Sob os pretextos de estarem a efetuar uma manifestação religiosa para “rezar pelos pecadores” e de irem às compras em grupo, os manifestantes ignoraram os avisos da polícia para não realizarem qualquer protesto, sob pena de arriscarem até cinco anos de prisão.

As milhares de pessoas marcham perto do parlamento e do Gabinete de Ligação de Pequim em Hong Kong, entoando cânticos ‘religiosos’ e as habituais palavras de ordem associadas às cinco reivindicações do movimento pró-democracia.

Um dos manifestantes albergava trajes religiosos e empunhava um cartaz onde se podiam ler “os cinco mandamentos”, numa alusão às cinco exigências dos manifestantes.

Na quinta-feira, a polícia de Hong Kong proibiu a manifestação e a marcha pró-democracia prevista para hoje, sublinhando que quem desobedecer pode enfrentar até cinco anos de prisão.

Movimento convoca Hong Kong a espalhar hoje "luz da democracia" após proibição de protesto

O movimento pró-democracia que tem liderado os maiores protestos em Hong Kong convocou hoje a população a “espalhar a luz da democracia por todos os cantos” do território, numa resposta à proibição do protesto agendado para hoje.

Numa semana de grande tensão marcada por detenções de ativistas antigovernamentais e membros do parlamento, a Frente Cívica de Direitos Humanos (FCDH) sublinhou que “é preciso continuar a lutar pela democracia e pela liberdade”, mas “sem derramamento de sangue, sem detenções”.

créditos: EPA/ROMAN PILIPEY

Obrigada a cancelar o protesto, por não conseguir garantir a segurança dos manifestantes, a FCDH apelou hoje à população que acenda uma vela ou a lanterna do telemóvel às 20:31 (13:31 em Lisboa), para “espalhar a luz da democracia por todos os cantos de Hong Kong”.

Um horário escolhido para a iniciativa que associa, precisamente, o dia e o mês do dia em que hoje se assinalam cinco anos em que a China recusou o sufrágio universal em Hong Kong (mês 08, dia 31).

Numa longa publicação nas redes sociais, apenas em chinês, FCDH lembrou a capacidade de mobilização nos quase três meses de protesto, com milhões de pessoas nas ruas, num combate pela democracia que, sublinhou, dura há cinco anos, desde o movimento de desobediência civil conhecido como a “Revolução dos Guarda-Chuvas” que durou 79 dias.

As detenções e a proibição do protesto, segundo ativistas ouvidos pela Lusa, fazem adivinhar mais um fim de semana tenso em Hong Kong, com receio de mais confrontos violentos entre manifestantes e a polícia.

Nos últimos dias, a polícia deixou de fazer policiamento a pé pelas ruas para evitar quaisquer emboscadas às forças de segurança. Esta semana um ativista foi atacado com tacos de basebol por homens com o rosto tapado. Um polícia foi alvo também de um violento ataque com uma faca à saída de um turno, na sexta-feira.

A empresa que gere o metro em Hong Kong já decidiu encerrar uma das estações na ilha, a partir do início desta tarde, por precaução, alegando ter a informação de possíveis distúrbios no local.

A administração do aeroporto internacional de Hong Kong, um dos mais movimentados do mundo, já admitiu que pode ter de cancelar alguns voos nos próximos dias, igualmente face a ameaças de ações que podem causar sérios constrangimentos às suas operações.

Na sexta-feira, confrontada com as detenções policiais, a deputada pró-democracia Cláudia Mo disse em entrevista à Lusa que o Governo de Carrie Lam e a polícia estavam a “deitar combustível sobre o fogo” e, à semelhança da CFDH acusou as autoridades de estarem a ‘ferir de morte’ o Estado de Direito, cerceando a liberdade de expressão.

Para além dos ativistas políticos Joshua Wong, Agnes Chow, Andy Chan, Rick Hui e Althea Suen, a polícia deteve também três deputados do parlamento.

A esmagadora maioria das acusações está associada à participação e incitamento a participar em manifestações não autorizadas, agressões a polícias e vandalismo.

Desde junho, mais de 800 manifestantes foram detidos, numa escalada de violência associada também a um impasse político, com a chefe do Governo a admitir chamar a si poderes reforçados face à situação de emergência que se vive no território e com a China a estacionar tropas na cidade vizinha de Hong Kong, Schenzen.

As reações às detenções em Hong Kong já se fizeram ouvir. O Presidente dos Estados Unidos pediu à China que “aja com humanidade” para resolver o dilema de Hong Kong.

A União Europeia sublinhou a sua preocupação face aos últimos desenvolvimentos na ex-colónia britânica e a Amnistia Internacional criticou duramente a série de detenções efetuadas nos últimos dias.

Em entrevista à Lusa, o presidente da Ordem dos Advogados de Hong Kong, Philip Dykes, frisou com ironia que, pelo que se conhece de algumas das acusações, “podia deter-se metade da população”.

Os manifestantes apresentam cinco reivindicações: a retirada definitiva da lei da extradição, a libertação dos manifestantes detidos, que as ações dos protestos não sejam identificadas como motins, um inquérito independente à violência policial, a demissão da chefe de governo Carrie Lam e sufrágio universal nas eleições para este cargo e para o Conselho Legislativo, o parlamento de Hong Kong.

A transferência de Hong Kong para a República Popular da China, em 1997, decorreu sob o princípio “um país, dois sistemas”, precisamente o que os opositores às alterações da lei da extradição garantem estar agora em causa.

Tal como acontece com Macau, para aquela região administrativa especial da China foi acordado um período de 50 anos com elevado grau de autonomia, a nível executivo, legislativo e judiciário. O Governo central chinês é responsável pelas relações externas e defesa.

* João Carreira, enviado da agência Lusa 

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