Antiga província da Sérvia com maioria de população albanesa, o Kosovo tornou-se num protetorado internacional na sequência da guerra de 1998-1999, que implicou uma intervenção militar da NATO contra a Sérvia, seguido da permanência de um contingente multinacional (Kfor) e de uma missão civil da ONU (Unmik), que deu lugar à missão europeia Eulex.
Mas nem todo o território do Kosovo celebra a independência. A minoria sérvia ortodoxa, concentrada sobretudo no norte deste país com apenas 11 mil quilómetros quadrados e perto de 1,8 milhões de habitantes, continua a identificar-se com Belgrado, apesar de manter deputados no parlamento de Pristina e ministros no governo kosovar, na sequência do acordo patrocinado pela União Europeia (UE) em abril de 2013 para uma reaproximação.
O exercício da soberania kosovar permanece assim limitado em muitas regiões do Kosovo. É o caso de Mitrovica, a cidade do norte dividida há quase duas décadas após a guerra entre as forças sérvias e os separatistas armados albaneses do Exército de Libertação do Kosovo (UÇK), um conflito que provocou cerca de 13.000 mortos, na maioria albaneses kosovares.
O acordo de normalização das relações mediado por Bruxelas prevê um estatuto para os municípios onde vive a minoria sérvia, mas Pristina continua a rejeitar qualquer perspetiva de autonomia para os sérvios kosovares, uma população calculada em 120.000 pelo facto de terem recusado participar no último recenseamento de 2011.
A questão da soberania, as relações com a Sérvia e com as instâncias internacionais, tem contribuído para uma situação socioeconómica que permanece muito frágil: o desemprego atinge um terço da população ativa (30,6%), metade com menos de 24 anos (50,9%), segundo os números oficias.
O défice comercial atinge um terço do PIB, e a aplicação de políticas neoliberais assinaladas por privatizações sem controlo acentuaram a desindustrialização do país. Segundo a Agência nacional de estatísticas, um em cada seis kosovares vive abaixo do nível de pobreza. Num relatório de 2016, a UE considerou que a corrupção “prevalece em muitos setores e continua a ser um grave problema”.
Em paralelo, as relações entre Pristina e ao seus aliados ocidentais agravaram-se no último ano. A liderança albanesa, proveniente de várias fações que integravam o UÇK, entretanto “dissolvido”, pretende dotar o país de Forças Armadas, uma proposta acolhida com reservas pelas chancelarias.
A UE e a NATO permanecem instaladas no Kosovo, apesar da inexistência de perspetivas europeias nem de adesão à NATO. O Kosovo é o único país da região balcânica que não possui liberalização de vistos para os países da União. Por esse motivo o êxodo, a perspetiva para os jovens, ainda decorre hoje de forma ilegal.
A resolução de um conflito fronteiriço com o Montenegro e o estabelecimento de um “Estado de direito” permanecem condições fixadas pela UE para a liberalização dos vistos.
Para os kosovares, é uma prioridade, num país que nos últimos anos também registou uma total deterioração dos serviços públicos.
Perto de um terço da população (700.000 segundo as estimativas) já vive no estrangeiro, assegurando dividas preciosas a um país onde o euro é a moeda “oficial” e apontado como um dos mais pobres da Europa.
A justiça também constituía um dos principais pilares da Eulex, a missão mais cara da história da UE, mas esta área decisiva também se confronta com crescentes problemas.
A criação de um tribunal internacional especial destinado a julgar os crimes de guerra atribuídos ao UÇK poderá agravar as relações com os seus “patrocinadores” ocidentais, onde se destacou os Estados Unidos, e quando os antigos comandantes militares estão hoje no poder em Pristina.
Para muitos deputados, sobretudo a oposição que circula em torno do movimento Vetëvendosje (Autodeterminação) esta instância, composta por magistrados estrangeiros e instalada em Haia, na Holanda, viola a soberania do país.
Esta semana, o Presidente do Kosovo Hashim Thaçi, chefe político do UÇK durante a guerra, considerou este tribunal, resultante de um relatório do Conselho da Europa elaborado pelo magistrado suíço Dick Marty, uma “injustiça histórica” e disse que o seu governo o aceitou com relutância pelo “preço da liberdade”.
No entanto, e após o final da guerra em 1999 houve crimes no Kosovo que não foram apenas dirigidos contra as minorias (sérvios, ciganos), mas também contra opositores políticos, ainda segundo o relatório Dick Marty. E estes crimes nunca foram julgados pela justiça internacional no Kosovo.
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