O impacto da construção do Túnel do Bolhão começou a sentir-se a 13 de agosto, ainda que as obras tivessem arrancado efetivamente dias de depois, a 20. Com a introdução das alterações ao trânsito, acumulam-se os prejuízos que desde que, em maio, arrancaram as obras de reabilitação do mercado, somam já milhares de euros.

Segundo o anunciado no lançamento da empreitada, em 2018, os trabalhos tem a duração de cerca de um ano, com um custo de 3,5 milhões de euros. Sérgio Silva, proprietário de um café na rua Alexandre Braga, uma das artérias afetadas pelas obras, assegura que, se não for ajudado pela câmara, no próximo mês fecha a porta.

Naquela rua, outros dois estabelecimentos foram forçados a encerrar portas. O café de Sérgio fica no meio dos dois. À hora do almoço, o café que há três anos, quando abriu portas, estava cheio, não tinha mais do que três clientes.

"Eu perdi 80% dos clientes. Já não consigo aguentar. Desde fevereiro até hoje já perdi 40 mil euros. Ando a tapar buracos para conseguir sobreviver e minha mulher está em Inglaterra com o meu filho, para me ajudar a pagar as contas", explicou.

À Lusa, Sérgio diz que, em desespero, voltou a contactar a autarquia, solicitando uma audiência para expor o seu caso. O proprietário lamenta que o município não tenha previsto um fundo de apoio aos comerciantes e que a esta altura ainda esteja a “estudar o assunto".

Mais à frente, o proprietário de uma loja de componentes para eletrodomésticos fala em perdas de 30%. Tal como Sérgio, António Santos garante que se as indemnizações não chegarem rapidamente, outros encerramentos se seguirão e lamenta que, ao contrário do que aconteceu com as obras do Metro, esta situação não tenha sido acautelada.

Na rua ao lado, a Formosa, Alberto Rodrigues, proprietário de uma das lojas mais antigas do Porto, a Mercearia do Bolhão, diz que o negócio "está pior do que péssimo". Arrisca até a dizer que "ninguém faz 50% das receitas habituais" e que "só quem pode dar um murro no mealheiro" vai conseguir sobreviver. Em muitos casos, o negócio não dá para os custos e o melhor, admite, "era fechar".

"Ando doido a contar os dias que faltam para abrir a rua. A câmara disse seis meses para abrir o acesso pedonal. Mas já se começa a desenhar o que vai acontecer e a câmara já nos devia ter sossegado um bocadinho", afirmou.

Aos 74 anos, Alberto, que também é proprietário da tabacaria ao lado, reconhece que é com "muito sacrifício" que após 38 anos continua na baixa da cidade. Para ele, o município devia ter acautelado os interesses dos comerciantes, seja através de corredores provisórios para aceder às lojas, seja através de indemnizações.

Fernando Barandas, partilha da mesma visão. As perdas rondam os 50% e com a chegada do inverno, “e o turismo desaparecer”, a situação será ainda mais "complicada", não tem dúvidas.

Fernando que gere uma mercearia ‘gourmet’ localizada no Porto desde 1916, salienta que "há uma ausência total" do município que, por exemplo, refere que "avisou que ia fechar a rua e fechou", isto pouco dias antes do início das obras.

O proprietário tem ainda dificuldade de acreditar que o prazo para a conclusão das obras seja cumprido, o que pode ter efeitos semelhantes aos que se verificaram durante o processo "Porto 2001".

“Quando o próprio presidente da Câmara diz, numa entrevista, que sabe quando começa a obra, mas não se compromete quando ela acaba, isto abre um precedente para que os prazos não sejam cumpridos. (…) Em 2001, 65% dos comerciantes já não receberam indemnizações porque já tinham falido", lembrou.

A construção do chamado Túnel do Bolhão, no centro do Porto começou no dia 20 e vai permitir fazer a ligação entre as ruas do Ateneu Comercial do Porto e Alexandre Braga, passando sob a Rua Formosa.

Numa nota divulgada à data, a autarquia sublinhava que esta infraestrutura é "essencial para o funcionamento do mercado e também para a proteção da mobilidade na sua envolvente, já que absorverá o trânsito de veículos para abastecimento dos comerciantes".

A obra decorre em paralelo com empreitada de requalificação do mercado, que está em curso desde maio.

A empreitada foi consignada no dia 15 de maio deste ano tinha um prazo previsto de conclusão de dois anos.

A Lusa pediu esclarecimentos à autarquia, mas até ao momento sem sucesso.

*Por Vânia Moura, da agência Lusa