"É este o sentimento do povo português, das autoridades e também o da Comissão Europeia”, disse em entrevista à Lusa o presidente do executivo comunitário, que, na sequência dos incêndios de 15 de outubro, que provocaram perto de meia centena de mortos, encarregou comissários do seu colégio de analisarem com caráter de urgência, no prazo de um mês, de que modo podem ser melhoradas as ferramentas de que a União Europeia já dispõe e eventualmente criar outras, como uma força europeia permanente de proteção civil.
Apontando que, “infelizmente, os desastres naturais estão a tornar-se «o novo normal», bastando olhar para os fogos florestais em Portugal, Espanha e no sul da Europa, para o furacão que ‘varreu’ a Irlanda e para as inundações nos países bálticos”, Juncker considera que “esta realidade exige uma resposta coletiva europeia mais forte, ainda que a responsabilidade primeira a nível de prevenção e resposta a tais desastres permaneça, claro, nas mãos dos Estados-membros”.
“Ao nível da UE, o Mecanismo de Proteção Civil pode ajudar a lidar com a urgência da crise, enquanto os fundos de solidariedade e da política de coesão da UE podem apoiar os esforços de reconstrução e a regeneração da atividade económica nas áreas afetadas, e vamos ativar todos os mecanismos relevantes para apoiar Portugal”, garantiu.
O presidente do executivo comunitário observou que, “durante este ano difícil, a Comissão Europeia providenciou todo o seu apoio disponível a Portugal”, lembrando em particular “a tragédia de Pedrógão Grande, quando a UE foi capaz de canalizar muitos aviões especializados e mais de 150 bombeiros através do Mecanismo de Proteção Civil”.
“E já em agosto acordámos com as autoridades portuguesas libertar 45 milhões de euros do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional para ajudar a economia local e os serviços públicos a recuperar dos danos”, recordou.
Contudo, Jean-Claude Juncker reconhece que “tem que ser feito mais”, pois atualmente “o Mecanismo de Proteção Civil da UE faz o melhor que pode com a sua estrutura limitada, mas conta exclusivamente com a capacidade voluntária dos Estados-membros”.
“Não possuímos aviões em Bruxelas. Se por exemplo houver incêndios em Espanha, França, Croácia, Itália e Grécia, torna-se difícil para esses países oferecerem os seus próprios meios aéreos para ajudar outro país em necessidade. É por isso que Portugal teve de esperar três dias até que os primeiros aviões chegassem, por ocasião dos mais recentes incêndios”, apontou.
“Temos de alterar isto. A resposta solidária da UE a situações de necessidade tem de ser melhor, mais robusta e mais célere. Encarreguei o meu comissário para a Proteção Civil, Christos Stylianides, de apresentar propostas concretas durante o próximo mês. Ele vai trabalhar de perto com a comissária Corina Creţu, que tem a seu cargo a Política de Coesão e o Fundo de Solidariedade da UE, para fazer uma análise do conjunto total das nossas ferramentas da UE e como podem ser melhoradas”, completou.
Juncker “honrado” por participar no Conselho de Estado, onde quer “acima de tudo ouvir”
O presidente da Comissão Europeia manifesta-se “honrado” pelo convite para participar no Conselho de Estado da próxima segunda-feira, onde irá “partilhar” as suas ideias sobre o futuro da Europa, “mas acima de tudo ouvir” as dos portugueses.
Jean-Claude Juncker disse ter noção do “quão importante é o Conselho de Estado enquanto órgão de aconselhamento para o Presidente da República Portuguesa”, pelo que sabe “o quão excecional é para um não-português ser convidado para uma das suas reuniões”.
“Sinto-me honrado pelo convite que me foi dirigido pelo meu amigo de longa data Marcelo (Rebelo de Sousa), mas isto é bem mais do que um gesto muito significativo de cortesia pessoal”, disse, a propósito do convite que lhe foi dirigido em julho passado pelo Presidente da República.
Para Juncker, há vontade de “discutir o futuro da Europa, e neste momento esse debate é muito mais do que meramente académico”, face aos muitos desafios que a União Europeia enfrenta, e “isso mostra como Portugal está comprometido e empenhado com o processo de construção europeia", algo de que "nunca teve dúvidas", sublinhou.
“Portugal não foi membro fundador da União, mas a Europa deve imenso a Portugal: no seu papel de impulsionar a onda de democratização que varreu o sul da Europa, tornando essa transição para a democracia irreversível ao ancorá-la no projeto europeu, e em cada passo importante dado pela Europa desde a adesão de Portugal em 1986”, disse.
O presidente do executivo comunitário defende que, “agora, mais do que nunca, é crucial que Portugal, com o seu Presidente, Governo, parlamento e instituições, permaneça uma força motora para a Europa”.
“Estarei em Portugal para partilhar os meus pensamentos e ideias, mas acima de tudo vou lá para ouvir; para ouvir o Presidente e os seus conselheiros, para ouvir o Governo e também para ouvir o povo e os jovens que irei encontrar em Coimbra, onde na terça-feira será distinguidocom o grau de Doutor Honoris Causa pela Universidade de Coimbra, numa cerimónia cujo apresentante será Marcelo Rebelo de Sousa.
Juncker concorda com António Costa na “urgência” de completar a União Económica e Monetária
O presidente da Comissão Europeia defende que a União Europeia tem de “preparar o futuro enquanto lida com o presente”, e concorda com o primeiro-ministro português na “urgência” de completar a União Económica e Monetária (UEM).
O presidente do executivo comunitário defende que as atuais negociações com o Reino Unido para a concretização do ‘Brexit” não podem e não devem impedir a União Europeia (UE) de trabalhar no seu futuro a 27, considerando crucial aproveitar a atual “janela de oportunidade” proporcionada pelo contexto económico para completar a União Económica a Monetária.
Juncker saúda “o facto de outros, incluindo o primeiro-ministro António Costa, apreciarem a importância e a urgência de darmos os próximos passos necessários” e aponta que “a Comissão vai apresentar propostas concretas antes do fim deste ano, que serão debatidas pelos líderes na primeira cimeira da zona euro inclusiva de sempre”, que terá lugar em dezembro próximo.
“Temos de preparar o futuro enquanto lidamos com o presente. E o futuro é uma União Europeia com 27 Estados-membros. Lamento que o Reino Unido deixe a União e fiz tudo o que estava ao meu alcance para o evitar. Agora, a Comissão e o seu chefe-negociador, Michel Barnier, estão a fazer tudo o que podemos para assegurar que a UE e o Reino Unido alcançam um acordo justo. Mas o que tem de ficar claro é que o processo de divórcio não deve distrair ou impedir a União de lidar com outros desafios que enfrenta”, sustentou.
Lembrando que no seu discurso do «Estado da União», em setembro, definiu “de forma clara” aquelas que devem ser as prioridades da UE, “e elas incluem a necessidade de agir rapidamente e de forma decisiva para completar a UEM”, o presidente da Comissão sublinhou que “as perspetivas económicas jogaram a favor”, e há agora que aproveitar este contexto positivo, sem esperar por nova crise para agir.
“Estamos agora no quinto ano de retoma económica a abranger cada um dos Estados-membros. O crescimento na União Europeia superou o dos Estados Unidos nos dois últimos anos. Encontra-se agora acima dos 2% para a União no seu conjunto e nos 2,5% para a zona euro. O desemprego recua há nove anos, quase 8 milhões de empregos foram criados desde que me tornei presidente da Comissão”, sublinhou.
Desse modo, salientou, “a situação atual melhorou e já muito foi feito para reforçar a arquitetura da UEM em resposta à crise financeira, mas uma vez que vários anos de crescimento lento ou mesmo nulo deixaram marcas duradouras no tecido social, económico e político da Europa, é crucial usar esta janela de oportunidade para aprofundar a parte “económica” da União Económica e Monetária, para reforçar a sua capacidade para apoiar plenamente a política monetária e as políticas económicas nacionais, e para democratizar ainda mais o quadro comum” europeu, defendeu.
“Não podemos pura e simplesmente dar-nos ao luxo de esperar por outra crise antes de encontrar a vontade coletiva de atuar”, disse.
Juncker sublinhou todavia que, ao mesmo tempo, o debate sobre o futuro da Europa deve prosseguir noutros domínios, que não o estritamente económico.
“O nosso futuro tem de ser algo mais do que somente sobre economia. A União Europeia não se trata apenas de moeda e dinheiro, é sobre valores, é sobre os seus direitos, é sobre moldar em conjunto um futuro comum”, defende.
Portugal deve reduzir dívida da mesma forma que baixou défice, diz Juncker
O presidente da Comissão Europeia acredita que Portugal irá conseguir reduzir “o seu fardo da dívida” pública da mesma forma que conseguiu baixar o défice, “a mais efetiva para enfrentar o problema”, que é através de crescimento e finanças públicas sustentáveis.
Juncker escusou-se a comentar um cenário de renegociação da dívida pública portuguesa, alertando antes para a absoluta necessidade de combater um fenómeno que classifica como “antissocial”, mas através de “uma política orçamental prudente e responsável”.
“Demasiada dívida é antissocial, porque a dívida acumulada de hoje terá que ser paga pelos nossos filhos e netos. Demasiada dívida arruína as perspetivas da próxima geração de uma educação adequada, de um sistema de saúde fiável e de uma segurança social sólida”, advertiu.
Contudo, segundo Juncker, “a forma mais efetiva de enfrentar o problema da dívida é retomar o caminho de um crescimento e finanças públicas sustentáveis” e “é isso mesmo que Portugal está a fazer e esteve na base da recomendação para encerrar o Procedimento por Défice Excessivo” em maio passado.
“Estou convencido de que, à medida que a retoma continua a consolidar-se, e sendo mantido o compromisso com uma política orçamental prudente e responsável, Portugal fará mais progressos no alívio do seu fardo da dívida”, disse.
Jean-Claude Juncker sublinhou que “a promoção de finanças públicas sólidas é uma prioridade da Comissão Europeia”, razão pela qual, “juntamente com o investimento e as reformas estruturais, a responsabilidade orçamental orientou a agenda económica da Comissão” desde que se tornou presidente do executivo comunitário, em 2014.
“Esta política está a dar frutos. O défice público global na zona euro desceu de mais de 6% em 2009 para uma estimativa de 1,4% em 2017. Hoje, apenas três países continuam a ser objeto de Procedimentos por Défice Excessivo, em comparação com 24 no pico da crise financeira”, apontou.
Segundo Juncker, esta é a demonstração de “um progresso real, e Portugal fez a sua parte”, cabendo o mérito ao povo português.
“Em Portugal, os esforços enormes do povo português para ‘dar a volta’ à economia e fazer as finanças do país regressarem a uma posição mais estável e sustentável estão a dar resultados. É por isso que tivemos a possibilidade de recomendar o encerramento do PDE a Portugal. Esta foi uma conquista do povo português”, disse.
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