O problema é que ele “confiava plenamente” no empresário, com quem foi estabelecida “uma amizade muito rápida”, e estava mesmo convicto de os 250.000 euros iriam dar-lhe um rápido retorno “de milhões”, já que o ‘chip’ estaria pronto a ser comercializado, afirmou hoje no tribunal de São João Novo, no Porto, a companheira do médico espanhol à altura dos factos em julgamento.

O médico em causa foi, segundo o Ministério Público (MP), o maior de quatro burlados no esquema do empresário que passaria por vender papéis sem qualquer valor como se fossem ações de empresas que teriam patenteado um ‘chip’ injetável para detetar precocemente o cancro. Com isso teria arrecadado um total de 348.000 euros.

“Eu era contra o investimento. Não confiava, de todo, no senhor António”, o empresário arguido, “desconfiava porque não via nada de concreto”, afirmou a ex-companheira do clínico espanhol, sublinhando que o arguido terá tentado que um outro médico, das relações comuns, também aceitasse investir.

“Mas ele foi mais inteligente e não entrou”, frisou.

A testemunha disse igualmente que o empresário arguido tinha contactos frequentes com o médico e era presença assíduo em sua casa, até obter os 250.000 euros.

Depois, “de um momento para o outro”, após transferir o dinheiro, “nunca mais vi o senhor António”, acrescentou.

Também num depoimento prestado hoje perante o tribunal de São João Novo, a atual mulher do médico espanhol, com quem está casada desde 2018, frisou que o marido nunca recebeu reposta aos apelos que os 250.000 euros fossem devolvidos.

“Ficou muito triste por ser sentir enganado por uma pessoa em quem confiava muito”, declarou.

Em anterior sessão de julgamento, o arguido confirmou que recebeu dinheiro das pessoas que se declararam burladas, mas rejeitou qualquer prática dolosa.

Referindo-se ao caso específico do médico espanhol, declarou: "Foi vendida uma participação numa sociedade que tem existência jurídica e que é minha".

Acrescentou que o valor se reportava a 8,33% de uma 'holding' pessoal 'offshore', que controlava a empresa que estava a desenvolver o 'chip'.

Está segunda empresa controlava, por sua vez, uma outra 'holding' que - disse - tem a receber 11 milhões do estado de São Tomé e Príncipe.

Sobre o 'chip', assegurou que tem a patente desde 2013.

"Não é nenhuma falsidade. O projeto continua vivo e a ser desenvolvido em Pamplona", disse.

A Interpol, citada no processo, nunca o confirmou, levando o empresário a fazer esta observação: "Lamento que a Interpol esteja mal informada".

Quando questionada sobre o estado atual do invento que diz ter patenteado, afirmou: "Estamos numa meia fase".

Sublinhou que há um plano de negócios associado de milhões de euros que os investidores conheceriam.

O arguido, empresário de 62 anos, natural do Porto e com residência em Madrid, está acusado por burla qualificada e por falsificação de documento, num processo em que os lesados reclamam os montantes ainda não devolvidos.

Apenas um deles conseguiu atenuar o prejuízo sofrido, reavendo 38.000 dos 60.000 euros entregues ao empresário.

Segundo a acusação do processo, o arguido "usou vários artifícios para levar avante os seus propósitos nomeadamente exibindo documentos que bem sabia não possuírem qualquer validade".

Tais documentos, acrescenta, "consistiam apenas em mais um engodo para ludibriar os ofendidos e retardar a apresentação de resultados que bem sabia inviáveis, pois nenhuma investigação [sobre o suposto 'chip'] estava em desenvolvimento".

Como afiança o MO, o empresário começava por granjear a amizade das pesos-galo, dando sempre de si a imagem de um investidor com grande rasgo e de pessoa "bastante influente". Declarou-se mesmo amigo da empresária Isabel dos Santos, filha do ex-presidente de Angola.

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