“Estamos num ano de transição, porque é expectável que, a partir de 01 de janeiro de 2021, exista um novo modelo dos planos municipais, que deixarão de ser planos municipais e passarão a ser planos intermunicipais ao nível das CIM, havendo apenas um Plano Operacional Municipal (POM)”, afirmou o secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, João Catarino.

Em entrevista à agência Lusa, o governante disse que os planos intermunicipais estão previstos no novo Sistema Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), considerando que “os incêndios não têm uma delimitação municipal”.

“O que faz sentido é que o planeamento seja feito de forma intermunicipal e ao nível das CIM e, depois, obviamente vertendo nesse plano intermunicipal todos os contributos dos planos municipais”, indicou João Catarino, referindo-se aos POM, “que são planos muito mais simples” em comparação aos PMDFCI.

Neste âmbito, o Governo prevê implementar, “até ao final deste ano”, o novo modelo de planos de defesa da floresta contra incêndios, com o planeamento ao nível intermunicipal, conforme previsto no SGIFR.

“Estando numa fase de transição, teremos de encontrar uma solução, obviamente, também para fazer esta transição sem grandes complicações por parte dos municípios, mas que responda tecnicamente àquilo que precisamos no âmbito da defesa da floresta contra incêndios”, declarou o governante que tutela a pasta das Florestas desde outubro de 2019, depois de transitar do cargo de secretário de Estado da Valorização do Interior, que ocupava desde outubro de 2018.

Relativamente aos PMDFCI, previstos desde 2006 no âmbito do SGIFR, que se aplica a todo o território continental português, dos 278 municípios de Portugal continental, há três câmaras municipais que não têm e que nunca tiveram planos, designadamente Porto, Amadora (distrito de Lisboa) e São João da Madeira (Aveiro), “por razões óbvias: não têm floresta”.

“Todos os outros tiveram já planos municipais de primeira, de segunda e alguns de terceira geração. Ora, estes planos municipais como os Planos Diretores Municipais (PDM) têm uma obrigatoriedade de serem revistos. No caso dos planos municipais, têm a obrigatoriedade de serem revistos de 10 em 10 anos, mas ao décimo ano, no dia a seguir ao décimo ano, não há um vazio legal”, ressalvou João Catarino, lembrando que, na falta de atualização do plano, se aplicam as normas do que já estava em vigor.

De acordo com dados do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), entidade que dá parecer vinculativo aos PMDFCI, além dos três municípios que nunca tiveram planos municipais, registam-se 107 câmaras municipais com planos desatualizados.

Assim, são 173 os municípios com planos atualizados em vigor, inclusive 63 com planos de terceira geração, com quatro a vigorarem até 2030, nomeadamente Vizela (distrito de Braga), Proença-a-Nova (Castelo Branco), Penela (Coimbra) e Mêda (Guarda), segundo informação disponibilizada ‘online’ pelo ICNF.

Para João Catarino, que foi presidente da Câmara Municipal de Proença-a-Nova entre 2005 e 2016, a existência de municípios que não conseguiram rever o PMDFC dentro do prazo legal dos 10 anos pode estar relacionada com o início tardio do processo de atualização do plano e com a auscultação de dezenas de entidades, em que algumas têm de dar parecer.

“O ICNF, normalmente, era das entidades que mais se atrasavam a dar parecer, também porque é um parecer vinculativo e é, provavelmente, o mais importante na revisão destes planos, mas haverá com certeza culpas de parte a parte”, apontou.

Apesar de se prever a transição dos planos para o nível intermunicipal, o secretário de Estado adiantou que o Governo está a trabalhar, de forma muito próxima com as câmaras municipais, para que os PMDFCI “rapidamente estejam todos revistos e aprovados”.

Governo quer reforçar presença do ICNF, que "estava reduzido” às capitais de distrito

O Governo quer reforçar a presença no território do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), por reconhecer que este organismo do Estado “estava reduzido” às capitais de distrito, anunciando a autorização para contratar 100 técnicos superiores.

“Estamos a dotar o ICNF, estamos a levar o ICNF, que estava reduzido à Avenida da República [sede em Lisboa] e às capitais de distrito, outra vez para o território. Obviamente que esse processo leva tempo. Só com o ICNF e com a Autoridade Florestal Nacional a sério no território é que conseguiremos fazer essa transformação que precisamos de fazer e gerir muito melhor o que é público e as matas nacionais”, afirmou o secretário de Estado.

João Catarino revelou que, “dos 100 técnicos superiores que o ICNF está autorizado a contratar ainda este ano, para Lisboa virão dois ou três - eles irão todos para o interior, onde está a floresta, é onde têm de estar os técnicos do ICNF”.

É com uma política territorializada, considerou, que se consegue fazer a diferença.

Para gestão do espaço público florestal português, o ICNF dispõe de “mais de 50 milhões de euros de concursos públicos internacionais que estão lançados”, dos quais 20 milhões de euros para áreas protegidas e 30 milhões de euros para perímetros florestais e matas nacionais, num investimento integrado num programa desenhado em 2018 para implementar entre 2019 e 2022.

"Na área da gestão dos matos e na implementação das faixas de interrupção de combustível, o ICNF está a fazer um trabalho extraordinário pelo país todo, depois dos incêndios de 2017. Foi a partir daí que todos tomámos consciência e acordámos para o problema que tínhamos, sério, em termos florestais", declarou o secretário de Estado das Florestas, enaltecendo o “forte investimento" que está em curso e que "prova que se está, efetivamente, a agir e a agir no sítio certo".

João Catarino recordou o período de "20 anos sem investir na floresta pública portuguesa, obviamente com culpas de todas as partes", para explicar que o investimento é gradual, a desenvolver nos próximos 10, 15 ou 20 anos, inclusive devido aos incêndios.

"Se o Estado está a fazer tudo quanto gostaríamos, é óbvio que há sempre limitações, mas devo dizer que o ICNF é hoje o braço armado da intervenção do Estado na componente das áreas públicas, é o responsável pela gestão do espaço público florestal português", declarou.

Sobre as alterações após os grandes incêndios de 2017, o responsável pela pasta das Florestas defendeu que "basta olhar para os investimentos e para os milhões que hoje, primeiro os proprietários florestais, depois as câmaras municipais e o próprio Governo, por via do ICNF", estão a realizar na gestão de combustíveis, com a limpeza dos terrenos florestais à volta dos aglomerados populacionais e das redes viárias.

"As faixas de interrupção de combustível são investimentos fortes, ou seja, tomámos todos consciência de que precisávamos, efetivamente, de iniciar um processo de gestão de combustíveis", frisou.

Reforçando que o investimento não se concretiza ao ritmo desejável, o governante referiu haver muitas intervenções que são hoje feitas no contexto florestal "difíceis de explicar a um leigo", dando como exemplo o trabalho no Pinhal de Leiria, que ardeu em 2017: dispõe-se de um investimento de 1,8 milhões de euros, mas está-se à espera para saber se há regeneração natural de pinheiro bravo.

"Se não houver, então faremos a plantação de novas árvores. Se existir regeneração natural suficiente, é a técnica mais ajustada, aquela semente está ajustada ao território, está lá há 80 ou há 100 anos. Não fazemos melhor a plantar um pinheiro que venha de outra parte qualquer", sustentou, ressalvando que há outras áreas do país em que o ICNF está já a plantar.

Além das ações de arborização e rearborização, o secretário de Estado referiu a retirada de material lenhoso com valor comercial no Pinhal de Leiria, em que "foi politicamente entendido que devia haver um 'delay' de tempo", para dar prioridade aos produtores florestais de Pedrógão Grande, nomeadamente no processo de corte, de extração e de rechega.

Nas matas nacionais, estão a ser preparados vários projetos e candidaturas aos fundos do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR), para fazer plantações nos perímetros florestais e nas áreas sob o regime florestal parcial ou total.

“É evidente que falta fazer muito, mas o trabalho está calendarizado e está a acontecer", assegurou.

O ICNF, acrescentou, teve um reforço de nove milhões de euros para aquisição de máquinas pesadas, que estão hoje a trabalhar pelo país todo, nomeadamente no Sistema Nacional de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR), ao serviço da Proteção Civil.

Neste âmbito, o secretário de Estado das Florestas destacou a importância que estes investimentos têm para os territórios do interior do país: o ICNF, apontou, “é provavelmente, hoje, a entidade, o braço armado do Estado a criar emprego no interior", inclusive com a contratação de 50 agentes florestais para o Parque da Peneda-Gerês e com o reforço de mais de 800 novos sapadores florestais nos últimos dois anos.