“É absolutamente surreal que o único militar de Abril que acabou por ter luto nacional tenha sido o general Spínola”, afirmou Vasco Lourenço aos jornalistas, em Lisboa, à porta da capela da Academia Militar, onde decorreu esta tarde o velório de Otelo Saraiva de Carvalho, o estratego e comandante das operações militares do 25 de Abril, que morreu no domingo.

Para Vasco Lourenço, “os militares de Abril deixaram de estar na moda e deixaram de ser considerados” desde “há muitos anos” e deu como exemplo o facto de o ex-Presidente da República António Ramalho Eanes ter sido até hoje o único a ser nomeado conselheiro de Estado.

“A experiência que ganharam no Conselho da Revolução e noutros sítios foi desperdiçada por completo pelo país”, afirmou.

Vasco Lourenço, que foi questionado pelos jornalistas sobre a decisão do Governo de não decretar luto nacional pela morte de Otelo Saraiva de Carvalho, afirmou que “já entrou na rotina que o militar de Abril não merece isso”, mas que esta podia ter sido a oportunidade para “emendar a mão”.

“Podiam ter tido o golpe de asa e ter decretado desta vez, até porque o facto de o Otelo ser mais controverso era mais marcante se tivessem determinado o dia de luto nacional, era ainda mais marcante. Não o fizeram, pronto, perderam essa oportunidade”, afirmou.

“A sociedade é assim, os políticos são assim. Nós costumamos dizer às vezes que não nos perdoam por termos sido nós, uma cambada de miúdos, que fizemos o derrube do fascismo (…) quando de facto todas as lutas contra o regime da ditadura fracassaram, feitas anteriormente, e, nomeadamente, pelas oposições. Há também alguma coisa de ciúme? Não sei o que é que há, sei é que nós sentimos isto e já nos habituámos”, disse ainda.

Pela capela da Academia militar passaram hoje centenas de pessoas, muitas delas com cravos vermelhos na mão. Em algumas ocasiões, cantaram temas de José Afonso, como “Grândola, Vila Morena”, e um grupo gritou “luto nacional” quando o primeiro-ministro, António Costa, chegou ao local.

Além de António Costa, estiveram no velório o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues.

Também a líder do BE, Catarina Martins, e os deputados Luís Fazenda (BE), Sérgio Sousa Pinto (PS) e António Filipe (PCP) passaram pela capela da Academia Militar, além de vários militares de Abril.

O histórico socialista Manuel Alegre reiterou, à saída, que “se alguém merece o luto nacional é Otelo Saraiva de Carvalho”, que “restituiu a liberdade aos portugueses, ele é o dia da liberdade”.

Otelo Saraiva de Carvalho, militar e estratego do 25 de Abril de 1974, morreu no domingo de madrugada aos 84 anos, no Hospital Militar, em Lisboa.

Depois do 25 de Abril, foi comandante do COPCON, o Comando Operacional do Continente, durante o Processo Revolucionário em Curso (PREC), surgindo associado à chamada esquerda militar, mais radical, e foi candidato presidencial em 1976.

Na década de 1980, o seu nome surge associado às Forças Populares 25 de Abril (FP-25 de Abril), organização armada responsável por dezenas de atentados e 14 mortos, tendo sido condenado, em 1986, a 15 anos de prisão por associação terrorista. Em 1991, recebeu um indulto, tendo sido amnistiado cinco anos depois, uma decisão que levantou muita polémica na altura.

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