Na semana passada, o pavimento no Largo Comandante Augusto Madureira abateu, criando uma cratera numa zona de passagem da ribeira de Algés, encanada nos anos 1960, num sinal da degradação do solo numa zona fortemente urbanizada, e hoje os moradores decidiram fazer um protesto para pedir a intervenção urgente das autoridades.
“Somos um conjunto de moradores de Miraflores e de Algés e temos estado a acompanhar com alguma preocupação todos os acontecimentos mais recentes”, desde a cratera no chão aos danos em prédios da zona a que se soma a construção na encosta da serra sobranceira, afirmou Pedro Fonseca.
Ao seu lado, alguns manifestantes empunhavam cartazes onde se poderia ler “Algés, onde o provisório se torna definitivo”, “cenário de catástrofe” ou “menos impermeabilização, segurança para os moradores”.
Segundo o dirigente da Associação de Moradores de Miraflores, a questão não é apenas tapar o buraco que surgiu mas sim encontrar uma “solução efetiva” para a drenagem das águas subterrâneas, que passam pelos alicerces dos edifícios, “problemas que se têm vindo a acentuar com autorizações (de construção) em leito de cheia” de novos empreendimentos a montante deste local.
“Nós não estamos aqui contra A ou B, contra a Câmara ou contra o Governo” mas “queremos soluções que nos descansem”, afirmou.
No início do século, chegou a ser discutida a duplicação dos canais subterrâneos da ribeira de Algés para assegurar um melhor escoamento das águas, com um orçamento de 150 mil euros, mas os sucessivos adiamentos fazem com que os “custos desta intervenção sejam hoje muito superiores”, admitiu Pedro Fonseca.
Por isso, até que haja soluções hidráulicas permanentes, “a Câmara Municipal não pode continuar a licenciar a montante mais edifícios que condicionem a impermeabilização do subsolo”, acrescentou.
Para já, a autarquia colocou barreiras à superfície para desviar a água da cratera em caso de chuva forte, mas “isso não resolve nada” e é um “penso rápido numa chaga velha”, afirmou à Lusa Helena Abreu, da associação Desafiar Algés – Rede de Moradores, adiantando que a água da ribeira acaba por chegar à baixa de Algés e os danos são globais porque a “natureza não conhece fronteiras”.
"Este é um troço subterrâneo completamente podre, que abre buracos aqui que abre buracos ali e acolá e deixa as pessoas completamente assustadas com medo que lhe abra um buraco na cozinha, porque o caneiro passa por baixo dos prédios”, afirmou a dirigente, defendendo obras urgentes e o desvio da ribeira pela avenida principal da zona.
Em Lisboa estão “a ser feitas obras grandes para escoar as águas, em Cascais também e aqui a Câmara tem dinheiro para construir fóruns de 64 milhões mas não tem dinheiro para arranjar o caneiro de Algés como deve ser e deixa Algés neste estado, a vivermos sempre com o coração nas mãos”, acusou.
Marina Pera mora há 28 anos na zona e o seu prédio apresenta rachas na fachada o que a faz temer em relação ao futuro: “É o investimento de uma vida e sentimo-nos inseguros e ansiosos”.
O seu condomínio ordenou obras de restauro do edifício, construído em 1986, mas os técnicos já informaram que as causas da degradação são externas e estão relacionadas com a instabilidade dos solos, porque as “fundações estão todas ocas”.
Com a construção de uma nova urbanização a montante, já na serra, a situação agravou-se e “andamos sempre com o coração nas mãos quando chove”.
André Lauret é arquiteto e vive perto do local numa moradia. “Aqui há uns anos, vi os meus muros e ceder e tive de fazer obras de consolidação”, explicou, criticando o desrespeito das autoridades locais pela natureza.
“Fui aluno do professor Ribeiro Telles e ele já dizia que era só incompetência criminosa ao serviço dos grandes interesses”, afirmou o arquiteto, considerando que o ordenamento está sujeito “às grandes imobiliárias que fazem o que querem, com atropelos à lei”.
Mário Manteigas é engenheiro hidráulico, mora a poucos metros da cratera que mostra a degradação do subsolo e não tem dúvidas sobre o que deve ser feito.
“Temos de restaurar o traçado natural da ribeira de Algés” e “é necessário avaliar os danos nas infraestruturas de todos os prédios da zona”, sob pena de “algum dia acontecer uma tragédia maior que um buraco”, afirmou.
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