O líder norte-coreano, Kim Jong Un, não deve comparecer na audiência do tribunal, marcada para 14 de outubro, mas a decisão do juiz de o convocar é uma rara instância em que não foi concedida imunidade a um dirigente estrangeiro, afirmou Kenji Fukuda, um advogado que representa os cinco queixosos.
Os lesados exigem 100 milhões de ienes (769.000 euros) cada um como compensação da Coreia do Norte por violações dos direitos humanos, que dizem ter sofrido no âmbito do programa de reinstalação.
Cerca de 93.000 residentes de etnia coreana no Japão e membros das suas famílias regressaram ao país há décadas perseguindo a promessa de uma vida melhor, já que muitos enfrentaram discriminação no país nipónico como coreanos.
Eiko Kawasaki, de 79 anos, uma coreana nascida e criada no Japão, tinha 17 anos quando deixou o país, em 1960, um ano após a Coreia do Norte ter começado o programa de repatriamento para compensar os trabalhadores mortos na Guerra da Coreia, fazendo regressar os coreanos do estrangeiro.
O programa continuou até 1984, acolhendo muitas pessoas com proveniência da Coreia do Sul, mas o Governo japonês também aderiu, já que considerava os coreanos como forasteiros, e ajudou a organizar o transporte para a Coreia do Norte.
Kawasaki argumentou que esteve confinada na Coreia do Norte durante 43 anos, até que foi capaz de desertar em 2003, deixando para trás os seus filhos adultos.
Pyongyang teria prometido cuidados de saúde gratuitos, educação, empregos e outros benefícios, segundo a queixosa, mas nada estava disponível e foi atribuída à maior parte das pessoas trabalhos manuais em minas, florestas ou quintas.
“Se fôssemos informados da verdade sobre a Coreia do Norte, nenhum de nós teria ido”, garantiu hoje em conferência de imprensa.
Kawasaki e outros quatro desertores do programa apresentaram uma ação judicial em agosto de 2018 contra o Governo da Coreia do Norte no tribunal distrital de Tóquio, exigindo indemnizações.
O tribunal, após três anos de discussões pré-julgamento, decidiu convocar Kim Jong Un para a sua primeira audiência em 14 de outubro, disse Fukuda, o defensor dos queixosos.
Fukuda disse ainda que não espera a comparência de Kim Jong Un nem que conceda as indemnizações mesmo que seja ordenado pelo tribunal, mas espera que o caso possa estabelecer um precedente para futuras negociações entre o Japão e a Coreia do Norte na procura da responsabilidade dos coreanos e na normalização dos laços diplomáticos.
Embora legalmente impedida de pedir responsabilidades ao Governo japonês por ter ajudado o programa, Kawasaki espera poder ajudar milhares de participantes a regressar da Coreia do Norte.
“Penso que o Governo japonês também deveria assumir a responsabilidade”, vincou.
O pai de Kawasaki estava entre as centenas de milhares de coreanos levados para o Japão, muitos deles forçados, para trabalhar em minas e fábricas antes e durante a II Guerra Mundial.
O Japão colonizou a península coreana entre 1910 e 1945, um passado que ainda limita as relações entre o país nipónico e os dois vizinhos.
Hoje, cerca de meio milhão de japoneses de etnia coreana vivem no país, mas continuam a enfrentar discriminação na escola, no trabalho e na vida quotidiana.
“Demorámos tanto tempo a chegar até aqui. Finalmente, é tempo de justiça”, finalizou Kawasaki.
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