“Temos um sistema barato com uma produtividade científica que pode, por isso mesmo, surpreender”, afirmou hoje Frederico Gama Carvalho, da Organização dos Trabalhadores Científicos, durante o colóquio “Políticas Científicas 2019” que está a decorrer na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa.

Baseando-se nos dados disponibilizados pelo Eurostat relativos a 2017, o especialista sublinhou que, em termos de percentagem de população ativa, Portugal tem muito mais investigadores do que Espanha e está um pouco acima da média da União Europeia. Comparando com Espanha, “o rácio é cerca de 50% superior”, sublinhou.

No entanto, o investimento fica muito abaixo. "A despesa ‘per capita’ de investigador ETI (equivalente a tempo integral) é quase três vezes inferior à media da União Europeia e cerca de 55% do correspondente valor para Espanha”, lamentou.

Através de um “cálculo simples”, o especialista concluiu que tendo em conta o número de investigadores em Portugal, a despesa em investigação e desenvolvimento (I&D) “deveria ser aumentada em dois mil milhões de euros para que o rácio igualasse o espanhol ou cerca de 4,6 mil milhões para atingir o valor médio da União Europeia”.

Outro dos pontos focados foi o gradual aumento da verba investida pelas empresas em I&D e o seu real significado. Dois dos oradores presentes questionaram se o trabalho feito por muitas das grandes empresas pode ser definido como investigação.

“Pode duvidar-se do rigor com que são aplicados os critérios que devem definir como atividade de I&D uma determinada atividade”, começou por afirmar Frederico Carvalho que, em declarações à Lusa, classificou como “uma burla” a investigação que as empresas dizem fazer, porque “ninguém verifica a sua veracidade".

Ana Delicado, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, lembrou que na Europa, mais de 60% do investimento em I&D é feito pelas empresas e em Portugal ronda os 50%.

No entanto, as “maiores produtoras de I&D” em Portugal são empresas da área financeira e informática, tais como a Meo Altice, Sonae, NOS, BCP e BPI e duas farmacêuticas, acrescentou a investigadora.

“A despesa em I&D está muito inflacionada, porque contam como I&D muitas coisas que são rotineiras. Fazer algoritmos para o BCP é I&D?”, questionou, considerando que esta “não é uma despesa que puxe Portugal para grandes inovações tecnológicas”.

Um dos resultados desta realidade poderá ser o baixo registo de patentes, lembrou Ana Delicado, salientando o elevado número de publicações em contraponto com “o registo de patentes, que não mexe”.

Para Ana Delicado, a explicação é simples: “Como as nossas empresas que fazem I&D não criam produto, as patentes têm-se mantido resilientemente baixas”.

Enquanto a média da UE é de mais de 100 patentes por milhão de habitantes, em Portugal o rácio está abaixo de 25.