Fundado em 1827, o Standard em 2009 passou por uma radical mudança de modelo de negócio, tornando-se gratuito, o que duplicou a tiragem. Mas manteve a sua orientação política, considerada de centro-direita no espetro britânico. O principal acionista é Evgeny Lebedev, russo naturalizado inglês, dono do “Independent” e de um canal local por cabo. (É interessante que Evgeny chegou à Grã-Bretanha com oito anos, quando o seu pai foi nomeado para o KGB em Londres, sob a cobertura de Adido Económico.)
Para entender a perplexidade da situação, basta imaginar um equivalente em Portugal; se, por exemplo, um deputado do PS fosse escolhido para diretor do Público.
A nomeação de Osborne, que está a causar intensas discussões no Reino Unido, e não apenas entre jornalistas e políticos, faz franzir muitos sobrolhos. Nos Comuns, esta escolha tem provocado críticas abertas dos deputados da oposição.
Há a vertente política: o deputado, eleito pelo círculo eleitoral de Tatton em 2001 é uma figura ativa do Partido Conservador – foi Chancellor of the Exchequer (Ministro das Finanças) do Governo Cameron até à queda deste, no ano passado. Por um lado, é uma figura notória do partido no poder; por outro, pertence ao grupo oposto ao da atual Primeira-ministra, que o exonerou assim que tomou posse.
Vários fazedores de opinião, políticos e figuras públicas exigem que Osborne abandone o Parlamento, pois consideram que há um conflito de interesse notório entre a sua posição como deputado e a orientação que dará a um jornal muito lido e com bastante prestígio no mundo dos tabloides britânicos.
As leis inglesas não impedem que um deputado tenha outras ocupações, desde que o declare expressamente aos serviços parlamentares. Osborne tem trabalhado como consultor económico para várias empresas, e os seus contactos amigáveis com interesses chineses – todos declarados – levantaram críticas dentro do partido e estariam na origem dos seus diferendos com Theresa May.
Depois há a vertente da falta de tempo para exercer dedicadamente as duas funções: tanto as obrigações de deputado como o trabalho de editor do jornal são ocupações a tempo inteiro, que exigem muito empenho e tempo.
Ao escolher Osborne, Lebedev afirmou: “Estou orgulhoso por ter um editor com tanta substância”, o que levou Marina Hide, do “The Guardian”, uma das jornalistas chocadas com o conflito de interesses, a perguntar acidamente: “ Que substância? Anfetaminas?” Parece fisicamente impossível ocupar os dois postos, ao que acresce os incontáveis trabalhos de consultoria a que o irlandês se dedica.
A deputada conservadora escocesa Ruth Davison disse que a sua experiência de dez anos como jornalista e seis como política a levam a considerar a acumulação impossível.
Finalmente, há quem considere uma grande injustiça social que um deputado possa ganhar tanto dinheiro, ao acumular as suas funções legislativas com tantos interesses privados. Esta última consideração vem da esquerda, que contesta que alguém possa somar um rendimento mensal “maior do que a média ganha por ano”, como se afirma numa petição pública para que abandone o Parlamento e que em poucos dias soma mais de 145 mil assinaturas.
Também a comissão do Legislativo que verifica potenciais conflitos de interesse, o “Advisory Committee on Business Appointments (Acoba), lamentou que Osborne aceitasse a posição no Standard quatro dias depois de os informar, sem esperar pelo parecer. O Acoba já tinha criticado quando o deputado aceitou um trabalho a tempo parcial, por 650 mil libras anuais, para a empresa de investimentos Black Rock.
Contudo, alguns deputados conservadores declararam o seu apoio a Osborne. O ex-Primeiro-ministro adjunto, Michael Heseltine, disse que “George foi um Ministro das Finanças brilhante e não perderá a oportunidade de esclarecer os seus pontos de vista sobre as questões políticas”. Também o ex-Ministro dos Negócios Estrangeiros, Malcolm Rifkind, considerou que, embora o noticiário envolva inevitavelmente os seus colegas parlamentares, dantes era normal que advogados ativos fossem igualmente membros dos Comuns.
E até mesmo o trabalhista Tony Blair, que tal como Osborne é contra o Brexit, disse que Osborne é altamente competente e “fará com que a política seja mais interessante.”
O mais provável é que nada aconteça, dizem os analistas mais céticos e conhecedores do cenário político/económico da Grã-Bretanha. Até na mais antiga democracia do mundo os conflitos de interesse estão longe de ter uma solução que agrade a gregos e troianos.
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