Na intervenção de abertura da XII Convenção Nacional do BE, que decorre até domingo em Matosinhos, distrito do Porto, a líder bloquista, Catarina Martins, atirou diretamente ao PS e recordou a “escolha reveladora” que fez nas eleições legislativas de 2019, já que “o objetivo da sua campanha foi exigir uma maioria absoluta e combater a esquerda”.

“Como explicou António Costa em entrevista ao Expresso e cito, ‘um Bloco forte significa ingovernabilidade’, ou, como disseram outros dirigentes do PS, era preciso salvar o Governo das pressões da esquerda. Nada foi mais importante para o PS do que atacar a esquerda nessas eleições”, acusou.

Recordando os dias a seguir a essas eleições, que determinaram o fim da “geringonça”, Catarina Martins recordou “a recusa do PS em aceitar um compromisso de medidas sociais para os quatro anos seguintes” que, na sua opinião, “mudou os dados da política” em Portugal.

“Não atuamos por ressabiamento, não temos estados de alma, não ficamos zangados pelo facto de o PS ter fechado a porta a uma solução de estabilidade para quatro anos. É a sua escolha, nós abriremos outra porta. Do que não abdicamos é de conseguir já as medidas que são urgentes para o nosso povo”, assegurou.

A líder bloquista atribuiu ainda ao PS a responsabilidade por não ter cumprido o acordado nos orçamentos de 2020, recuperando uma expressão do primeiro-ministro para dizer que não “basta a palavra dada”, mas sim as decisões.

Catarina Martins deixou vários avisos ao PS e foi clara a afirmar que o BE não abdica “de conseguir já as medidas que são urgentes” para o povo português.

“Nas discussões com o Governo ao longo do ano passado, conseguimos bons compromissos para o SNS [Serviço Nacional de Saúde], mas não foram cumpridos. Conseguimos compromissos para os trabalhadores informais, que não foram cumpridos. Conseguimos compromissos para as cuidadoras informais, que não foram cumpridos”, recordou, referindo-se ao Orçamento do Estado para 2020 e ao suplementar do mesmo ano.

Para a coordenadora do BE, a “responsabilidade é de quem não cumpriu”, uma vez que “não foi feito o que tinha que ser feito”, apontando as culpas ao Governo socialista.

“Por isso, se nos dizem que basta a palavra dada, lembro que a palavra vale desde que leve a decisões no tempo certo”, atirou, numa referência a uma expressão célebre do primeiro-ministro, António Costa, de que “palavra dada é palavra honrada”.

Foi por isso, segundo Catarina Martins, que quando chegaram as negociações para o Orçamento do Estado para 2021 o BE pôs “em cima da mesa quatro garantias de medidas estruturais”, que foram as carreiras profissionais para o SNS, o “fim do abuso” no Novo Banco, acabar com as leis laborais da ‘troika’ e “uma política social de combate à pobreza na pandemia, que não deixasse ninguém de fora”, todas elas que considera “medidas elementares e de bom senso”.

“Sem as medidas necessárias para o SNS, sem a proteção social e sem a correção dos abusos contra quem trabalha, votámos contra um orçamento que não dava as garantias necessárias à gestão do esforço económico e social contra a pandemia. A política tem que ter esta clareza. Não se pode perder tempo nem recursos nesta emergência que vivemos”, defendeu.

Bloco foi "partido de esquerda" que "nunca" faltou à população" na pandemia

A coordenadora bloquista defendeu também que o partido voltaria a viabilizar o estado de emergência "sem a menor hesitação", porque o importante é "salvar vidas", salientando que o BE foi a força de esquerda que "nunca" faltou à população.

"Quando a pandemia começou e a ciência só sabia que o vírus era altamente contagioso, havia apenas uma medida a tomar: o confinamento, que implicou a restrição do direito constitucional de nos deslocarmos. Aprovámo-lo e voltaríamos a aprová-lo sem a menor hesitação", afirmou Catarina Martins.

Defendendo que "não estava em causa nada mais importante do que salvar vidas", a líder bloquista rejeitou as críticas dos que dizem que “bastaria um confinamento entre 19 de março e 02 de abril de 2020 e que, a partir de então, a esquerda o deveria ter recusado durante todo o ano seguinte".

"Havia uma emergência e foi preciso atuar em emergência. O Bloco nunca abandonou as prioridades sanitárias e somos por isso o partido de esquerda que pode e deve dizer com confiança a toda a população que sofreu estes meses terríveis: nunca vos faltámos”, afirmou.

“Fizemos o que tínhamos que fazer para proteger toda a gente e nunca faltámos às medidas razoáveis que impedissem a pandemia e reforçassem o Serviço Nacional de Saúde", salientou a líder do BE - partido que viabilizou, a maioria pela abstenção, os estado de emergência, ao contrário de PCP e PEV.

Para Catarina Martins, “os números não deixam a menor das dúvidas”.

“Tivemos 99% das mortes depois dessas datas. Precisámos do confinamento em 2020 e voltámos a precisar em 2021 e fizemos bem em assumir a proteção da saúde do nosso povo", justificou.

A coordenadora apontou que, quando foi necessário tomar decisões, o partido não hesitou, salientando que não faz "parte do jogo da inconsciência", nem recusa "a emergência por conveniência de discurso partidário, aliás na esperança secreta de que a sua posição nem seja ouvida nem seja aplicada".

"Percebo que haja setores da direita para quem um euro de lucro vale mais do que uma pessoa contaminada, mas a esquerda é de outra fibra e não troca vidas por negócios", atirou.

Lamentando que Portugal registe hoje "mais de 17 mil pessoas mortas com covid-19 diagnosticada" e alertando que o "contágio não terminou", Catarina Martins garantiu que o BE não argumenta "com os negacionistas", pois "a irresponsabilidade não cabe no campo do argumentável".

De acordo com a líder, o BE também não debate "com os antivacinas" e não aceita "os governantes que, de Bolsonaro [presidente do Brasil] a Modi [primeiro-ministro da Índia], desprezam o seu povo".

Catarina Martins assinalou ainda as medidas adotadas na convenção (redução para metade do número de delegados, medição de temperatura à entrada ou afastamento entre cadeiras), salientando não há, no Centro de Desportos e Congressos de Matosinhos, "nada que se pareça com o congresso do partido da extrema-direita, onde os campeões negacionistas festejam a sua irresponsabilidade e arrogância".

(Notícia atualizada às 13h11)