“Faz parte da vida democrática haver o apuramento da verdade e o acesso dos cidadãos à verdade e, portanto, na medida em que se puder apurar a verdade, que se apure: como foi no passado, como é no presente, o que é que isso significa”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa em declarações aos jornalistas à saída do VII Congresso Nacional da Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE), que decorre hoje e sábado na Universidade Católica, em Lisboa.

O chefe de Estado disse que defendeu, “desde a primeira hora, que devia ser tudo investigado” no que se refere ao acolhimento de refugiados ucranianos, de forma a perceber se o acolhimento por cidadãos russos se passou “com um município, com vários municípios, com uma associação, com várias associações, com uma pessoa, com várias pessoas”.

“Eu acho que os portugueses é que gostarão de saber aquilo que se passou, aquilo que se passa, uma vez investigado, para poderem conhecer, tanto quanto a verdade é possível descobrir toda, aquilo que é verdade sobre esta matéria”, frisou.

Marcelo Rebelo de Sousa defendeu que há órgãos políticos e judiciais “para poderem acompanhar e para apurar a verdade” sobre a matéria, salientando que, “no âmbito das suas competências, o deverão fazer”.

“Os políticos acompanham tudo o que se passa na sociedade, para poderem transmitir aos cidadãos, com transparência, o que podem apurar, que se passou ou está a passar. Os judiciais intervêm quando há matéria, nomeadamente criminal, que justifica a sua competência. São planos complementares, mas diferentes”, frisou.

Questionado se considera que seria importante o presidente da Câmara Municipal de Setúbal ser ouvido no parlamento, poucos minutos depois de o PS ter chumbado uma audição parlamentar ao autarca, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: “Eu agora não vou comentar posições ou decisões do parlamento”.

Interrogado se já houve alguma avaliação que indique que situações como a da câmara de Setúbal – onde refugiados ucranianos foram acolhidos por cidadãos russos – também tiveram lugar noutras autarquias, o Presidente sublinhou que acha que “é esse o apuramento que é preciso fazer”.

Quanto a eventuais responsabilidades políticas sobre o caso, Marcelo considerou que, primeiro, é preciso “apurar o que se passou”, uma vez que todos os dias se descobrem “novas realidades dentro da realidade, e depois formular um juízo sobre aquilo que se apurou”.

“Faz parte da democracia, como respirar, a transparência no apuramento de matérias como esta, como muitas outras, e os órgãos devem ir apurando, de acordo com o seu entendimento dos respetivos poderes”, referiu.

O Presidente da República reiterou que os portugueses vivem “numa sociedade livre e uma sociedade em que a liberdade e a democracia significa o escrutínio, a transparência e o apuramento da verdade”.

Questionado se considera que o caso na câmara Municipal de Setúbal coloca em causa as competências do Estado português para acolher refugiados, Marcelo respondeu: “Penso que não, porque quem acolhe os refugiados é a sociedade portuguesa”.

“Quem os está a acolher é a sociedade portuguesa que se socorre de um município aqui, de uma associação ali, de uma instituição religiosa ou cívica, ou social muito variada”, frisou.

O chefe de Estado referiu que a ideia de “que é o Estado concentracionário que realmente acolhe os refugiados e trata deles” não existe, nem “corresponde à realidade numa sociedade aberta, democrática”.

“Os portugueses de vez em quando têm o tropismo de achar, ou a tentação de achar, que não é uma responsabilidade sua. Não, é uma responsabilidade nossa! O acolhimento de emigrantes é uma responsabilidade de todos nós, como o acolhimento dos nossos compatriotas que estão lá fora é uma responsabilidade das sociedades que os acolhem”, indicou.

Interpelado sobre o facto de esse acolhimento dever ser feito com a garantia das “devidas condições”, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu que “é evidente” e referiu que “há coisas óbvias” que devem ser cumpridas “num Estado de direito democrático”.

“Uma delas é o respeito pelos dados pessoais, a intimidade, aquilo que é o próprio da reserva de cada qual para que se sinta à vontade na integração na sociedade portuguesa. Agora, não vamos pegar numa realidade específica e dizer ‘a sociedade portuguesa é incapaz de acolher centenas, milhares, centenas de milhares de pessoas como tem acolhido, e bem’”.

O semanário Expresso noticiou no passado dia 29 de abril que refugiados ucranianos foram recebidos na Câmara de Setúbal por russos simpatizantes do regime de Vladimir Putin e que responsáveis pela Linha de Apoio aos Refugiados estão a fotocopiar documentos dos refugiados, entre os quais passaportes e certidões das crianças.