"Não dá para contar. Árvores inteiras a cair em cima dos telhados. Mas árvores centenárias, não é uma árvore qualquer. Não é dessas pequeninas que nós vemos. São árvores centenárias, árvores que partem logo uma casa, se for preciso", relatou Maria Lopes, acrescentando que, na cidade da Beira, "ninguém estava à espera disto".
À saída do avião fretado pelo Governo português para trazer sete cidadãos nacionais emigrados em Moçambique, e que aterrou na base militar de Figo Maduro, em Lisboa, por volta das 01:00, Maria Lopes ouviu umas breves palavras de conforto do ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva.
"Vocês não imaginam o vento que foi", disse a portuguesa sobre o ciclone, depois de abandonar o Boeing 767-300ER da EuroAtlantic que saíra de Moçambique às 13:00 (11:00 em Portugal).
Natural de Lamego, mas com grande parte da vida vivida em Almada, Maria Lopes partilhou a sua experiência com a passagem do Idai por Moçambique, onde estava há cinco anos.
"Começou a chover. Depois, durante a noite, até à meia-noite, [foi] muito agressivo e parecia que aquilo ia abrandar, mas depois, até perto das quatro da manhã não dá. O vento virou ao contrário, era só levantar tudo, telhados, tudo", contou.
A passagem do Idai, que inundou uma área de cerca de 1.300 quilómetros quadrados, só em Moçambique, levou a que a habitação de Maria Lopes ficasse sem água e luz.
"Nós não morremos porque não calhou", referiu aquela que é uma das 2,8 milhões de pessoas afetadas pelo ciclone que atingiu Moçambique, Maláui e Zimbabué e cujo mais recente balanço diz ter causado a morte de pelo menos 761 pessoas.
Maria Lopes conta que ficou "sem nada", e que, por isso, a solução passou por regressar a Portugal.
"A solução foi virmos embora para aqui, para o nosso país. Ficámos sem nada", disse.
Maria Lopes regressou hoje, com o seu marido, doente, e com o seu neto, de 15 anos.
"O marido está doente. Fomos lá (...) ao médico e fizeram um relatório que ele tinha de voltar à terra natal e, uma vez que o Governo abriu esta porta, nós aproveitamos", explicou a portuguesa.
Para trás ficaram um filho, uma nora e "uma netinha".
"Eles estão lá ainda porque ele casou com uma moçambicana e, então, se depois as coisas não estiverem a correr bem, depois irão para outro sítio, para casa da sogra, para o Nampula [província no norte de Moçambique que não foi afetada pelo ciclone Idai]", explicou.
Maria Lopes elogiou e agradeceu o trabalho do consulado português na região, que diz ter feito tudo o que podia.
Agora, sublinha, quer "recuperar do trauma", confiante de que "tudo vai passar".
No hangar para onde foi levada numa carrinha que transportava as suas malas e as dos seus marido e neto, Maria Lopes tinha familiares à sua espera.
"Tínhamos muitas saudades, mas o que interessa é que eles estão bem", disse, emocionada, um familiar depois de abraçar os repatriados.
Além de terem sido recebidos pelo ministro dos Negócios Estrangeiros, os sete portugueses repatriados - cinco homens, uma mulher e um jovem de 15 anos - foram acompanhados por várias equipas do Instituto Nacional de Emergência Médica de Portugal (INEM) e da Segurança Social.
O número de pessoas afetadas em Moçambique pelo ciclone Idai subiu para 531.000 e há 109.000 entradas em centros de acolhimento, das quais 6.500 dizem respeito a pessoas vulneráveis - por exemplo, idosos e grávidas que recebem assistência particular.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou que está a preparar-se para enfrentar prováveis surtos de cólera e outras doenças infecciosas, bem como de sarampo, em extensas zonas do sudeste de África afetadas pelo ciclone Idai, em particular em Moçambique.
A cidade da Beira, no centro litoral de Moçambique, foi uma das mais afetadas pelo ciclone, na noite de 14 de março.
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