“Quando Trump me pediu que trabalhasse com ele, eu sabia que tinha um 'produto' que iria fazer eco em milhões de americanos. Qualquer publicitário dirá que é mais fácil vender um iPod do que um Zune”, disse em analogia Brad Parscale, o responsável pela estratégia digital durante a campanha presidencial de 2016 do atual presidente norte-americano, Donald Trump.

Parscale veio a Lisboa para ser um dos pontos fortes da cimeira, num dia em que se celebra um ano de uma das maiores viragens políticas deste milénio: a eleição de Donald J. Trump.

Não se falou sobre mais nada, nem o estratega deixou que se falasse, sobretudo daquilo que ele não dominava. Quando foi interpelado por um jornalista que o questionou sobre qual seria o resultado numa campanha política portuguesa caso as suas linhas de orientação fossem aplicadas, disse somente “eu não sei nada sobre política portuguesa", acrescentando ainda que esta era a sua primeira viagem a Lisboa, "uma cidade muito bonita".

Durante a campanha a sua função centrava-se em angariar fundos, e definir e orientar a estratégia digital do então candidato republicano - do website às redes sociais. E foi a isso que se agarrou e assim ‘fintou’ as perguntas sobre a intervenção russa nas eleições e sobre se voltaria a trabalhar com Trump. “Ele é que é o meu patrão, não eu o dele”, disse entre sorrisos num encontro com alguns jornalistas atrás do palco principal da Altice Arena.

Em três palestras distintas, mas subjugadas ao mesmo tema, o homem que foi apelidado pelo Washington Post de “génio” desvendou parte do caminho traçado pelo magnata do imobiliário até à Casa Branca, e deixou em Lisboa dois conselhos para uma vitória de Trump em 2020: contratá-lo e continuar a tweetar.

Facebook dos ovos de ouro 

Toda a estratégia da campanha passou por “perceber em que direção a seta tinha de ser apontada”, em “selecionar de forma muito precisa os eleitores que estavam recetivos à mensagem” de Donald Trump, explicou Brad Parscale. E no digital não foi diferente.

“Tivemos que delimitar muito bem o universo que queríamos atingir, as pessoas que estavam recetivas à mensagem. E chegámos à conclusão que essas pessoas estavam no Facebook, até porque há cada vez menos espetadores de televisão (…). Os dados mostraram-nos a direção em que a seta tinha de ser apontada”, afirmou, num painel sobre as mudanças nas campanhas eleitorais na era do digital.

Por outro lado, prosseguiu, as redes sociais permitiram à campanha de Trump contornar a circunstância de disporem de um orçamento consideravelmente inferior ao da rival democrata, Hillary Clinton.

Para isso, Parscale recordou como pediu ajuda à própria rede social Facebook para "perceber como conseguir melhores alcances e chegar aos quase 100 milhões de dólares que foram angariados através desta rede social". Uma oportunidade de trabalhar com a famosa rede de Mark Zuckenberg que Clinton rejeitou.

“Tínhamos os avós a controlar os seus netos, os jovens a falar com amigos da escola. E o custo é tão baixo, consegue-se atingir milhões de potenciais eleitores por uma fração do custo. Usar o Facebook foi a melhor forma de contornar a desvantagem de termos menos dinheiro”, afirmou. "Sem isso não conseguiríamos competir", confessou.

Brad Parscale diferenciou, no entanto, as redes sociais em função da sua utilidade para a campanha de Donald Trump.

“As pessoas às vezes confundem as coisas. Trump usou o Twitter para falar para a América e para gerar media. O Facebook não foi usado para colocar anúncios que se traduzissem em votos, para mudar opiniões, foi sobretudo usado para pagar as contas porque foi aí que a maior parte do dinheiro foi gerado [os donativos nesta rede social renderam mais de 280 milhões de dólares, cerca de 250 milhões de euros]. Foram esses os dois motores. As pessoas confundem as coisas”, reiterou.

“Continue a tweetar, senhor presidente”

O Twitter é outro mundo. Aí, Parscale teve apenas uma preocupação: a de não colocar qualquer tipo de filtro à atividade de Trump. Aliás, o estratega diz esperar que Donald Trump use a rede social "o máximo possível" porque esse é o melhor método para comunicar "diretamente com as pessoas".

“Sou um fã de ele [Trump] usar o Twitter. Toda a gente me pergunta: devíamos tirá-lo do Twitter? E eu digo: quero que ele tweet o mais que conseguir, acredito que as pessoas querem ouvir os seus líderes e qual é a melhor maneira de o fazerem que não seja com eles falarem diretamente com as pessoas? E espero que eles nos dêem a todos 280 caracteres“, disse Parscale em resposta a uma questão do Observador.

Trump e Parscale a trabalharem juntos em 2020? "Vai ter que lhe perguntar”

Os elogios à estratégia definida por Parscale levaram a que, quer no palco, quer diante dos jornalistas, o publicitário de 41 anos fosse questionado sobre se vai trabalhar com Donald Trump nas eleições de 2020. "Vai ter que lhe perguntar, mas espero que sim", respondeu perentoriamente. "Ele é o meu chefe, não sou eu o chefe dele. Espero que ele me telefone, mas se ele quiser enviar um tweet, por mim, tudo bem", ironizou.

créditos: MIGUEL A. LOPES/LUSA

Sobre se este tinha sido o cargo mais importante que assumiu na vida, Parscale respondeu com uma pergunta: "Quem não quer jogar no Super Bowl?". "Fui abençoado e foi uma das melhores oportunidades da minha vida", admitiu, recordando o dia da eleição, há um ano, como "um momento emocionante".

"Tive a possibilidade estar com ele no palco naquela noite e ver o meu país andar para a frente. Continuo a achar que o plano de Trump vai ser uma coisa ótima para o país. Espero ter a possibilidade de ajudar a que sejam oito anos em vez de quatro", antecipou.

Rússia? "Eu não recebi dinheiro da Rússia”

Perguntas sobre a interferência russa nas eleições norte-americanas iriam surgir, só não se sabia quando. Eis que no painel “O efeito Trump, um ano depois”, comandado pelo jornalista da Yahoo News Michael Isikoff, o tema veio ao de cima. Em causa o facto de, na altura da campanha eleitoral, Parscale ter partilhado um ‘tweet’ de uma conta falsa do Partido Republicano do Tennesse controlada por um ‘bot’ russo.

“É uma questão do Twitter, eu não recebi dinheiro da Rússia”, sublinhou o responsável, acrescentando que “não há mais história por detrás” dos retweets.

Brad Parscale reforçou que faz “muitos retweets’" e que “não há nada para além disso”.

“É mau que haja ‘troles’ russos e é má a implicação na Rússia na campanha, mas eu não posso fazer nada, nem posso voltar atrás no tempo”, acrescentou.

O responsável pela estratégia digital da campanha de Donald Trump concordou todavia com que “se investigue tudo”, de forma a se perceber o que aconteceu e como evitá-lo no futuro.