa.

O porta-voz policial sul-africano adiantou que o ex-banqueiro, sobre quem pendia um mandado de detenção internacional, encontra-se detido numa esquadrada da polícia, em Durban, e comparecerá no Tribunal da Magistratura de Durban na segunda-feira como parte do processo de extradição.

“Está neste momento detido na esquadra e por razões de segurança não podemos identificar o nome da esquadra”, frisou.

Vishnu Naidoo explicou à Lusa que o ex-banqueiro foi detido “por volta das 07 da manhã” (05:00 em Lisboa), salientando que os pormenores da operação policial serão conhecidos em tribunal durante o processo judicial de extradição.

“Ele não será extraditado automaticamente, o tribunal deve decidir se é extraditável ou não”, sublinhou Vishnu Naidoo.

“Somos países-membros da Interpol e se não existisse esse relacionamento então não poderíamos executar o aviso vermelho, mas o facto de termos executado o aviso vermelho significa que podemos iniciar o processo de extradição, e agora vamos conduzi-lo nesse processo de extradição e o tribunal decidirá”, explicou.

Segundo o porta-voz nacional da Polícia sul-africana, o processo de detenção de João Rendeiro na África do Sul foi finalizado num encontro com a Polícia Judiciária realizado à margem da Assembleia Geral da Polícia internacional INTERPOL, em 24 de novembro, em Istambul, na Turquia.

“Encontrámo-nos com o comissário (de Polícia) português em Istambul, durante a assembleia geral da Interpol, onde tivemos um encontro bilateral, e o comissário português destacou a importância de assistirmos na detenção de João Rendeiro”, explicou à Lusa.

“Através da Interpol, temos relações com a Polícia portuguesa e o encontro reforçou a urgência de se finalizar o processo para a detenção e extradição deste homem”, adiantou o porta-voz nacional da Polícia da África do Sul à Lusa.

“Então esperámos que a documentação necessária fosse processada e rastreámos a movimentação desse indivíduo e assim que a documentação chegou, efetuámos a detenção esta manhã no norte de Durban”.

João Rendeiro ficou "surpreso" com a detenção e será presente às autoridades judiciárias nas próximas 48 horas, "para efeitos de decisão relativamente ao seu futuro, designadamente se será decretada a prisão preventiva", disse Luís Neves, Diretor Nacional da Polícia Judicária esta manhã, numa conferência de imprensa em Portugal.

Segundo Luís Neves, Portugal "tem ainda alguns formalismos a cumprir" com os parceiros sul-africanos, mas  "contrariamente ao que foi dito, há possibilidade de extraditar esta pessoa".

Já sobre a escolha da África do Sul como país de refúgio, Luís Neves diz que a PJ está "convencida" de que "foi um apoio pessoal inicial que lhe permitiu ser recebido e estar escondido nos primeiros tempos" e "que através de um determinado mecanismo legal que existe na África do Sul, através de algum investimento, que ele [Rendeiro] pudesse pensar que tinha a possibilidade de não ser extraditado. Mas desde o primeiro contacto que tivemos com os nossos parceiros vislumbramos que é possível extraditar", acrescentou.

O o ex-banqueiro tinha "uma autorização de residência emitida no dia 10 de novembro de 2021, e emitida como cidadão nacional".

João Rendeiro saiu do Reino Unido a 14 de setembro e entrou na África do Sul a 18 de setembro. Não andava disfarçado, "mas tinha muitos cuidados e não circulava livremente" na África do Sul. Todavia, foram registados "saídas e entradas nos países que fazem fronteira" com o país.

Neste período, João Rendeiro não só cometeu qualquer deslize, como "utilizou os meios tecnológicos mais avançados, que custam uma exorbitância, para poder comunicar de uma forma indetetável", adiantou.

A detenção teve lugar "hoje [sábado, 11 de dezembro] às 7h00 na República da África do Sul", confirmou Luís Neves.

O Caso BPP

O colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas, verificou-se em 2010, já depois do caso BPN e antecedendo outros escândalos na banca portuguesa.

Apesar da sua pequena dimensão, teve importantes repercussões devido a potenciais efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira.

Em maio deste ano, o tribunal condenou Rendeiro a 10 anos de prisão efetiva. Foram ainda condenados Salvador Fezas Vital a nove anos e seis meses de prisão, Paulo Guichard a também nove anos e seis meses de prisão e Fernando Lima a seis anos de prisão.

As condenações foram pelos crimes de fraude fiscal, abuso de confiança e branqueamento de capitais resultam de um processo extraído do primeiro megaprocesso de falsificação de documentos e falsidade informática.

Já anteriormente, em outro processo também relacionado com o BPP, Rendeiro tinha sido condenado a cinco anos e oito meses de prisão efetiva.

Em 28 de setembro, o ex-banqueiro foi condenado a três anos e seis meses de prisão efetiva num processo por crimes de burla qualificada.

Na origem deste julgamento está a queixa do embaixador jubilado Júlio Mascarenhas que, em 2008, investiu 250 mil euros em obrigações do BPP, poucos meses antes de ser público que a instituição liderada por João Rendeiro estava numa situação grave e ter pedido um aval do Estado de 750 milhões de euros.

Também neste processo estavam acusados os ex-administradores Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital (o único presente no tribunal). O primeiro foi condenado a três anos de prisão e o segundo a dois anos e seis meses de prisão.

O tribunal decidiu que os ex-gestores do BPP teriam ainda de pagar 225 mil euros por danos patrimoniais e 10 mil euros por danos morais a Júlio Mascarenhas.

Na sequência da decisão, João Rendeiro deu conta, de que não estava em Portugal e não pretendia regressar, por se sentir injustiçado.

Já o ex-administrador do BPP Paulo Guichard decidiu voltar do Brasil para Portugal, onde foi detido em 08 de outubro e libertado uma semana depois, por decisão do Supremo Tribunal de Justiça, depois de analisado o pedido de 'habeas corpus' apresentado pela sua defesa.

Em 04 de novembro, o Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa decidiu colocar a mulher de João Rendeiro em prisão domiciliária com vigilância eletrónica, por suspeitas de crimes ligados às obras de arte do ex-banqueiro e por considerar que havia perigo de fuga, perigo de perturbação do inquérito/investigação e perigo de continuação da atividade criminosa.

Maria de Jesus Rendeiro foi detida no âmbito da operação D’Arte Asas, dirigida pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal e executada pela Polícia Judiciária.

A mulher de João Rendeiro era fiel depositária dos quadros arrestados ao ex-banqueiro, considerando o tribunal que esta sabia das falsificações e do desvio das obras.

A prisão domiciliária da mulher não motivou o regresso do ex-banqueiro, que em 22 de novembro, em entrevista à CNN Portugal, disse que só regressava a Portugal se fosse “ilibado ou com indulto do Presidente [da República]”.

No mesmo dia, Marcelo Rebelo de Sousa disse que “já é tarde” para o ex-presidente do BPP pedir indulto para regressar a Portugal, adiantando que “não é possível sequer examinar”.

(Notícia atualizada às 13:51)