“Em relação à questão do reconhecimento do Estado palestiniano, a posição de Portugal segue a linha da UE e neste momento a UE ainda não reconheceu o Estado palestiniano, portanto não vejo qualquer mudança nisso”, afirmou o diplomata israelita durante uma conferência de imprensa em Lisboa de familiares de reféns com nacionalidade portuguesa em posse do movimento islamita palestiniano Hamas desde os ataques em 7 de outubro contra comunidades israelitas junto da Faixa de Gaza.

Na sexta-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros afirmou à Lusa que o reconhecimento do Estado da Palestina “é algo que deve acontecer”, mas em coordenação com “alguns parceiros próximos” e num “momento com consequência para a paz”.

“Nós olhamos para o reconhecimento não como algo que pode acontecer, mas como algo que deve acontecer, sendo ainda para já indeterminado o momento correto em que deve acontecer”, declarou João Gomes Cravinho, a propósito da posição do chefe do Governo espanhol e atual presidente do Conselho da União Europeia (UE), Pedro Sánchez, que admitiu a possibilidade de Espanha reconhecer o Estado palestiniano unilateralmente, à margem da UE e de outros Estados-membros do bloco comunitário.

Falando ao lado de familiares de reféns com nacionalidade portuguesa, Dor Shapiro recordou que esteve há cerca de duas semanas com o ministro dos Negócios Estrangeiros em Israel, que na altura falou com eles sobre o seu “compromisso de fazer tudo o que puder, como um dos líderes europeus, para pedir e agir pela sua libertação”.

Os familiares voltaram a encontrar-se com o governante português em Lisboa na terça-feira, que repetiu o seu compromisso: “Apreciamos muito isso, sentimo-nos muito encorajados pelas suas palavras e acreditamos que ele vai continuar a exercer pressão porque entende que é uma questão humanitária”, disse Dor Shapiro.

O facto de se tratar de cidadãos com passaporte português é, no entanto, irrelevante para o diplomata, que sublinhou que é cidadão e embaixador israelita e o objetivo é que todos sejam entregues pelo Hamas: “Não me interessa se são portugueses, se são chineses, ou russos. Quero que todas as 138 pessoas sejam libertadas”.

Dor Shapiro atribuiu ao Hamas a responsabilidade do fim da trégua, na passada sexta-feira, após uma semana de cessação das hostilidades que permitiu a troca de reféns do Hamas por prisioneiros palestinianos, criticando que o grupo palestiniano continue a manter crianças e mulheres em cativeiro e que separe famílias.

“Eles não cumpriram o acordo, então voltámos aos combates para fazer o máximo de pressão para que eles [Hamas] entendam que precisam libertar os reféns”, declarou, insistindo que esse é um dos três objetivos de Israel na guerra em curso na Faixa de Gaza, a par da eliminação do grupo palestiniano e da devolução da segurança ao seu país, de modo a que pessoas como Nira Sharaby, presente na conferência de imprensa, possam “continuar a viver nos seus ‘kibutz’ sabendo que não têm uma organização terrorista a 200 metros delas”.

Os familiares de Tsachi Idan, Idan Shtivi e Eli e Yossi Sharaby, sequestrados pelo Hamas, nos ataques realizados no sul de Israel em 7 de outubro – que massacraram, segundo as autoridades israelitas, 1.200 pessoas a que se somaram outras 240 levadas pelo grupo palestiniano para a Faixa de Gaza — estiveram nos últimos dias em Lisboa.

Trazendo fotos dos seus familiares e a mensagem “tragam-nos de volta”, partilharam o seu desespero, ao fim de quase dois meses, de pouco ou nada saberem dos seus familiares desde que foram raptados pelo Hamas e as circunstâncias em que se encontram.

“É obrigação de Israel e de Portugal libertá-lo porque ele é cidadão português (…). Devo ter um sinal, um sinal dele de que está bem e dar também um sinal de que estamos bem, de que estamos a fazer tudo por ele”, afirmou Dalit, a mãe de Idan Shtivi, que está entre os desaparecidos no festival Nova, no sul do país e onde o Hamas matou cerca de 260 pessoas.

Na véspera da conferência de imprensa, estes familiares de reféns reuniram-se na sinagoga de Lisboa para rezar pela sua libertação e o “fim do pesadelo”, reconstituído à Lusa os acontecimentos de 7 de outubro.

Emocionado, Omri Shviti recordou aquele dia, quando o irmão, Idan, 28 anos, “o melhor amigo que se pode ter”, foi ao festival de música. Segundo relatos, terá tido um acidente de automóvel a tentar fugir dos terroristas e terá morrido quatro dias depois num hospital em Gaza, em resultado dos ferimentos.

Mas Omri Svhiti não quer acreditar.

“Temos uma grande crença que ele está vivo e rezamos por isso todos os dias. Não queremos saber de política, nunca quisemos saber. Queremos é que ele volte para casa”, afirmou.

“É realmente uma realidade diferente porque não consigo entender como pode ser cruel neste mundo, no nosso século, nas nossa vidas, pegarem nas nossas pessoas mais queridas e colocá-las noutro lugar sem nada, sem sabermos qual é o seu estado condição e como são tratados”, desabafou hoje Nira Sharaby, mulher de Yossi Sharaby, outro dos reféns do Hamas juntamente com uma cunhada, deixando um expressivo apelo: “Peço a todos e ao mundo inteiro apenas para nos ajudar a trazê-los de volta para casa”.

Sobre o marido, Yossi (53 anos), Nira Sharaby não tem qualquer informação. Já sobre a cunhada, Eli (51 anos), recebeu indicações há quatro semanas de que estaria ainda viva, tendo a familiar sobrevivido ao esconder-se numa casa após ter sido confrontada pelos homens do Hamas, entre tiros, explosões e gritos em árabe.

Raz Matalon, cunhado de Eli e Yossi, gostaria de viver novamente com segurança, após o “muro” que protege Israel ter desabado, e que não se trate apenas de uma sensação, mas “um lugar onde as pessoas possam viver, esforçar-se e pensar no futuro”, não tendo de explicar aos seus filhos se o seu país ainda existirá daqui a 10 ou 20 anos.

“A dor é tão dura aqui nesta mesa que não podemos realmente explicar como é difícil dormir com ela e acordar de manhã”, afirmou Raz Matou, junto dos outros familiares de reféns.

As pessoas presentes hoje na conferência de imprensa preferiram evitar questões políticas, reservando-as para o embaixador israelita, tendo Hilla Maron, membro do Fórum de Famílias de Reféns e Pessoas Desaparecidas, constituído no dia seguinte ao ataque, salientando que o que está em causa são civis.

“O que aconteceu no dia 7 de outubro juntou pessoas de todos os ângulos políticos de Israel, do norte ao sul, e obrigou-nos a ser uma família, independentemente de quem somos e das nossas crenças”, comentou, frisando que os familiares não trazem um plano, apenas um apelo: “Pedimos, imploramos aos políticos, à Cruz Vermelha, em primeiro lugar, sinais de vida das pessoas que estão em Gaza. Tentem chegar a elas, enviem-lhe medicamentos, água e comida”.