Entre 8 de março e 31 de maio foram cancelados 7.866 espetáculos, adiados 15.412 e suspensos 1.537 eventos, afetando um total de 24.815 eventos culturais e artísticos de dança, música, teatro e outras artes performativas. Números que podem vir a aumentar nas próximas semanas (ou meses).

Os dados são da Associação de Promotores e Espetáculos, Festivais e Eventos (APEFE) e foram divulgados uma semana depois de entrar em vigor o decreto-Lei nº10-I/2020, que estabelece "medidas excecionais e temporárias (...) no âmbito cultural e artístico".

Este decreto-lei, que se sobrepõem ao regime geral dos espetáculos, abrange “espetáculos de natureza artística, promovidos por entidades públicas ou privadas, não realizados no local, data e hora previamente agendados”. São orientações e condições específicas que, por um lado, conferem "uma proteção especial aos agentes culturais envolvidos" e, por outro, fixam os direitos dos portadores de bilhetes desses eventos. Neste artigo, com a ajuda de Ana Sofia Ferreira, jurista e coordenadora do Gabinete de Apoio ao Consumido da DECO, explicamos-lhe como e em que circunstâncias.

O que fazer se tiver bilhete para um evento que foi cancelado?

Pode pedir o seu reembolso. De acordo com o decreto, "o cancelamento do espetáculo dá lugar à restituição do preço dos bilhetes de ingresso já vendidos" e "não deverá ter custos acrescidos para o consumidor final".

E se o evento for reagendado?

Se o evento tiver nova data, não poderá pedir o reembolso do valor do ingresso.

Mas há regras específicas para o reagendamento: o espetáculo tem de ocorrer no prazo máximo de um ano após a data inicialmente prevista.

No caso dos reagendamentos em que é necessário alteração do local dos espetáculos, essa alteração "fica limitada à cidade, área metropolitana ou a um raio de 50 km relativamente à localização inicialmente prevista".

Isto é, um evento inicialmente agendado para Lisboa não pode ser alterado para Leiria ou para o Porto. Se for, o consumidor poderá pedir o reembolso do valor. Se um evento no Altice Arena foi reagendado para o Coliseu de Lisboa, o consumidor não poderá ser ressarcido.

Mais, o reagendamento do espetáculo não pode implicar o aumento do custo do ingresso para quem já era portadora do mesmo e, na eventual substituição do bilhete "não pode ser cobrado qualquer outro valor ou comissão".

Se um evento tinha bilhetes à venda por 30 euros, com o seu reagendamento esse valor deve manter-se inalterado. Se for necessário um novo ingresso, por exemplo para a substituição de algum código de acesso, esse procedimento não poderá ser custeado pelo portador do bilhete.

São já vários eventos nesta situação e estas são novas as datas que precisa de colocar na sua agenda.

Há prazos?

Sim, atente nesta parte.

O decreto-lei aplica-se a todos os espetáculos que não podem ser realizados "no lugar, dia ou hora agendados, entre os dias 28 de fevereiro de 2020 e até ao 90.º dia útil seguinte ao fim do estado de emergência". Isto é, se o estado de emergência for levantado no próximo dia 17 de abril, estas disposições continuam em vigor quase até ao final de agosto.

E, de acordo com o diploma, "o cancelamento do espetáculo dá lugar à restituição do preço dos bilhetes de ingresso já vendidos, o qual deve ocorrer no prazo máximo de 60 dias úteis após o anúncio do cancelamento". Isto é, depois de o promotor anunciar o cancelamento, tem 60 dias úteis para pedir o reembolso do valor do bilhete.

E caso não possa ir na nova data?

Nesse caso, explica a jurista Ana Sofia Ferreira, o portador do bilhete pode tentar chegar a um acordo com o promotor do evento para o qual tinha bilhete. Essa é, aliás, uma possibilidade prevista pelo decreto das medidas excecionais.

O consumidor poderá chegar a esse entendimento junto do promotor e pedir a substituição do evento por outro espetáculo por si organizado, fazendo o devido acordo monetário caso haja diferença de valor.

O local de aquisição do bilhete condiciona forma de reembolso?

De acordo com a jurista da DECO, neste período, "é indiferente" o local de aquisição do ingresso.

"O facto de o consumidor ter adquirido o bilhete do espetáculo diretamente ao organizador ou através de um revendedor, numa loja física ou numa bilheteira online, é indiferente para a questão do reembolso", explica a coordenadora do Gabinete de Apoio ao Consumidor.

A forma do reembolso é que pode mudar. Se comprou online e pagou através de um cartão, está previsto, nos termos e condições da plataforma, que o reembolso seja feito para o mesmo cartão que usou para adquirir o bilhete. Se adquiriu o ingresso numa loja física, e caso se dirija a esse local, poderá ter o reembolso por transferência bancária ou em numerário.

Tendo comprado numa loja física posso pedir o reembolso online?

"A ideia, neste momento, é naturalmente os consumidores tentarem o exercício de todos os seus direitos à distância em todas as situações em que o seja possível", começa por explicar a Ana Sofia Ferreira.

"Os revendedores de bilhetes [Worten, FNAC, outros] e os promotores têm canais de comunicação à distância. O consumidor pode contactá-los através dos meios disponíveis, dizer que já foi informado do cancelamento do espetáculo e que pretende o reembolso. Depois deverá ser combinada a forma de reembolso mediante o comprovativo de compra naquele local através da fatura, da forma de pagamento ou do número que foi atribuído”, acrescenta.

Um doente infetado por Covid-19 pode pedir o reembolso de um bilhete de um evento que se realizou e ao qual não compareceu?

A coordenadora do Gabinete de Apoio ao Consumidor assume que a DECO recebeu "algumas questões nesse sentido", mas que esta é uma situação diferente e "uma condição específica do próprio espetador".

"Antes de declarado o estado de emergência ou antes da regra da impossibilidade da realização de espetáculos com mais de 'x' pessoas, foi colocada essa questão relativamente a doentes positivos para Covid-19 ou em regime de quarentena por suspeitas".

No entanto, essa é "uma condição do próprio consumidor que, independentemente de estar infetado com Covid-19 ou com qualquer outra doença, não permitiu que fosse a um espetáculo que se realizou normalmente".

O que fazer nesse caso? "Numa situação de doença do espetador não há obrigação do promotor em devolver o valor do bilhete a menos que exista seguro contratado pelo consumidor para essa situação específica. No entanto, aconselha a entidade para a defesa do consumidor, este pode contactar o promotor e, "atendendo à excecionalidade da questão", chegar a um acordo para o reembolso.

E no caso dos festivais de verão?

Esta é uma questão cuja resposta depende de três "Se's":

1) Se o festival for cancelado, a questão do reembolso é a descrita acima.

2) Se o festival se realizar nas datas previstas, mas com alterações ao cartaz, ou se o festival tiver novas datas, também com alterações ao cartaz, aplicam-se as regras do regime geral dos espetáculos. Que, no entender da DECO, não são claras para eventos com vários artistas.

A associação de defesa do consumidor defende, no entanto, que "se o nome cancelado é cabeça de cartaz ou se lhe foi dado grande destaque, e é percetível que grande parte dos consumidores adquiriram bilhete para o ver, o valor deve ser reembolsado".

Porém, se o bilhete tiver sido adquirido "antes de ter sido publicitado o cartaz", o consumidor não terá direito ao reembolso porque iria "participar no festival independentemente dos artistas" confirmados.

Sublinhe-se que o reembolso refere-se apenas ao bilhete diário. "Para quem compra o passe geral já é mais complicado provar a essencialidade de um artista de um dia", refere Ana Sofia Ferreira.

3) Se o festival for reagendado, entre 28 de fevereiro de 2020 e até 90 dias úteis após o término do estado de emergência, e mantiver o cartaz e local, aplicam-se as regras dispostas no decreto-Lei nº10-I/2020.

DECO dá nota positiva 

Desde que "esta situação começou a tomar algumas proporções em Portugal", primeiro com as restrições para a não realização de eventos com lotação superior a cinco mil pessoas, depois com a declaração do estado de emergência, a DECO recebeu "vários pedidos de informação" por parte dos consumidores.

O número não aumentou substancialmente com com a entrada em vigor das novas medidas excecionais. De acordo com a jurista da associação existe "a perceção de que esta é uma situação extraordinária" e "os consumidores estão com vontade de aceitar o reagendamento". As situações estão ser solucionadas por acordo entre os agentes económicos e os consumidores. O que, para a coordenadora do Gabinete de Apoio ao Consumidor da DECO, é "muito positivo".

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