Em entrevista ao jornal Público, Francisca Van Dunnem admitiu que em algumas situações poderá não haver consequências e identificou ainda problemas no planeamento da vacinação.

“O país é relativamente pequeno e em certos estratos toda a gente se conhece e tende-se a conceder vantagens a pessoas relativamente próximas. As vacinas são outro fenómeno”, afirmou, sugerindo que esta situação poderá ter levado às situações de administração indevida de vacinas.

A ministra explicou também que há casos difíceis de avaliar e que vai ser difícil acusar em tribunal quem tomou a vacina contra a covid sem ser prioritário e que terá de ser clarificado se existia uma alternativa à entrega indevida das respetivas doses: “No caso das vacinas, não será muito fácil fazer a avaliação do ponto de vista criminal, a não ser naqueles contextos em que se nota que podendo haver uma alternativa se beneficiou pessoas em função de relações de proximidade tipo familiar ou outra. Porque é que se foi buscar a mulher e não se foi buscar o vizinho que mora ao lado?”

Van Dunem fez ainda referência ao prazo curto das vacinas, sugerindo que pode ser uma possível explicação para essas situações e que nestes e outros casos o processo de investigação poderá ser mais lento.

“Há factores que podem eventualmente condicionar as realidades que se verificaram. Claro que os casos terão de ser analisados um a um. Mas num contexto em que as doses se estragam se não forem usadas...É um problema de falta de programação. Admito que se tenham verificado situações em que faz mais sentido usar a vacina no senhor da pastelaria do que desperdiçá-la”, afirmou.

Em fevereiro, o Ministério Público já tinha instaurado 33 inquéritos relacionados com irregularidades na vacinação contra a covid-19.

Os casos de vacinação indevida continuaram a aumentar e a provocar demissões, incluindo a do coordenador da ‘task force’ para o Plano de Vacinação contra a covid-19 Francisco Ramos, que foi substituído pelo vice-almirante Gouveia e Melo, que já integrava este grupo de trabalho.

O Ministério Público delegou, posteriormente, na Polícia Judiciária a investigação de irregularidades com o plano de vacinação, “por forma a potenciar um tratamento uniformizado e maior agilização na articulação com as inspeções setoriais”.

A Inspeção-Geral das Atividades em Saúde também iniciou a 28 janeiro um processo de inspeção a estes casos. O Ministério da Saúde considerou já “inaceitável” qualquer utilização indevida de vacinas contra a covid-19, alertando que este ato poderia ser "criminalmente punível”.

Entretanto, a DGS incluiu a obrigatoriedade de existência de uma lista de pessoas a convocar para a vacina contra a covid-19 no caso de sobrarem doses, sublinhando que deve ser sempre respeitada a ordem das prioridades.