Carlos Santos Silva, amigo de longa data do antigo primeiro-ministro e seu “testa-de-ferro”, segundo a tese do Ministério Público (MP), alega que a prova obtida na averiguação preventiva no âmbito de processos administrativos é nula por intromissão na sua vida privada, falta de controlo do MP e pela não exportação de toda a prova para a fase de inquérito.
“O arguido descobriu pela consulta dos autos ter sido investigado durante mais de uma década em processos administrativos que devassaram por completo a sua vida pessoal, societária e financeira, fazendo tábua rasa das exigências legais prescritas no Código de Processo Penal para a derrogação do sigilo fiscal e bancário”, lê-se no extenso Requerimento de Abertura de Instrução (RAI).
A defesa de Carlos Santos Silva alega que a acusação do Ministério Público se muniu de prova ferida de nulidade ou mesmo proibida para acusar o empresário, de 58 anos.
“O facto do MP não ter posto fim às averiguações prévias logo que surgiu a primeira suspeita de crime público, abrindo de imediato o respetivo inquérito, determina não só as nulidades, mas também a perda do valor probatório carreado para o ´Processo Marquês´”, considera a defesa.
A estratégia da defesa passa por alegar que a quebra do sigilo bancário, as escutas (migradas do “Processo Monte-Branco” e autorizadas no “Processo Marquês”), a localização celular, o varrimento eletrónico e a recolha de imagem são ilegais.
Após o pedido de instrução de Carlos Santos Silva, o juiz Ivo Rosa decidiu solicitar ao processo Monte Branco a junção aos autos de todas as informações dos órgãos de polícia criminal, as promoções do MP e todas as autorizações judiciais relativas a interceções telefónicas que diretamente se refiram ao empresário, o interrogatório dos inspetores tributários Luís Flora e Paulo Silva e o relatório da inspeção aos serviços do Departamento Central de Investigação e Ação penal (DCIAP), realizado entre setembro de 2013 e março de 2014.
Na quarta-feira Carlos Santos Silva começa a sua defesa contra a acusação de corrupção passiva e ativa, branqueamento de capitais (17 crimes), falsificação de documentos (10), fraude fiscal e fraude fiscal qualificada (3).
Carlos Santos silva tinha uma empresa de projetos e "prestava serviços e vendia serviços, vendia conhecimentos" ao grupo de construção civil Lena, nas palavras do antigo administrador do grupo, Carlos Barroca.
Para o Ministério Público, o Grupo Lena obteve benefícios comerciais graças à atuação de José Sócrates enquanto primeiro-ministro e Carlos Santos Silva "interveio como intermediário de José Sócrates em todos os contactos com o referido grupo".
O empresário disponibilizou "sociedades por si detidas" para receber quantias destinadas a Sócrates. A justificação pela mudança de mãos do dinheiro passava pela "prestação de serviços".
Durante o seu interrogatório na fase de instrução, em outubro, o ex-primeiro-ministro tentou desmontar a tese do MP que sustenta que o dinheiro que foi entregue a Sócrates por Carlos Santos Silva era do ex-secretário-geral do PS e que resultou de atos de corrupção cometidos enquanto primeiro-ministro.
Sócrates disse ao juiz que Carlos Santos Silva era “honestíssimo” e que o amigo lhe emprestou dinheiro e que já lhe devolveu 250 mil euros.
A Operação Marquês teve início a 19 de julho de 2013 e culminou na acusação a 28 arguidos - 19 pessoas e nove empresas - pela prática de quase duas centenas de ilícitos económico-financeiros.
A acusação sustenta que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e na PT, garantir a concessão de financiamento da Caixa Geral de Depósitos ao empreendimento Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.
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