Júlio Moreira “teve uma vida plena e cumpriu os seus dois últimos desejos: celebrar os 50 anos do 25 de Abril e os 50 anos de um amor intenso com [a galerista] Ana Viegas”, afirma a família em comunicado.

O velório realiza-se na próxima terça-feira, a partir das 15:00, no Cemitério de Carnide, que projetou com o arquiteto Carlos Guedes de Amorim, “com uma cerimónia especial às 19:00”. A cremação realiza-se na quarta-feira às 11:30, no mesmo cemitério.

Júlio Moreira nasceu em Lisboa, em 29 de dezembro de 1929, foi engenheiro agrónomo e arquiteto paisagista, mas manteve paralelamente uma atividade literária, como tradutor e escritor.

Publicou oito romances, entre os quais “A Barragem”, distinguido com o Prémio P.E.N. Clube, e vários contos em antologias e revistas. Alguns dos seus livros encontram-se editados no Brasil e Alemanha.

A par da ficção publicou obra ensaística, como “A Borges o que é de Borges”, na sequência de uma entrevista ao escritor Jorge Luís Borges, em Buenos Aires, e “A Inquietação do Tempo na Obra de Rilke”, sobre o escritor de língua alemã, autor de "As Anotações de Malte Laurids Brigge".

Júlio Moreira também foi autor de livros didáticos e de ficção infantil entre os quais “A Grande Viagem dos Homens” (2010), que faz parte da lista de obras recomendadas pelo Plano Nacional de Leitura.

O seu último romance publicado em vida, “O Dia Claro”, data de 2011.

Da sua bibliografia refira-se ainda “Notícias do Labirinto” (2005) e “Dentro de 5 Minutos” (2002).

A Fundação Calouste Gulbenkian, no seu 'site', recorda o seu trabalho como arquiteto paisagista, em particular a participação na 2.ª Exposição de Design Português, promovida em 1973, com a exposição "Landscape Design", organizada pelo seu atelier, Paisagem Lda.

"Landscape Design", como a Gulbenkian indica, é "considerada a primeira manifestação consistente duma consciência ecológica em Portugal."

Júlio Moreira escreveu o livro "O Mundo é a Nossa Casa" no âmbito desta exposição, com desenhos da cenógrafa e designer Cristina Reis.

Na altura, "este livro foi apreendido e destruído por ordem de Marcelo Caetano, à época chefe do governo", acrescenta a Gulbenkian, sobre este ato do último ano da ditadura.

“O Mundo é a Nossa Casa” teve uma nova edição em 2009.

No percurso de Júlio Moreira como arquiteto paisagista, a Gulbenkian enumera ainda intervenções em espaços industriais, como as áreas envolventes do bairro operário A Tabaqueira (1966), colaborações em planos sobre espaços de interesse patrimonial, como o plano de reconversão do Mosteiro de Alcobaça (1995), e projetos em torno de espaços reservados, como aconteceu com os cemitérios de Carnide (1985) e do Lumiar (1999), em Lisboa.

Em 2012, com o encerramento do seu atelier, Paisagem Lda, Júlio Moreira confiou o seu espólio à Gulbenkian. Pertence agora ao acervo da Biblioteca de Arte e Arquivos desta fundação, "estando atualmente em fase de tratamento documental", indica a instituição.

O curador e administrador da Fundação EDP, José Manuel dos Santos, sobre Júlio Moreira, afirma: “Escritor, quis imaginar o tempo que viveu para o entender melhor. Paisagista, procurou nos jardins da vida e da morte uma harmonia que o seu amigo José de Almada Negreiros buscava nos números e nos seus mistérios inumeráveis. Cidadão, foi sempre fiel a um impulso de tornar o mundo mais habitável e mais justo”, lê-se no comunicado divulgado pela família.

No mesmo comunicado, o escritor Helder Macedo dá conta do seu pesar e escreveu: “Saudações ao Júlio, o escritor, o construtor de paisagens renovadas, o lutador do impossível, o amigo de sempre e para sempre”.