O grupo de trabalho que debateu a terceira fase de alterações ao regimento da Assembleia da República concluiu hoje as votações indiciárias das propostas de alteração, que terão de ser ratificadas pela Comissão de Assuntos Constitucionais e confirmadas em plenário em votação final global, previsivelmente na quinta-feira.

Se a primeira fase de alterações, concluída em dezembro, apenas introduziu alterações que aumentam os tempos e direitos de intervenção dos deputados únicos, e a segunda fase, em fevereiro, também foi cirúrgica (transferindo do plenário para as comissões o debate de grande parte dos votos), nesta terceira fase tanto PS como PSD quiseram mexer em mais de 50 artigos do regimento, com PAN, Iniciativa Liberal e deputada não inscrita Joacine Katar Moreira a apresentarem apenas alterações pontuais.

Algumas propostas do PSD foram ‘chumbadas’, como a redução de três para dois plenários semanais ou a alteração no regimento de que as declarações políticas são quinzenais em vez de semanais, como refere o texto atual, apesar de não ser habitual essa periodicidade.

Outras foram deixadas cair pelos proponentes, como a sugestão do PS para explicitar que o Presidente da Assembleia da República (PAR), sempre que tivesse dúvidas sobre a constitucionalidade de uma iniciativa, podia pedir parecer à Comissão de Assuntos Constitucionais, ou a do PSD que pretendia que os candidatos a conselheiros de Estado indicados pelo parlamento tivessem uma audição prévia - duas propostas dos textos iniciais que acabaram por não constar do texto de substituição hoje aprovado.

Depois de quatro sessões do grupo de trabalho, seguem-se as principais alterações que deverão figurar no futuro regimento e entrar em vigor em 1 de setembro, se se confirmarem em votação final global:

  • Terminam os debates quinzenais com o primeiro-ministro, que são substituídos por debates mensais em formato alternado: num mês, com o chefe do Governo sobre política geral e, no seguinte, sobre política setorial com o ministro da pasta. Ambos os debates passam a ter duas rondas (atualmente o quinzenal tem apenas uma);
  • Cria-se um debate sobre o “progresso da regulamentação das leis, a sequência dada às recomendações políticas e a falta de resposta a requerimentos”, uma proposta do PSD aprovada com os votos contra do PS;
  • Tempos de debate em plenário e comissões será fixado pela conferência de líderes no início de cada legislatura atendendo “à representatividade dos partidos”. Ficaram de fora as várias propostas do PSD que detalhavam ao minuto os tempos de cada força política (distinguindo entre os dois maiores partidos, o terceiro e quarto e assim sucessivamente), mas foi aprovada uma norma transitória proposta pelos sociais-democratas para que, na atual legislatura, essas grelhas sejam definidas numa reunião de líderes na primeira quinzena de setembro para entrarem já em vigor na segunda sessão legislativa;
  • Cria-se um novo artigo no regimento para regular a realização de sessões solenes, nomeadamente a cerimónia anual do 25 de Abril, sobre a qual o documento era omisso. O texto refere que “podem ainda realizar-se sessões solenes evocativas de outros eventos ou da memória de personalidades, por iniciativa do Presidente da Assembleia, bem como sessões solenes de boas-vindas a Chefes de Estado estrangeiros ou a líderes de organizações internacionais de que Portugal faça parte, com faculdade de uso da palavra por estes convidados”;
  • Introduz-se um artigo sobre a organização do processo de revisão constitucional, que não estava regulado no regimento, transpondo-se a regra da Constituição de que “apresentado um projeto de revisão constitucional, quaisquer outros têm de ser apresentados no prazo de trinta dias e, uma vez findo esse prazo, é constituída uma Comissão Eventual de Revisão Constitucional”;
  • A autorização do estado de sítio ou de emergência tomam a forma de resolução, bem como a sua confirmação ou recusa (atualmente tomava a forma de lei em caso de confirmação e de resolução em caso de recusa). O PSD retirou uma proposta inicial que previa que este debate se realizasse em apenas 41 minutos (pelo atual regimento podia durar uma dia), passando o novo texto a remeter a definição dos tempos para conferência de líderes, com “respeito pela respetiva representatividade”;
  • Nos órgãos externos eleitos pelo parlamento, encurta-se o prazo para apresentação de candidatos (10 dias em vez de 30 antes da eleição) e alarga-se o número de entidades a ouvir pelo parlamento. No entanto, o PSD deixou cair em relação à sua proposta inicial a necessidade de audição prévia dos membros do Conselho de Estado, que já não consta do texto de substituição aprovado;
  • Clarifica-se no artigo relativo às faltas dos deputados que “as ausências ao plenário e às comissões parlamentares quando o deputado se encontre noutros trabalhos parlamentares” são registadas “com a menção do ato de representação que motivou a ausência”;
  • Simplifica-se a leitura do expediente (iniciativas entradas) no início do plenário, bastando fazer “menção sumária à natureza da iniciativa, numeração e autor, devendo os demais elementos identificativos ser disponibilizados de imediato para consulta em local próprio no site da Assembleia da República na Internet”;
  • Em cada quinzena, pode realizar-se um debate de urgência a requerimento potestativo (obrigatório) de um grupo parlamentar; por outro lado, os grupos parlamentares e o Governo podem requerer fundamentadamente ao Presidente da Assembleia a realização de debates de atualidade (invertendo-se a terminologia dada aos dois debates no atual regimento);
  • Aumenta-se de uma para duas semanas o período em que os trabalhos parlamentares podem ser reorganizados para que os deputados realizem trabalho político junto dos eleitores, “nomeadamente aquando da realização de processos eleitorais, para divulgação e discussão pública de assuntos de especial relevância”;
  • Nas audições parlamentares de ministros, define-se que estas se iniciam “com uma intervenção do ministro, por um período não superior a 15 minutos” e definem-se os termos do debate, mas não os tempos de cada força política, ao contrário do que pretendia o PSD, remetendo-se novamente para a conferência de líderes;
  • Todas as reuniões das comissões são gravadas, sem prejuízo do seu caráter reservado quando a lei, o regimento ou regulamento da comissão o determinarem;
  • As reuniões plenárias e das comissões parlamentares são públicas e, por regra, transmitidas pelo Canal Parlamento, bem como disponibilizadas no portal da Assembleia da República na Internet;
  • As comissões parlamentares passam a poder funcionar com um quinto do número de deputados em efetividade de funções, mantendo-se a regra de que deliberações são tomadas com a presença de mais de metade dos seus membros em efetividade de funções, mas desde que estejam presentes, “pelo menos, deputados de três grupos parlamentares, dos quais um seja de partido que integre o Governo e um de um partido da oposição”;
  • Sobre a presença dos deputados únicos na conferência de líderes, mantém-se a prática (ainda sem previsão regimental) de que o Presidente da Assembleia da República os ouve “quando o entenda útil, nomeadamente em matéria de agendamentos ou em função de requerimento por estes apresentado, podendo para o efeito convocá-los a estarem presentes nas reuniões”;
  • Já os deputados não inscritos podem “dirigir requerimentos ao Presidente da Assembleia com pedidos relativos à fixação da ordem do dia” e são imediatamente informados da fixação da ordem do dia realizada no decurso da reunião da conferência de líderes;
  • Na fixação da ordem do dia, o futuro regimento determina o presidente da Assembleia “respeita a representatividade das forças políticas”, quando até aqui primeiro respeitava-se a ordem temporal de entrada das iniciativas e só depois “a representatividade dos grupos parlamentares e o princípio da alternância”;
  • Acrescenta-se no regimento que os trabalhos parlamentares devem ter em atenção a “compatibilização com a vida pessoal e familiar dos deputados, funcionários e entidades chamadas a participar nos trabalhos da Assembleia da República";
  • Apertam-se as regras para os agendamentos por ‘arrastamento’ (quando um partido agenda uma iniciativa e outros levam depois a debate iniciativas sobre a mesma temática): por exemplo, nos casos de agendamentos comuns, só é admitido o agendamento por arrastamento de projetos e propostas de lei que venham a dar entrada até ao final da semana da conferência de líderes em que a iniciativa original foi agendada;
  • Apertam-se também as regras para os projetos de resolução (recomendações ao Governo): quando há várias iniciativas sobre a mesma matéria, o seu debate é feito apenas em comissão. Todos os que não tenham natureza normativa e não estejam expressamente previstos na Constituição e na lei, designadamente as recomendações ao Governo, revestem a forma de deliberação e são publicados, uma vez aprovados, no Diário da Assembleia da República;
  • Sobre os grupos parlamentares de amizade, remete-se para resolução da Assembleia da República “os critérios da sua constituição, a organização, funcionamento e apoio, bem como o programa, o orçamento e o relatório de atividades”, ficando pelo caminho uma proposta do PAN que defendia que não podem existir grupos parlamentares de amizade “relativos a países com os quais Portugal não mantenha relações diplomáticas ou que não tenham parlamentos plurais livremente eleitos”.