A ministra da Saúde anunciou hoje uma comissão para acompanhar a resposta das urgências de ginecologia e obstetrícia e bloco de partos dos hospitais, integrando coordenadores regionais e um nacional.
“A primeira resposta é de facto a criação de uma comissão de acompanhamento da resposta em urgência de ginecologia e obstetrícia e bloco de partos que integra cinco coordenadores regionais e um coordenador nacional”, adiantou Marta Temido em conferência de imprensa no Ministério da Saúde, em Lisboa.
Segundo disse a governante, essa comissão replicará o modelo que já foi utilizado para maximizar a coordenação nacional na resposta às necessidades de medicina intensiva.
“Esta comissão irá funcionar num modelo semelhante, sendo que o seu trabalho é muito vocacionado para aquilo que é o curto prazo”, nos meses de junho, julho agosto e setembro, avançou a ministra.
Entre os temas que este organismo poderá estudar estão a melhoria dos salários dos médicos destes serviços de urgência, mas também protocolos com outros setores, como o privado, para responder aos problemas nas urgências.
Marta Temido adiantou que esta comissão vai identificar os recursos disponíveis por hospital e região, mas também aprovar um modelo de gestão integrada de cada região, apoiando as administrações regionais de saúde nesse trabalho, “centralizando, analisando e apoiando os planos de contingência de cada hospital”.
“Vale a pena recordar que as normas da Ordem dos Médicos, concretamente do colégio de especialidade de ginecologia/obstetrícia, que estão vigor já preveem especificamente que, se não for possível assegurar uma escala, deve existir um plano de contingência”, disse a ministra, ao defender que estes planos têm de estar articulados e “capazes de ir para o terreno”.
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem 802 médicos especialistas em ginecologia/obstetrícia e 38 hospitais com resposta em urgência nessa especialidade e em bloco de partos.
De acordo com a ministra, esta equipa terá também a “missão” de discutir com as administrações regionais de saúde a celebração de acordos com os setores privado e social da saúde.
“As nossas reuniões esta semana envolveram também o setor privado e houve disponibilidade dentro das limitações que o setor privado também tem para esta resposta, de nos apoiarem”, salientou Marta Temida.
Uma outra “tarefa muito importante” desta nova comissão será o acompanhamento dos indicadores de saúde materna no curto prazo para efeitos de monitorização da qualidade, adiantou.
Segundo referiu, ainda no curto prazo, há também a necessidade de rever as questões associadas às remunerações dos médicos em serviço de urgência, não apenas na área da ginecologia e obstetrícia, mas também de outras especialidades.
Nesse sentido, está agendada para quinta-feira uma reunião com os sindicatos representativos dos médicos para discutir um projeto de diploma sobre as matérias de remunerações em serviço de urgência, adiantou.
“Todas as áreas governativas se empenharam em desenhar, num prazo muito curto, uma proposta de solução que responde às principais preocupações das estruturas”, disse a governante, que considerou, sem especificar os valores que serão alvo de negociação, ser uma “solução que envolve a correção de potenciais desigualdades” gerada pelos montantes pagos aos prestadores de serviços nesta área.
1.600 vagas para colocação de médicos recém-especialistas
A ministra da Saúde anunciou ainda a abertura de cerca de 1.600 vagas para colocação de médicos recém-especialistas, das quais 50 na especialidade de ginecologia/obstetrícia.
“Está prevista durante o dia de hoje a publicação de um despacho que determina a abertura de cerca de 1.600 vagas para recém-especialistas”, no âmbito do concurso de colocação da primeira época de 2022, adiantou Marta Temido.
Segundo Marta Temido, o despacho determina um total 1.182 vagas na área hospitalar, das quais 50 em ginecologia/obstetrícia, 432 vagas na área de medicina geral e familiar e 25 na área da saúde pública.
De acordo com a governante, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) forma cerca de 25 especialistas em ginecologia e obstetrícia, mas o Governo abre um número superior de vagas nesta especialidade, tendo em conta que pretende “contratar todos os médicos que queiram trabalhar no SNS”.
As vagas que serão publicadas hoje permitirão, de acordo com Marta Temido, a “solução de alguns problemas” ao nível dos médicos do SNS, mas também o “início de projetos profissionais que sejam interessantes para quem os integra e úteis para o país”.
A ministra da saúde garantiu ainda que o Governo está “empenhado” em contrariar o “fenómeno da dependência” das unidades do SNS das empresas prestadoras de serviços na área médica, alegando que essa é “uma entorse que tem de ser corrigida”.
Segundo o último relatório do Conselho das Finanças Públicas sobre a evolução do desempenho do SNS, em 2021 foram contratadas mais de 4,9 milhões de horas a prestadores de serviços externos (médicos, na sua grande maioria), representando uma despesa de 142,1 milhões de euros.
Governo admite vir a recrutar e formar médicos especialistas no estrangeiro
A melhoria da capacidade formativa do país é essencial para dar resposta à falta de médicos em especialidades como ginecologia e obstetrícia, mas recrutar e formar especialistas no estrangeiro também está em cima da mesa, admitiu hoje o Governo.
“A questão da melhoria das capacidades formativas é essencial. E depois há outras soluções. Nós não descuramos a hipótese de contratação de médicos no estrangeiro e se tivermos efetivas dificuldades na formação de especialistas cá, equacionar a sua formação noutros países”, disse também a ministra da Saúde.
Ainda sobre a possibilidade de recrutar e formar no estrangeiro, a ministra adiantou que há contactos estabelecidos.
“Estamos a fazer alguns contactos – não é nenhum segredo, não é nenhuma reserva - com alguns países no sentido de perceber como é que podemos enfrentar com recursos externos problemas que são problemas do sistema. No passado isso já foi feito em situações específicas e concretas”, disse.
Em Portugal admitiu estar a discutir com a Ordem dos Médicos o aumento da capacidade formativa no país.
“Compete ao Governo com o parecer da Ordem dos Médicos fixá-las e iremos trabalhar conjuntamente no sentido de as alargar o máximo possível, pese embora sabermos que no último concurso para especialistas houve vagas que não ficaram preenchidas. Portanto, temos também um problema de atratividade do trabalho médico, que não é só no Serviço Nacional de Saúde (SNS)”, disse, recusando entrar “em discussões” sobre se o país tem “médicos a mais ou médicos a menos”.
Lembrou, no entanto, declarações recentes do bastonário Miguel Guimarães a apontar a falta de 5.500 profissionais no país e a propósito do caso concreto do hospital de Braga, onde não foi possível ocupar todos os lugares deixados vagos por aposentações, referiu que o défice entre necessidades para preencher escalas e quadros de pessoal e o número de médicos efetivamente formados conduzem a uma “quadratura do círculo que se revela impossível”.
Simultaneamente, e associado a esta questão, a ministra destacou a necessidade de “contrariar o fenómeno de dependência” do SNS de empresas prestadoras de serviços.
“Isso também é uma entorse que tem que ser corrigida”, disse Marta Temido, acrescentando que há “mecanismos de relacionamento” que têm que ser analisados.
Sublinhando querer reconduzir os prestadores de serviços ao seu papel de “resposta a necessidades pontuais e não a necessidades estruturais”, Marta Temido admitiu também que isso não vai acontecer de um dia para o outro, havendo atualmente “uma utilização intensiva” destes prestadores, que só no ano passado custaram ao Estado 300 milhões de euros.
“Temos aqui um fenómeno que não é evitável de um dia para o outro e vai ser necessário fazer um ajustamento progressivo”, resumiu.
Em cima da mesa negocial com os sindicatos médicos, que na quinta-feira se reúnem com o Ministério da Saúde para conhecer a proposta do Governo para melhorar a remuneração das horas extra dos médicos dos quadros em serviço de urgência está precisamente uma transferência das verbas pagas a prestadores para o trabalho extraordinário pago aos médicos.
“O que temos ouvido dizer por parte de todos os intervenientes é que [com essa transferência de verbas] não gastaríamos mais, gastaríamos o mesmo. Muito bem, fizemos algumas contas, temos algumas soluções e há uma perspetiva de neutralidade orçamental. É esse o compromisso, esperamos ganhar em efeitos indiretos”, disse a ministra.
Reconhecendo que há “a perceção” de que existe “uma disparidade de valores” pagos por hora de trabalho em urgência a tarefeiros e a médicos dos quadros, a ministra da Saúde disse que a intenção é chegar a uma aproximação de valores “na medida do possível”.
Resolver os problemas na base dos encerramentos e constrangimentos nos serviços de urgência de ginecologia e obstetrícia registados nos últimos dias em todo o país, mas sobretudo na região de Lisboa, passará por melhor coordenação e “melhor governação clínica do SNS”, uma necessidade evidente, referiu a ministra, que tem que ser aposta do Governo.
Mas passará também por maior “articulação” com os privados, sendo articulação uma palavra a desenvolver no SNS, sublinhou a ministra, que disse não haver “preconceitos ideológicos” sobre esta matéria e afirmando ser “ministra da Saúde, não do SNS”.
“A Administração Regional de Saúde de Lisboa tem feito contactos sobre a possibilidade de trabalharmos de uma forma mais complementar. Já o fizemos em tempos de pandemia e acreditamos que podemos voltar a fazê-lo se houver vantagem para todos. Não há aqui nenhum preconceito ideológico”, disse.
Para além de anunciar hoje uma comissão para acompanhar a resposta das urgências de ginecologia e obstetrícia e bloco de partos dos hospitais, integrando coordenadores regionais e um nacional, que pretende chegar a soluções de curto prazo, até setembro, Marta Temido anunciou ainda a continuidade desta comissão para um trabalho a médio e longo prazo.
O Governo espera que esta comissão apresente num prazo de 180 dias uma revisão da rede de referenciação hospitalar para a área de ginecologia e obstetrícia, mas também para a rede de referenciação para urgência e emergência.
“Temos um modelo que tem provado bem e que tem resultados dos quais nos orgulhamos enquanto país. Portanto, vamos preservá-lo. Contudo esse modelo tem que ter as adaptações necessárias às atuais necessidades sócio-demográficas da população”, disse a ministra, acrescentando que a revisão terá “como preocupações equidade territorial e resposta de qualidade e de segurança de acordo com as recomendações técnicas”.
António Costa anunciou durante a tarde esta apresentação da ministra da Saúde. Segundo o primeiro-ministro, Marta Temido apresenta "o resultado do trabalho que o Governo desenvolveu tendo em vista responder não só à situação da contingência e aos problemas que estamos a viver nestes dias, mas sobretudo encontrar uma resposta estrutural para os desafios que o SNS tem, designadamente na área hospitalar", declarou António Costa.
O primeiro-ministro e secretário-geral dos socialistas, que falava aos jornalistas na sede do PS, em Lisboa, defendeu que "para além dos problemas de contingência, há problemas estruturais que têm de ter resposta".
"Para além da resposta ao problema conjuntural que estamos a enfrentar, aos planos que todos os anos temos para gerir um período crítico como é o verão, particularmente em regiões intensamente turísticas como é o Algarve, mais do que isso o que a senhora ministra irá apresentar às sete da tarde é um programa estrutural para resolver um problema que existe no SNS que tem de ser enfrentado e que tem de ser resolvido", acrescentou.
Numa alusão ao encerramento de serviços de urgência de ginecologia e obstetrícia de vários hospitais, o primeiro-ministro afirmou: "Obviamente todos temos consciência da situação grave que estamos a enfrentar, particularmente nestes dias marcados pela acumulação de feriados e de uma conjugação de problemas pessoais de doença designadamente relacionados com a covid que afetaram vários dos nossos médicos".
António Costa referiu que "todos os anos" são definidos planos "para gerir um período crítico como é o verão, particularmente em regiões intensamente turísticas" como é o Algarve".
Interrogado se o Governo irá recorrer ao setor privado, o primeiro-ministro remeteu a resposta para a conferência de imprensa de Marta Temido: "Às sete da tarde a senhora ministra apresentará integralmente esse plano e ficarão respondidas integralmente todas as questões que têm a colocar".
A falta de médicos continua hoje a obrigar ao encerramento total ou parcial das urgências de obstetrícia nos hospitais como Portalegre, Portimão e Almada.
Após um fim de semana, alargado devido aos feriados, em que se registaram perturbações nos hospitais de Braga ou Garcia de Orta, por exemplo, as urgências de obstetrícia do hospital de Portalegre estão encerradas desde as 05:00 de hoje e até às 08:00 de sexta-feira, dado que apenas estará um obstetra no serviço, segundo o porta-voz da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano (ULSNA), Ilídio Pinto Cardoso.
Contudo, apesar do fecho das urgências, o serviço de Obstetrícia “vai estar a funcionar” porque vai estar um obstetra de serviço, acrescentou.
Ilídio Pinto Cardoso explicou ainda que as grávidas que se dirijam aos hospitais de Portalegre e Elvas, bem como ao Serviço de Urgência Básico (SUB) de Ponte de Sor, deverão ser encaminhadas para o Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE) ou para a unidade hospitalar mais próxima.
Desde as 21:00 de terça-feira que também o serviço de urgência de ginecologia e obstetrícia da Unidade Hospitalar de Portimão está fechado por dificuldade em assegurar escalas.
O encerramento irá manter-se até às 09:00 de segunda-feira, 20 de junho, sendo que a resposta assistencial regional do Centro Hospitalar Universitário do Algarve (CHUA) está garantida na Unidade Hospitalar de Faro pela equipa de especialistas de Faro, a qual será reforçada com médicos da Unidade Hospitalar de Portimão, segundo indicou o CHUA.
Já as urgências de Ginecologia/Obstetrícia do Hospital Garcia de Orta (HGO), em Almada, que encerraram às 20:00 de terça-feira, reabrem pelas 08:00 de hoje, de acordo com a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT).
Numa nota divulgada na terça-feira, a ARSLVT admitiu que, nos próximos dias, poderão “existir limitações em alguns hospitais, com desvios da urgência externa de Obstetrícia/Ginecologia para outras unidades da região, que assegurarão a resposta do SNS [Serviço Nacional de Saúde]”.
Na segunda-feira, a ministra da Saúde, Marta Temido, anunciou que vai ser posto em prática “um plano de contingência” entre junho e setembro para procurar resolver a falta de médicos nas urgências hospitalares do país.
Marta Temido falava após um dia de reuniões com diretores clínicos de vários hospitais da região de Lisboa, e depois com sindicatos e a Ordem dos Médicos sobre a “instabilidade do funcionamento” destes serviços.
A falta de médicos em vários hospitais do país tem levado nos últimos dias ao encerramento de urgências de obstetrícia, ou a pedidos aos centros de orientação de doentes urgentes (CODU) de reencaminhamento de utentes para outros hospitais.
(Artigo atualizado às 23:49)
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