“Neste momento, já ultrapassámos o pico que teve lugar na última semana de janeiro e a descida está a ocorrer com uma taxa que é comparável àquela que tivemos em março quando confinámos nos primeiros dias”, adiantou o professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Manuel do Carmo Gomes adiantou que as medidas de confinamento tomadas no dia 21 de janeiro “foram decisivas” para que as taxas recomeçassem a descer, tendo-se notado “descidas mais acentuadas em particular nos 13 aos 17 anos, nos seis aos 12 anos e de um modo geral em todas as outras idades”.

Portanto, defendeu, “o fecho das escolas foi bastante importante para acelerar as taxas de variação diárias (em baixa) do número de novos casos”.

No fim do mês de janeiro, as taxas de variação diária de novos casos de infeção com o coronavírus SARS-CoV-2 tornaram-se negativas, o que significa que começou a descer o número de contágios.

“Passamos a ter menos casos por dia do que tínhamos no dia anterior, o que significa que ultrapassamos o pico e estamos a descer a um ritmo bastante bom”, vincou.

Contudo, advertiu, não deve haver precipitação em aliviar as medidas de confinamento sem que Portugal consiga atingir um nível de incidência diária relativamente baixo, não ultrapassando os 3.500 a 4.000 novos casos por dia.

Segundo Carmo Gomes, o país ainda pode levar algumas semanas até chegar a este nível.

“Quanto mais nos mantivermos bastante confinados mais rapidamente chegamos a este nível de incidência”, defendeu, explicando que se o país atingir este nível, a ocupação hospitalar não deve ultrapassar os 1.800 a 2.000 internados com covid-19, o que corresponde aproximadamente a 250 a 280 camas em cuidados intensivos, o que parece ser uma “situação gerível” pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Estes últimos dados são baseados num estudo feito para os meses de agosto, setembro e outubro, quando Portugal não estava “na atual situação de grande constrição nos hospitais”.

“Portanto, se nós aceitarmos que este nível é gerível pelo SNS, conseguir descer a incidência para estes níveis é uma regra imperativa para proteger o sistema nacional de saúde”.

Paralelamente, "é preciso aumentar a testagem, o rastreio e testagem dos casos. Neste momento, a percentagem de casos positivos entre os que são testados é elevadíssima, sendo que há dois dias era de cerca de 20%", disse.

“Para podermos desconfinar e voltar a uma vida normal, depois de atingir o nível de incidência há pouco tempo, é necessário que tenhamos um nível de testagem suficientemente elevado para não termos uma positividade que ultrapasse os 10%, sendo que o ideal era estar em 5%”, salientou.

Manuel do Carmo Gomes defendeu ainda a necessidade de adotar a proposta da Comissão Técnica de Vacinação: vacinar o maior número possível de pessoas vulneráveis e de alto risco o mais depressa possível.

Carmo Gomes defende alargamento do período entre as duas tomas da vacina

O epidemiologista Manuel Carmo Gomes defendeu ainda o alargamento do período entre as duas tomas da vacina contra a covid-19 até seis semanas para conseguir vacinar até março os maiores de 80 anos e as pessoas de alto risco.

“O alargamento do tempo entre a primeira e a segunda dose até seis semanas não tem problema nenhum e tinha uma grande vantagem, permitia-nos vacinar o maior número possível de pessoas no menor tempo possível”, afirmou.

“Isto seria excelente”, disse, ressalvando, contudo, que o processo também está condicionado pelo número de vacinas que vão chegando.

Sobre o prazo estabelecido para a vacinação, Carmo Gomes explicou que as companhias Pzifer e a Moderna fizeram ensaios clínicos “muito mais acelerados” do que é habitual.

“Uma das formas de acelerar foi espaçarem a primeira e a segunda dose nos tempos mínimos que lhes pareciam que eram admissíveis 21 dias e 28 dias, mas isto não é normal. Isto foi feito devido à situação catastrófica em que nós estamos”, salientou.

Segundo o investigador, o que “é normal” é fazer um espaçamento entre doses muito superior, apontando que no Programa Nacional de Vacinação o tempo recomendado pela Comissão Técnica da Vacinação na primovacinação das crianças são dois meses.

“Aquilo que é normal, recomendável, são as oito semanas, não são os 21 dias nem as quatro semanas, e do ponto de vista imunológico não há desvantagem em alargar o período de tempo entre as duas doses”, reiterou.

Lembrou que na terça-feira saiu um ‘preprint’ na revista Lancet para a vacina da Astrazeneca que mostra que se for alargado o tempo que decorre entre a primeira e a segunda dose até às 12 semanas, “a eficácia da proteção conferida pela primeira dose vai sempre subir e se a segunda dose for dada às 12 semanas ou mais tarde a proteção conferida até é mais alta”.

“Portanto, as pessoas não têm de ficar alarmadas, especialmente as pessoas que entraram no mundo da vacinologia há pouco tempo”, comentou Carmo Gomes.

O balanço mais recente da vacinação indica que já foram administradas 275.093 primeiras doses de vacinas e 75.852 segundas doses no país até à meia-noite desta quarta-feira.