O que se passa?

Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente neste domingo, derrotando o líder incumbente, Jair Bolsonaro, nas eleições presidenciais brasileiras, por uma margem estreita, de 50,9% dos votos contra 49,1%.

O problema é que Bolsonaro manteve o silêncio desde o momento em que soube que iria perder, não reconhecendo a sua derrota e, por consequência, a vitória de Lula.

Na noite de domingo, Bolsonaro isolou-se na residência oficial do Palácio da Alvorada em Brasília, e na segunda-feira voltou ao Palácio do Planalto sem prestar declarações.

Qual é o problema de não reconhecer?

Corre-se o risco de Bolsonaro colocar em causa os resultados das eleições, quer ao alegar fraude eleitoral — algo que sugeriu repetidamente antes das eleições e durante a campanha —, quer ao dificultar ou mesmo impedir a transição de poder.

O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, disse que não há "risco de contestação" dos resultados eleitorais, e a presidente do Supremo Tribunal Federal, Rosa Webber, afirmou que as eleições foram realizadas com “segurança e tranquilidade”, apesar dos “tempos conturbados por intensa desinformação”. Não obstante, tais garantias poderão ser insuficientes para deter Bolsonaro.

A agravar esta situação, a base apoiante do ainda presidente — altamente polarizada e radicalizada — já começou a manifestar-se indisponível para aceitar Lula como presidente.

Camionistas e outros manifestantes bloquearam estradas em 11 dos 26 estados do país e no Distrito Federal, em protesto contra a derrota de Bolsonaro — foi, inclusive, bloqueada a rodovia que liga o Rio de Janeiro a São Paulo.

A polícia rodoviária precisou de intervir para permitir o fluxo do tráfego, apesar de dezenas de estradas continuarem bloqueadas, segundo um relatório oficial.

A cada momento que passa e Bolsonaro não se pronuncia, cresce o nervosismo no país perante a possibilidade de movimentos de revolta mais agressivos ou insurreições como a que tomou lugar a 6 de janeiro de 2021 no Capitólio dos EUA.

E agora?

Agora é esperar, mas Bolsonaro tem sido pressionado de todos os lados a aceitar os resultados das eleições, reconhecidos de imediato por líderes mundiais como o norte-americano Joe Biden e até o russo Vladimir Putin, com quem o presidente manteve boas relações.

Por outro lado, diversos aliados do presidente, incluindo Sérgio Moro e Ricardo Salles, reconheceram publicamente a vitória de Lula da Silva, Talvez por isso é que um dos aliados de Bolsonaro, Cláudio Cajado, já fez saber à agência Reuters que os conselheiros do presidente querem que ele pelo menos leia um textos sobre as eleições — mas isso não quer dizer que ele aceite a derrota.

Por seu lado, Lula já começou a agir como presidente-eleito, tendo se reunido com o presidente argentino, Alberto Fernández, esta segunda-feira em São Paulo. O presidente francês, Emmanuel Macron, e o secretário-geral da ONU, António Guterres, também se comunicaram com o líder de esquerda por telefone, segundo a sua assessoria de comunicação.

Da parte de Portugal, todos os líderes políticos reconheceram a vitória de Lula, até mesmo André Ventura, o único que apoiou abertamente Bolsonaro. Aliás, o presidente do Chega deixou hoje um apelo para que o presidente derrotado aceite a vitória de Lula da Silva, considerando que "é importante saber ganhar mas é também importante saber perder".

Mas mesmo que Bolsonaro aceite a derrota, os próximos tempos continuam a prometer ser muito desafiantes para Lula da Silva.

Porquê?

É preciso não esquecer que Lula teve apenas dois milhões de votos a mais que Bolsonaro, sendo esta a vitória mais apertada numa segunda volta na história da democracia brasileira, após uma campanha polarizada e tensa.

Consciente dos desafios que enfrentará a partir de 1º de janeiro — quando será, à partida, empossado —, Lula reconheceu no seu discurso que governará numa “situação muito difícil" e destacou a necessidade de restabelecer a unidade dos brasileiros.

Além disso, o Congresso, que a 2 de outubro se inclinou à direita com a eleição de conservadores e aliados de Bolsonaro, deve apresentar uma oposição mais forte do que as que Lula enfrentou nos seus dois outros governos — de resto, o Partido Liberal (PL) de Bolsonaro elegeu a maior bancada na Câmara dos Deputados, com 99 representantes.