Em Salamanca, onde falava para uma plateia de centenas de reitores e representantes de universidades e politécnicos de todo o mundo, reunidos na cidade espanhola para um encontro da rede Universia, integrado nas celebrações dos 800 anos da Universidade de Salamanca, retirou-se momentaneamente do cargo de chefe de Estado – “presidente é-se por períodos limitados de tempo”, disse – e colocou-se no papel de professor e académico – “professor é-se para toda a vida” – para pedir que a universidade não se feche sobre si mesma e se abra aos problemas da sociedade.

“A crise dos dias de hoje, a crise dos sistemas políticos, a crise dos sistemas económicos, a crise dos sistemas sociais é uma crise de falta de coesão. Onde não há coesão há populismo, onde não há coesão há xenofobia, onde não há coesão há demagogia”, disse o Presidente da República (PR), Marcelo Rebelo de Sousa, na sua intervenção na sessão inaugural do encontro.

“Trabalhar pela coesão é trabalhar pela educação e, por isso, não há universidade que não esteja ligada à sociedade. E por isso não há universidade que não deva ser aberta ao mundo. Universidade fechada é universidade que se nega a si própria. Universidade para os professores, para os burocratas, para a organização não é universidade”, acrescentou.

Depois de defender que “não há universidade sem valores” e que “não há valores sem educação” e que a universidade não é “uma peça isolada” na sociedade, Marcelo Rebelo de Sousa disse que o papel de uma universidade deve ser o de antecipação.

“O problema dos dias de hoje é que ninguém antecipa o que deve ser antecipado. E não antecipar para uma universidade é morrer”, disse Marcelo, que acrescentou que o desafio que a academia enfrenta é o de não se fechar sobre si mesma, dando o exemplo da plataforma de apoio a refugiados sírios, a estudar em universidades portuguesas, criada pelo antigo Presidente da República Jorge Sampaio, para defender a abertura das universidades aos problemas globais e lançar um repto aos cerca de 600 reitores presentes no encontro.

“Se cada universidade recebesse cinco refugiados teríamos três mil lugares de justiça social. Isso é pensar no mundo, não pensando no mundo próximo. Mas já não há mundo próximo, todo o mundo é próximo de nós”, afirmou o PR.

Sobre a capacidade de antecipação que pediu às instituições de ensino superior, Marcelo Rebelo de Sousa referiu “capacidade de ver e planear o médio e longo prazo” e pediu “antecipação com políticas públicas de consenso de regime, que não mudem com cada Governo, com cada legislatura, com cada orçamento”, mas com “horizonte de futuro”.

“Porque educar não é tarefa de um Governo, de um político, de um partido, de um sindicato de uma confederação patronal. Nem sequer de um país só. Educar é um desafio universal”, disse.

Lembrando que está a seis meses da sua jubilação académica, disse que mesmo depois do fim da sua carreira académica continuará a ser um universitário e “em fraternidade” recordou aos reitores que o futuro das sociedades depende mais das universidades do que dos políticos.

“Eu acredito na educação, acredito na universidade. Com a ânsia de sermos mais, e temos de citar sempre Unamuno [ensaístas e filósofo espanhol natural de Salamanca], é obrigatório chegar a Salamanca e citar Unamuno. Dizia ele: quem não sente a ânsia de ser mais não chegará a ser nada. Temos de ter a ânsia de ser mais. toda a vossa vida, toda a nossa vida, começando cada dia como se fosse o primeiro até ao final das vossas vidas”, afirmou Marcelo.

Na intervenção que encerrou a sessão, o rei Felipe VI defendeu que “é indispensável recuperar e fomentar os valores humanistas que sempre estiveram na base das universidades”.

“Temos que ser mais proativos e menos reativos. […] Na sua mão [das universidades] está a capacidade de liderar o futuro”, disse o monarca.

A universidade, o futuro da educação e investigação e a importância da academia no desenvolvimento social e territorial vão estar em debate num encontro ibero-americano de reitores, que arranca hoje em Salamanca, com a presença do Presidente da República.

O IV Encontro Internacional de Reitores Universia, uma rede ibero-americana de universidades e politécnicos, arrancou hoje em Salamanca, Espanha, no Palácio de Congressos e Exposições de Castilla e León, com a presença do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, na sessão inaugural do evento, ao lado do rei de Espanha, Felipe VI, do secretário-geral da OCDE, Angel Gurría e da presidente da rede Universia e do banco Santander, Ana Botín.