Em conferência de imprensa, o presidente da Câmara do Porto, o independente Rui Moreira, referiu que a data da trasladação do coração deverá ainda ser acertada com o governo brasileiro.

Além disso, o autarca salientou que a avaliação científica ao coração pedida ao Instituto de Medicina Legal do Porto, com o intuito de aferir o seu estado e se pode efetivamente ser trasladado para o Brasil em setembro, ainda não está concluída havendo, contudo, já a indicação de que pode "fazer a viagem".

A decisão foi tomada depois da autarquia ter pedido ao Instituto de Medicina Legal do Porto para fazer uma avaliação científica ao coração a fim de compreender se pode ser transladado para o Brasil em setembro e surge depois do embaixador brasileiro George Prata ter confirmado que o governo brasileiro já tinha feito um pedido oficial para a trasladação do coração do monarca.

“Temos ainda uma expectativa de que o coração possa vir. Seria bom para a comemoração conjunta do Brasil e Portugal do bicentenário”, porque D. Pedro foi “uma personalidade importante para os dois lados”, frisou o embaixador.

O estudo ao coração de D. Pedro IV realizou-se ao longo do último mês e envolveu ainda um conjunto de investigadores da Universidade do Porto, nomeadamente da Faculdade de Medicina da U.Porto (FMUP) e do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS).

Segundo Rui Moreira, a peritagem da relíquia com 187 anos “foi feita a 31 de maio, durante mais de cinco horas, por cinco peritos das áreas da Anatomia, Medicina Legal, Genética e da Biologia Forense”, reunindo ainda “especialistas, docentes e investigadores de duas escolas de medicina do Porto, a Faculdade de Medicina do Porto e o Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar”.

“O relatório da perícia anda não está totalmente concluído, mas já nos foi assegurado que o coração de D. Pedro IV poderá ser trasladado temporariamente para o Brasil, mediante a exigência de um transporte em ambiente pressurizado”, revelou o autarca do Porto que compareceu com a caixa onde está a chave que abre o cofre onde está o coração do antigo rei.

E prosseguiu: “Desta forma, é com enorme honra que anuncio que autorizo que o coração de D. Pedro IV de Portugal e primeiro Imperador do Brasil seja trasladado para o Brasil em datas a acertar entre o meu gabinete e o palácio de Itamaraty [Ministério das Relações Exteriores do Brasil], sendo que esta autorização e por minha decisão será ainda validada pelo executivo municipal”.

“Serei eu mesmo a garantir e a acompanhar o transporte deste importante tesouro da cidade, bem como irei assegurar que o vaso onde se encontra o coração do Imperador do Brasil seja devidamente selado, bem como um conjunto de garantias legais que terão de ser apresentadas ao Ministério dos Negócios Estrangeiros de Portugal, pois será exigido um compromisso entre os dois países irmãos”, acrescentou Rui Moreira.

O autarca assinalou ainda, sobre as exigências, que já lhe “foram garantidas por representantes do Estado brasileiro” e que a transladação “ficará a cargo da Força Aérea Brasileira”.

Rui Moreira informou também que o Porto também se vai associar às celebrações dos 200 anos da independência do Brasil, “organizando uma exposição sobre a presença de D. Pedro nesta cidade, intitulada “Pedro, a independência do Brasil e o Porto”, comissariada pelas professoras Conceição Meireles Pereira e Amélia Polónia”, e que também irão organizar “um concerto, em setembro, no renovado órgão da Igreja da Lapa e ainda um conjunto de publicações, conferências e visitas onde D. Pedro, o Porto e o Brasil serão sempre o mote”.

O acerto das datas da viagem, assegurou, “depende do que for acertado entre o Estado português e brasileiro, mas é provável que seja no início de setembro, porque haverá uma comemoração em Brasília a 08 de setembro, onde estará o Presidente da República de Portugal”.

Vincando que o “coração voltara ao Porto”, pois “a cedência é temporária”, Rui Moreira, sobre o facto de a sua decisão poder gerar polémica nos órgãos municipais, respondeu que “a cidade entenderá que esta é a melhor fora do Porto se associar à independência do Brasil”.

“Não deverá ficar mais de um ano, prevejo que fique menos, mas não é competência da Câmara do Porto”, disse o autarca sobre o tempo que o coração permanecerá no Brasil, num processo em que, revelou, “não haverá custos para a cidade”.

O rei D. Pedro I do Brasil e D. Pedro IV para Portugal foi o monarca que conduziu o Brasil, antiga colónia portuguesa, à independência e cujo corpo se encontra na cidade brasileira de São Paulo.

Segundo George Prata, que falou à Lusa, por telefone, a partir do Brasil, “todos [as autoridades portuguesas] tem manifestado muito boa vontade e estão prontos a examinar com muita atenção o pedido brasileiro”.

Mas, “a Irmandade [de Nossa Senhora da Lapa, no Porto, guardiã do coração] pediu uma avaliação técnica à Faculdade de Medicina do Porto para saber das verdadeiras condições do coração e se ele pode ser efetivamente trasladado temporariamente para o Brasil” sem sofrer danos, adiantou.

A preocupação tem a ver com o estado de conservação do coração do rei. “Por isso, a irmandade pediu esse lado técnico. Agora, tem de se esperar o resultado desse lado técnico, para se saber se é possível o coração vir para o Brasil”, explicou.

O embaixador, aquando da sua visita a Portugal, em fevereiro último, fez os contactos nesse sentido com a Câmara Municipal do Porto e com a Irmandade de Nossa Senhora da Lapa, guardiões do coração de D. Pedro, que se encontra na Igreja da Lapa, naquela cidade.

“O contacto foi feito por mim. Quando eu estive em Portugal, estive no Porto, visitei a Câmara Municipal e tive também uma reunião com representantes da irmandade de Nossa Senhora da Lapa”, adiantou.

Se a trasladação for possível, George Prata referiu que a ideia é que, “em primeiro, o coração vá para Brasília”, capital do país.

O coração que D. Pedro IV doou ao Porto não está guardado a sete chaves, mas são precisas cinco, mais mil cuidados e uma complexa operação para o retirar do mausoléu da igreja da Lapa, como aconteceu em 2009.

A descrição foi feita em 2013 à Lusa por Ribeiro da Silva, historiador e mesário da Ordem da Lapa, alertando para a fragilidade do coração do “Rei Soldado”, que morreu em Queluz em setembro de 1834 e chegou ao Porto em fevereiro de 1835.

"Não podemos vê-lo porque o coração é órgão frágil e este tem muitos anos. Receamos que possa estar em estado precário. As operações são muito complexas, tudo isso agita muito e temos receio de um mau resultado. Tentamos que se abra o menos possível”, observou o professor, em entrevista à Lusa.