“A forma como está a ser gerido o inquérito da IGAS [Inspeção-Geral das Atividades em Saúde] reforça a censura formal da OM pelo modo como o Ministério da Saúde sempre lidou com o caso do Lar de Reguengos de Monsaraz, preferindo o branqueamento da atuação da Administração Regional de Saúde do Alentejo, da Autoridade de Saúde Regional e Local e das entidades municipais à assunção de responsabilidades pela inexistência de condições no Lar e pelo incumprimento das orientações básicas da DGS”, escreveu a ordem, em comunicado.
Na nota enviada às redações, a Ordem dos Médicos lamentou ter tomado conhecimento do relatório da IGAS pela comunicação social e considerou que o documento, “de forma inexata e imprecisa”, lhe aponta baterias “através da divulgação de informação inserida em contexto não devidamente circunstanciado”.
Para a OM, esta atuação deixa claro que “o Ministério da Saúde prefere antes de notificar o relatório à Ordem, que é um claro destinatário das conclusões da IGAS, gerar por uma nota à comunicação social o ruído político que permita criar um ambiente de confrontação”.
As conclusões da IGAS, divulgadas pelo Ministério da Saúde na segunda-feira ao final do dia, admitem “responsabilidade deontológica” dos médicos, uma matéria da competência da Ordem dos Médicos.
No comunicado, a OM reiterou que “nenhum médico de família se escusou a prestar apoio aos utentes do Lar de Reguengos de Monsaraz”, mesmo que prejudicando os doentes que têm nas suas listas, numa situação que – sublinhou – é “muito diferente do que configura uma situação de apoio domiciliário pontual”.
“Apesar do inquérito visar, em princípio, os factos relativos à intervenção das entidades do Ministério da Saúde, a OM verifica que o gabinete da ministra da Saúde preferiu centrar as suas afirmações e acusações em estruturas externas, nomeadamente na Ordem dos Médicos”, lamentou.
“Nada mudou deste a altura do surto, quando o Ministério da Saúde e todas as instituições por ele tuteladas se preocuparam mais em questionar a competência da Ordem dos Médicos para a auditoria clínica do que em identificar e corrigir as falhas na resposta ao surto e, dessa forma, evitar a repetição do problema noutros lares”, acrescentou.
A Ordem dos Médicos lembrou que a auditoria que fez comprovou a “falta de recursos humanos no lar para administrar os cuidados necessários, falta de condições para delimitar a transmissão do vírus, falta de rastreio atempado, falta de intervenção decisiva da autoridade de saúde pública, falta de coordenação e gestão das autoridades competentes por forma a proteger doentes e profissionais de saúde”.
Apontou ainda o “atraso na transferência de infetados para um ‘alojamento sanitário’ onde faltava liderança clínica e onde os cuidados potencialmente exigíveis pela condição dos doentes eram desadequados” e recordou que enviou as conclusões da sua auditoria para várias entidades, muito em particular para o Ministério Público, reiterando a confiança nas instituições competentes e independentes para apurar as responsabilidades de um surto que vitimou 18 pessoas.
“A Ordem e os membros dos seus órgãos têm consciência de que a sua atuação não só foi útil no caso concreto, porque obrigou a uma correção significativa de procedimentos em Reguengos de Monsaraz, como teve repercussões positivas, a partir dessa data, em todo o país”, acrescentou.
Na nota, a OM lembrou ainda que continuará a contribuir para a defesa da saúde dos cidadãos e dos direitos dos doentes e a resistir “a todas as manobras inqualificáveis e aos ataques políticos que visem desviar as atenções do que realmente aconteceu em Reguengos de Monsaraz”: “uma violação grave de direitos humanos constitucionalmente consagrados”, como concluiu a Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, no relatório de 15 de outubro de 2020.
O surto em Reguengos de Monsaraz foi detetado em 18 de junho de 2020 e provocou 18 mortes (16 utentes e uma funcionária do lar e um homem da comunidade).
No total, foram infetadas pelo novo coronavírus 162 pessoas. A maior parte dos casos de infeção aconteceram no lar da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva, envolvendo 80 utentes e 26 profissionais, mas também 56 pessoas da comunidade foram atingidas.
Comentários