"Estou preocupada, porque vi a floresta burocrática que esta senhora [a mulher do empresário] tem que enfrentar, a falta de vontade política para ir ao fundo da questão, e a falta de resposta judicial e policial", disse Ana Gomes a partir de Maputo, para onde viajou há dois dias para contactos com Salomé Sebastião, esposa do empresário português rapado na Sofala em 2016.

"A deslocação estava programada e combinada há mais de um mês, e coincidiu com esta tragédia resultante da devastação originada pelo ciclone na zona da Beira", explicou Ana Gomes, vincando que, "da mesma maneira que é preciso mobilizar o apoio às vítimas deste fenómeno natural, também as autoridades moçambicanas deviam ajudar-se a si próprias e deixar-se ajudar para esclarecer o que aconteceu".

Em causa está o facto de as autoridades moçambicanas terem, até agora, rejeitado as ofertas do Ministério Público, Polícia Judiciária e Procuradoria-Geral da República portuguesas para ajudarem nas investigações, disse Ana Gomes.

"Se houver alguém que queira, a nível político, empenhar-se no esclarecimento cabal deste caso e na localização do nosso cidadão, não tenho dúvida nenhuma que há capacidade e competência em Moçambique para o fazer; se até hoje isso não aconteceu é porque não houve empenho político", vincou a eurodeputada.

"Eu sei que isto aconteceu numa zona politicamente disputada entre a Renamo e a Frelimo mas foi numa zona completamente controlada pela Frelimo, ocorreu por parte de indivíduos fardados, com forças de segurança ligadas ao partido no poder e ao Governo, portanto há uma série de pistas que a família conhece e que não foram seguidas", lamentou.

Questionada sobre a razão para esta "falta de vontade política", Ana Gomes respondeu: "Isso tem de ser perguntar à autoridades moçambicanas; o facto de a investigação não ser levada a cabo competentemente, o facto de não terem sido aceites as repetidas ofertas das autoridades portuguesas, o que é altamente raro e suspeito, o facto de a nível político se colocar todo o enfoque na PGR, quando a questão é, não só judicial e de polícia, mas também política, porque essa zona é controlada pelas forças de segurança nacional, tornam tudo isto muito estranho e angustiante".

Ana Gomes parte no sábado de Maputo, para onde se deslocou a pedido da esposa do empresário: "Estou aqui há dois dias e vi o calvário que ela percorre; não foi dada prioridade política a este caso, e saio daqui bastante preocupada", concluiu.

Américo Sebastião foi raptado numa estação de abastecimento de combustíveis e continua desaparecido desde a manhã de 29 de julho de 2016, em Nhamapadza, distrito de Maringué, na província de Sofala, no centro de Moçambique.

No início do ano, a Procuradoria-geral de Moçambique mandou avocar o processo, que tinha sido encerrado, no início de 2018, pela Procuradoria Provincial de Sofala, centro de Moçambique, alegadamente por falta de elementos.

No esforço para encontrar Américo Sebastião, a esposa do empresário, Salomé Sebastião, tem estado em contacto com as autoridades moçambicanas, incluindo a procuradora-geral de Moçambique, Beatriz Buchili.

Nunca mais se soube do paradeiro do empresário desde o rapto, perpetrado por homens fardados, que algemaram o empresário e o colocaram dentro de uma das duas viaturas descaracterizadas com que deixaram o posto de abastecimento de combustíveis, segundo testemunhas.

Segundo a família, os raptores usaram os cartões de débito e crédito para levantarem "4.000 euros", não conseguindo mais porque as contas foram bloqueadas logo que foi constatado o desaparecimento de Américo Sebastião.

Salomé Sebastião já entregou três petições à Assembleia da República moçambicana, além de ter enviado uma carta ao Presidente moçambicano, no quadro dos esforços par encontrar o empresário português.