Marcelo Rebelo de Sousa esteve esta quinta-feira, 24 de janeiro, no Liceu Passos Manuel, em Lisboa, onde respondeu às questões colocadas pelos alunos do ensino secundário. Entre os vários temas abordados, o Presidente foi questionado sobre o caso do bairro da Jamaica, isto é, sobre o alegado excesso de força na intervenção policial da PSP, que tem gerado contestação e levou a uma manifestação, que resultou em violência e terminou com vários detidos.
Ao longo das duas horas que durou a ‘aula’, este assunto foi abordado várias vezes.
O Presidente começou por salientar que “em todas as comunidades há conflitos sociais, e em comunidades mais diversificadas, e onde há problemas económico-sociais, os conflitos são maiores". Por outro lado, reconheceu que "há intervenções policiais mais fáceis e menos fáceis, mais felizes e menos felizes".
Salientado que a polícia está na rua todos os dias e atua nos mais diversos locais — seja em bairros mais carenciados ou não — e que nem sempre essas intervenções são notícia, Marcelo assumiu que "como tudo o que é humano, as forças de segurança têm, em situações de intervenção em stress, momentos melhores, piores, mais felizes e menos felizes". Acrescentou ainda que "é evidente que há regras, e as regras sabemos quais são, como a proporcionalidade ao agir com determinado problema (...). O problema é a aplicação, no caso concreto, das regras".
Considerando que a sociedade portuguesa "não é uma sociedade que não escrutine as forças de segurança. (...), não se pode dizer que há uma posição fácil ou laxista em relação a essa matéria”, salientou que “a sociedade precisa de forças de segurança. Não há sociedade sem forças de segurança", reiterou. "Tudo o que seja diabolizar ou divinizar [as forças de segurança] são posições extremas que não convidam à convergência”, alertou.
Mantendo uma atitude "conciliadora e de convergência”, o Presidente da República alertou várias vezes para o risco da generalização porque "toda a generalização é injusta". “Se generalizamos criamos um clima de radicalização na sociedade portuguesa e ninguém ganha com isso”, disse, salientando que o Ministério Público está a investigar este caso e recusando qualquer pré-disposição de preconceito por parte desta instituição.
“Uma reação radical, generalizando o que não deve ser generalizado, vai fortalecer as xenofobia”, disse ainda. “Há que evitar a radicalização, traduzida na generalização dos juízos, (...) isto é o pior que se pode ter numa sociedade que tem de ser inclusiva e que vai ser inclusiva”, acrescentou.
O extremar do discurso pode, alertou Marcelo, abrir caminho a movimentos populistas, "porque numa sociedade envelhecida, em que as pessoas estão com medo em relação ao futuro económico e social, é fácil ter um apelo securitário. Por onde têm avançado os populismo ou posições radicais? Por um lado, pelo argumento da segurança”, exemplificou, alertando para o perigo da criação de uma sociedade que recuse o multiculturalismo e apoie o monoculturalismo.
Assim, Marcelo apelou a todos uma reação "equilibrada, junta e inteligente" porque “às vezes os melhores propósitos acabam por ter as piores consequências”.
No final da sessão, quando questionado sobre a desconfiança manifestada pelos jovens relativamente à atuação da polícia, Marcelo Rebelo de Sousa notou que “houve intervenções preocupadas e foram aplaudidas por uma parte da sala, mas outra parte da sala, tão numerosa ou mais numerosa do que aquela que aplaudiu, reagiu ao contrário”.
O chefe de Estado tentou "explicar aos jovens, mesmo aos mais apaixonados, que uma posição apaixonada e radical de um lado gera posição apaixonada e radical do outro lado". "Isso é o contrário do que precisamos na convivência social”, disse.
“O importante é trabalhar pela concórdia, pela aproximação, pela convergência e não radicalizar situações e generalizar situações”, afirmou.
No domingo de manhã, 20 de janeiro, a PSP foi chamada a Vale de Chícharos, mais conhecido como bairro da Jamaica, após ter sido alertada para “uma desordem entre duas mulheres”, o que resultou no ferimento, sem gravidade, de cinco civis e de um agente. Os agentes foram acusados pelos moradores de violência policial.
A PSP abriu, no mesmo dia, um inquérito para “averiguação interna” sobre a “intervenção policial, e todas as circunstâncias que a rodearam”. Também o Ministério Público abriu um inquérito aos incidentes no bairro da Jamaica.
Devido a esta ocorrência, realizou-se, no dia seguinte, uma manifestação em frente ao Ministério da Administração Interna, em Lisboa, tendo os manifestantes subido, por volta das 17:00, a Avenida da Liberdade, em direção ao Marquês de Pombal, onde ocuparam a praça central. Os protestos acabaram em violência, com arremesso de pedras e disparos com balas de borracha. Quatro pessoas foram detidas.
As últimas noites têm sido também de tensão, com incêndios em ecopontos, caixotes do lixo e viaturas na Grande Lisboa e em Setúbal; assim como o lançamento de “cocktails Molotov” contra uma esquadras e veículos. Três pessoas foram detidas. Todavia, em comunicado, a PSP esclareceu que “nada indicia, até ao momento, que [estes incidentes] estejam associados à manifestação” de protesto contra a intervenção policial no bairro da Jamaica.
[Notícia às 17h03 - Acrescenta declarações do Presidente da República depois da sessão]
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