“Não estamos em bons tempos para a liberdade, de modo nenhum”, disse José Pacheco Pereira em Óbidos, numa mesa de debate do Folio – Festival Internacional de Literatura, onde foi convidado a debater “a palavra” com a escritora Nadine Stronssen. A conversa acabaria por incidir sobre a temática da censura.

Reportando-se aos 48 anos de ditadura marcados pela censura que pretendia não apenas o controlo político mas, também, “da forma como se deveria viver”, o comentador fez questão de distinguir esta “censura original que podia mandar pessoas para a cadeia” da que se vive hoje e que “não é a mesma coisa”.

A censura de hoje, explicou, “é uma tendência nos Estados Unidos, na Europa e em Portugal”, marcada por uma ditadura da palavra, que distingue entre as palavras que a autocensura e a censura social determinam se podem ou não ser ditas.

Ainda que haja “um fenómeno de radicalização da vida política que se traduz em mecanismos censórios”, Pacheco Pereira não tem dúvidas de que “a censura é a instituição mais eficaz da nossa democracia”.

Convicto de que a Internet não será capaz de se moderar a si própria, Pacheco Pereira defende a punição “de abusos, difamações e calúnias, desde que sejam crime”, mas nunca a proibição de publicação nas redes sociais de ideias, mesmo que “possam ser absurdas”.

“Há uma tendência de incremento da censura que vem de pressões sociais”, acrescentou para defender que há também “cobardia em relação a essa censura”, numa sociedade em que muitas pessoas têm medo de ser ostracizadas pelas suas opiniões.

O orador, que garantiu nunca “prescindir da liberdade de dizer palavras incómodas”, deixou claro que com ele “a ditadura da palavra não pega” e que “gostaria até de discutir com o André Ventura” temas como a castração química, por exemplo.

Considerando as redes sociais “excelentes para as frases assassinas”, Pacheco Pereira lamentou que a escola esteja “desajustada da realidade” e que o ensino não prepare os alunos para combater a desinformação.

Se fosse por si, vincou, “proibia os Governos de gastar um tostão em comunicação ou de usar o Twitter para não estarem sempre a ter de pedir desculpas”.

Mas, sublinhou “só porque são Governo”, não se aplicando essa mesma proibição ao cidadão comum.

Pacheco Pereira foi o último orador do Folio — Festival Internacional de Óbidos, que hoje terminou, depois de uma edição que o curador José Pinho considerou “a consagração” do evento que contou com cerca de 60 mil visitantes.

O festival vai voltar a realizar-se no próximo ano a 12 de outubro e terá como tema “O Risco”, anunciou hoje a organização.