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Prefácio
Nunca quis ser economista.
Na verdade, queria ser o oposto disso. A minha opinião sobre a disciplina foi moldada pelos economistas que vi na televisão e nos telejornais, e eles não me impressionavam.
Fui para filosofia da ciência, em parte, porque estava interessado na natureza da ciência e no método científico, na utilização adequada da ciência no processo político e na fronteira entre ciência e pseudociência. A economia pareceu-me intrigante, com o que vi como sendo o fosso entre a pretensão e a realidade.
Para ter a certeza de que sabia do que estava a falar, decidi fazer ao mesmo tempo um doutoramento em economia. A experiência foi reveladora. O material assemelhava-se pouco ao que eu esperava. A economia moderna é manifestamente inacessível. Senti um choque cultural não muito diferente do que tive quando estudei no estrangeiro, em Florença. A economia, como a Itália, tem as suas próprias normas, regras e práticas — incluindo uma linguagem própria, mas, assim que ultrapassei os meus preconceitos, descobri um mundo de ideias fascinantes e úteis. As pessoas que conheci não eram apenas amáveis e sedutoras, mas também genuinamente interessadas em tornar o mundo um lugar melhor.
No final, aprendi duas coisas. Primeiro, a perceção pública da economia está desalinhada. (Por falar nisso, culpo principalmente os próprios economistas por serem péssimos a descrever o que fazem.) Segundo, a economia oferece não só análises ponderadas sobre onde estamos e como chegámos aqui, mas também ferramentas reais que podem ajudar-nos a tornar o mundo um lugar melhor — um lugar mais adequado ao progresso humano.
O meu objetivo com este livro é discutir o que é a economia, mostrando o que ela faz. Não quero com isto dizer que a economia moderna é perfeita. Há muitas maneiras pelas quais a ortodoxia pode ser melhorada. Claro que não estou a defender a profissão de economista, cujo desempenho deixa muito a desejar.
Defendo a ideia de que a economia enquanto ciência pode ser aplicada para o bem da humanidade e do planeta. Descartar isso seria marcar um golo na própria baliza. Na medida em que a teoria, a prática e a profissão podem ser melhoradas, corrigi-las é um imperativo moral.
Não estou a tentar inspirar mais pessoas a serem economistas, embora ficasse encantado se o fizessem. Em vez disso, o que eu espero é: chegar às pessoas que não são economistas, mas que se preocupam com o futuro da humanidade e do planeta, que votam, que acreditam na mudança social e que podem utilizar métodos, ideias e teorias da economia para fazer do mundo um lugar melhor.
Deixe-me dizer-lhe como. A economia é demasiado importante para ser deixada apenas nas mãos dos economistas.
Introdução: como salvar o mundo
Quando a covid surgiu, no início de 2020, o acontecimento global mais aterrorizante e destrutivo de uma geração interrompeu a vida tal como a conhecíamos. Estávamos todos desesperados por respostas e soluções. Todos, dos líderes governamentais aos cidadãos comuns, procuravam pessoas que tivessem conhecimento para ajudar. Epidemiologistas, virologistas, físicos e até engenheiros foram chamados a explicar tudo — e a apressarem-se para resolver o problema.
Poucos pensaram em perguntar aos economistas. Deveriam tê-lo feito.
Os economistas estavam, de facto, aptos a ajudar. A economia ajuda-nos a entender muitos dos problemas que enfrentamos — a título individual e como sociedade. Melhor ainda: a economia oferece soluções. Isto dá-nos esperança de que é possível melhorar e está ao nosso alcance.
Os primeiros relatórios sugeriram que o vírus surgiu em «mercados de produtos frescos» em Wuhan, na China. São mercados onde as pessoas comercializam animais e produtos de origem animal para animais de estimação, alimentos, decoração e remédios tradicionais. Compreender como um novo coronavírus pode surgir exige que se entenda como os mercados de animais e partes de animais são organizados, porque existem e como funcionam. Qual a relação da vontade das pessoas de terem animais como animais de estimação, comida, decoração e remédios com as preferências pessoais e a cultura local. A razão pela qual as pessoas fornecem animais para venda tem que ver com a necessidade de ganhar a vida e com a disponibilidade de percursos de carreira alternativos.
Isto é economia.
Se o vírus não tivesse saído de Wuhan, não teria causado uma pandemia global. Provavelmente, nem teríamos conhecimento disso. Mas isso não aconteceu, e agora temos conhecimento. Um vírus não se pode mover sozinho. Não precisa. Ele viaja à boleia. Entender como um vírus se pode disseminar pelo mundo a partir de um único local requer entender como as pessoas viajam e migram. O quanto as pessoas querem deslocar-se reflete desejos de longa data e fugazes, bem como tendências do Instagram. O quanto podem movimentar-se reflete estados de guerra e de paz, quão ricas são as pessoas e como as riquezas são distribuídas, os preços do petróleo e a regulamentação governamental.
Isto também é economia.
Os funcionários do governo mobilizaram-se para prevenir e controlar a propagação do vírus. Impuseram proibições de viagens e implantaram várias outras medidas «não farmacêuticas», ou seja, lavar as mãos. Ficar em casa. Distanciamento social. Mas as pessoas nem sempre fazem o que lhes mandam. Compreender como e quando as pessoas cumprem as instruções requer compreender os padrões de comportamento, normas e todos os tipos de crenças e atitudes. Saber se as pessoas seguem as instruções requer o respetivo acompanhamento. Isto, por sua vez, requer a medição de coisas como padrões de movimento, comportamentos e hábitos — em grande escala e em tempo real.
Isto também é economia.
As pessoas queriam agir — para impedir a disseminação da doença, incentivar o bom comportamento, distribuir vacinas e compensar as pessoas que sofriam sem terem culpa nenhuma. Descobrir o que pode e deve ser feito requer descobrir o que aconteceria se agíssemos — ou se não fizéssemos nada. Isto envolve não só prever a reação das pessoas, mas também avaliar os méritos de cada caminho alternativo. Fazer um julgamento de todas as coisas exige que comparemos o bom e o mau de uma forma sistemática. Provavelmente, queremos atribuir alguns números às coisas. Estes números podem ser em dólares ou libras, mas não precisam de ser. Unidades de felicidade ou «utilidade» também podem servir. Poderíamos chamá-lo de análise de custo-benefício, porque estamos a pesar custos e benefícios.
Sim, isto é economia.
Uma vez que o vírus foi controlado de forma gradual, as pessoas que- riam relaxar as restrições e voltar ao normal. Mas muitas perceberam que podíamos melhorar nos negócios, como de costume. A pandemia não só causou novos problemas, como exacerbou os já existentes: desigualdade, disparidades de saúde, residência precária, falta de acesso a cuidados de saúde e assim por diante. Os problemas existentes tornaram-nos mais vulneráveis. Deveriam ter sido corrigidos há muito tempo. Reconstruir melhor requer entender as condições que se aplicam — tanto as oportunidades como as limitações. Uma economia extremamente complexa exige que milhões e milhões de pessoas coordenem as suas atividades — principalmente para que os produtores queiram produzir o que os consumidores querem consumir. Entender como fazer isso funcionar requer descobrir como coordenar as atividades de toda a economia.
É tudo economia.
Este livro ilustra como a economia pode ajudar-nos a fazer do mundo um lugar melhor.
Não são só as pandemias. A economia pode ajudar-nos a lidar com uma série extraordinária de problemas, desafios e crises. A economia trata do comportamento individual e das consequências sociais. Os grandes desafios que a humanidade enfrenta são todos, em parte, causados pelo comportamento humano, seja individualmente ou em grupo. A guerra, as alterações climáticas, a poluição, a discriminação, etc., são causadas pe- los seres humanos. Mesmo que não fossem, as soluções envolveriam o comportamento humano. Resolver problemas requer que as pessoas ajam de maneira diferente: deixem de travar guerras, de discriminar pessoas com origens diferentes, de queimar combustíveis fósseis ou qualquer outra coisa. Encontrar a melhor solução requer avaliar custos e benefícios. Implementá-los exige coordenação entre muita, muita gente.
Todos os grandes problemas têm uma realidade física subjacente. A realidade física condiciona os caminhos do desenvolvimento e o leque de soluções. Haverá outros cientistas a estudar esta realidade. Deveríamos ouvi-los. Outros cientistas estudam realidades sociais e políticas. Deveríamos ouvi-los também. (Não estou a dizer que devemos ouvir apenas os economistas.) Mas nenhuma ciência física, médica ou política pode abordar as grandes questões sozinha. Entender como surgiram os desafios que a humanidade enfrenta, tentar prever o que vai acontecer a seguir, prevenir desastres futuros — tudo isto é economia.
O que é a economia?
A economia sempre esteve relacionada com corrigir o mundo — tornando-o um lugar melhor, mais adequado para a prosperidade do ser humano.
Isto pode surpreender o leitor. Muitas pessoas acreditam que economia se resume a prever o mercado de ações, no melhor dos casos, ou a promover os interesses da classe dominante, no pior. Há economistas que fazem essas coisas. Mas, em geral, não é verdade. A economia tem um amplo alcance. Não se trata apenas, nem principalmente, de fazer previsões. Não se resume apenas ao mercado de ações, indicadores de desemprego e afins. E as propostas dos economistas são bastante radicais. Muitas vezes, focam-se em melhorar a vida dos menos favorecidos — libertando os pobres e oprimidos, tornando as suas vidas mais suportáveis e os seus futuros mais brilhantes.
O que é a economia? De onde veio? Para que serve?
Arthur Cecil Pigou, um economista de Cambridge, é conhecido como o pai da economia do bem-estar. Ele tentou responder a estas três perguntas há um século. Pigou disse que algumas ciências visam produzir luz, enquanto outras visam produzir frutos. Algumas trazem-nos conhecimento que queremos em benefício próprio; algumas trazem-nos conhecimento que queremos porque nos ajuda a tornar o mundo um lugar melhor. Algumas satisfazem um desejo puramente intelectual; algumas satisfazem um desejo de melhoria social ou de outro tipo. Para Pigou, a economia cai diretamente na segunda categoria. Ele escreveu: «Não é o espanto, mas sim o entusiasmo social que se revolta contra a sordidez das ruas mesquinhas e a tristeza das vidas murchas que é o início da ciência económica.»
Como salientou Pigou, a economia nasceu da frustração com o sofrimento e a miséria. É impulsionada por um desejo de melhoria social. Pensa na melhoria em termos de bem-estar humano. Bem-estar, nesse sentido, é o que o se possui quando a vida está a correr bem. Bem-estar é o que é bom para alguém. É algo que se tem — não algo em que se está. Então, num nível fundamental, o bem-estar é o objeto da economia. É disso que trata a economia. Melhorar o bem-estar económico é o tema central da economia. É também o que os economistas estão a tentar promover nas suas recomendações de políticas. É fruto do trabalho dos economistas, quando as coisas correm bem. E o bem-estar é o padrão de avaliação — a medida pela qual podemos dizer se a economia é um sucesso ou um fracasso. A economia é, na visão de Pigou, um empreendimento profundamente moral.
Pigou fez questão de enfatizar que a economia é uma ciência. É o tipo de coisa que nos diz o que é e o que não é, como a física e a biologia. Não é o tipo de coisa que nos diz o que deve ser e o que não deve ser, como a teologia. A economia por si só não nos diz — na verdade, não pode — que o sofrimento e a miséria são maus. Pigou cita o grande pensador positivista francês Auguste Comte: «Cabe ao coração sugerir os nos- sos problemas; cabe ao intelecto resolvê-los.» Uma vez que o coração se rebela contra a sordidez das ruas mesquinhas e a tristeza das vidas murchas, como deveria, a economia pode dizer-nos como resolver as coisas. Pigou compara a economia com a medicina. É uma ciência. É guiada pela sua relevância para problemas práticos imediatos e busca «o conhecimento para a cura que o conhecimento pode ajudar a trazer». A economia, acreditava, podia curar o que aflige a sociedade humana da mesma forma que a medicina pode curar o corpo humano. Pigou escreveu logo após a Primeira Guerra Mundial, quando a necessidade de cura — social e individual — estaria na mente de todos.
O economista austríaco Friedrich A. Hayek não podia estar mais de acordo. Segundo ele: «Provavelmente, é verdade que a análise económica nunca foi o produto de uma curiosidade intelectual desapegada sobre a razão de ser dos fenómenos sociais, mas de uma grande vontade de reconstruir um mundo que dá origem a uma profunda insatisfação.» A ambição de consertar um mundo imperfeito ajuda a explicar o escopo abrangente da economia. Com isto, refiro-me aos comportamentos e fenómenos que podem ser estudados por um economista. A economia não trata apenas da busca de riqueza e das instituições (como o mercado de ações) que a permitem. O escopo da economia é tão amplo quanto necessário para tornar o mundo um lugar melhor. A economia é uma ciência, mas nasce de um desejo apaixonado de melhorar um mundo que é evidente e dolorosamente imperfeito. E a sua tarefa é reconstruir o mundo para o tornar melhor do que era antes. Os economistas da esquerda e da direita estão de acordo. Karl Marx disse a célebre frase de que o objetivo não é apenas interpretar o mundo, mas transformá-lo.
O predecessor de Pigou, Alfred Marshall, apelidou a economia de «um estudo da humanidade nos negócios comuns da vida». O texto recorda-nos que a economia não se resume a ambições e aspirações mais elevadas. Não se trata apenas de necessidades mais insignificantes. Não se trata apenas de dinheiro e riquezas — embora também se trate deles. Para Marshall, a economia trata de todos e quaisquer desejos, comportamentos e atividades ligadas ao bem-estar humano. Com o esforço certo, esperava que tanto a pobreza como a ignorância fossem gradualmente extintas:
Agora, por fim, estamos a empenhar-nos seriamente em indagar se é necessário que existam as chamadas «classes inferiores»: isto é, se é necessário um grande número de pessoas condenadas desde o nascimento ao trabalho árduo, a fim de fornecer aos outros os requisitos de uma vida refinada e culta; enquanto eles próprios são impedidos pela sua pobreza e labuta de ter qualquer participação ou parte nessa vida.
Marshall pensou que a pobreza e a ignorância podiam ser eliminadas. Ele achava que o bem-estar estava ao alcance de todos — com a aplicação criteriosa da ciência económica.
Uma das visões mais influentes da economia pertence a Lionel Robbins, da London School of Economics. O seu Essay on the Nature and Significance of Economic Science, publicado pela primeira vez em 1932, pode ser o texto mais famoso de metodologia económica de todos os tempos. Segundo ele: «A economia é a ciência que estuda o comportamento humano como uma relação entre fins e meios escassos que têm usos alternativos.»
A economia trata do comportamento humano numa situação em que as coisas são escassas. Isto significa apenas que há menos do que as pessoas querem. O dinheiro é escasso. Quando paga a renda da casa, fica com menos dinheiro para gastar na alimentação. E quando gasta o dinheiro com alimentação, tem menos para gastar em presentes para a sua mãe ou para a sua mulher. O dinheiro é escasso mesmo para os milionários. Os Musks e os Bezos não podem, ao mesmo tempo, manter, doar e investir todo o seu dinheiro noutro projeto inútil por vaidade. O tempo é escasso. Uma hora em que trabalha é uma hora em que não está a dormir. E cada hora que dorme é uma hora em que não vai ao cinema. A atenção também é escassa. Há um limite de atenção e temos de decidir, de alguma forma, como utilizá-la. Os governos também enfrentam a escassez. Tal como acontece com as pessoas, há limites para a quantia que podem gastar em manteiga quando gastaram tanto em armas — e vice-versa. Os governos podem pedir dinheiro emprestado para financiar os gastos do défice de uma forma que nós não podemos. Mas enquanto houver alguns limites, haverá escassez.
Sob escassez, as pessoas e os países não obtêm tudo o que desejam. Têm de tomar decisões, e essas decisões exigem trocas — desistir de uma coisa para conseguir outra. Se decidir dormir até tarde, há outras coisas que não pode fazer: ir trabalhar, terminar o romance que estava a ler ou aproveitar o nascer do sol. O modo como deve trocar uma coisa por outra depende dos seus fins, objetivos e propósitos. A economia tem pouco a dizer sobre isso. As metas podem ser altas ou baixas, materiais ou imateriais, etc. O que torna uma escolha económica tem que ver apenas com as trocas que devem ser feitas — que uma coisa deve ser sacrificada para que alguma outra seja alcançada. Quando está a fazer scroll, está a sacrificar algum tempo que poderia ser usado a ler livros. E quando a defesa nacional responde por 10% de todas as despesas federais, como acontece nos EUA, há muitas outras coisas que não pode pagar.
A esfera económica, portanto, não se limita a questões de dinheiro ou mesmo de coisas materiais. Artes e cultura, guerra e paz, trabalho e lazer são exemplos da economia na aceção de Robbins. Quando os artistas fazem arte, estão a fazer sacrifícios em termos de tempo, esforço e atenção. Quando os políticos iniciam guerras, estão a fazer sacrifícios em termos da vida de outras pessoas. Quando as famílias decidem que um dos pais vai ficar em casa para cuidar do filho recém-nascido, estão a sacrificar parte dos rendimentos e da igualdade que advém de ser uma família com ordenados duplos. O resultado dessas escolhas refletirá os sacrifícios específicos que foram feitos. Robbins esforçou-se para especificar que a economia inclui até o que ele chamou de «indulgências para cometer o que, de outra forma, seria considerado uma ofensa contra a religião ou a moralidade» — basicamente, sexo, drogas e rock ‘n’ roll. As decisões para se envolver na prostituição, usar drogas ilícitas, tocar ou ouvir música são escolhas na escassez, tal como a decisão que uma comunidade enfrenta em relação à legalização do jogo e da marijuana. É tudo economia.
As visões de Pigou, Hayek, Marshall e Robbins moldaram a economia moderna em aspectos fundamentais. A economia trata de escolhas individuais em momentos de escassez — mas também das consequências dessas escolhas para a sociedade como um todo. A economia resume-se a coisas pequenas. Está relacionada com as pequenas decisões que as pessoas to- mam todos os dias sobre a vida, o trabalho e o lazer. Está também relacionada com as grandes coisas: questões como por que razão alguns países são pobres e alguns países são ricos e como lidar melhor com o risco de catástrofe climática. É sempre sobre o que é bom para as pessoas — o que faz as suas vidas valerem a pena — e sobre como melhorar o mundo em que vivem. O seu grande enfoque em melhorar o mundo torna a economia uma disciplina diferente de muitas outras.
É importante salientar que a economia não trata apenas de entender como o mundo funciona — trata de mudá-lo. Longe de ser um projeto desinteressado, frio e calculista, a economia nasceu de uma profunda deceção com o estado do mundo — e de um desejo apaixonado de o melhorar. Longe de ser um esforço tecnocrático para resolver as coisas à superfície, a economia espera reconstruir o mundo e torná-lo melhor — incluindo a eliminação da pobreza e da ignorância. Longe de ser uma busca limitada focada em dinheiro e riquezas, trata-se de tudo o que os humanos desejam e precisam. É sobre tudo o que ajuda os seres humanos a viver vidas satisfatórias, gratificantes e plenas — vidas que valem a pena ser vividas.
O caminho da economia
Este livro é sobre como a economia pode ajudar-nos a construir um mundo melhor — um mundo em que as pessoas vivam vidas melhores e com mais significado. A economia faz isso. Oferece soluções reais, exequíveis e baseadas em evidências para grandes problemas. As suas propostas podem ajudar a nossa vida privada, as nossas comunidades, os negócios e a política. As soluções são distintas, inovadoras e muitas vezes contraintuitivas. São bastante diferentes do que é oferecido noutros lugares, por exemplo, noutras ciências sociais e comportamentais.
Não espero que acredite na minha palavra. Cada capítulo aborda um grande desafio que enfrentamos, enquanto indivíduos e comunidades. Também descreve como os economistas propõem que lidemos com isso. Irei descrever a maneira económica de acabar com a pobreza e reduzir a desigualdade; melhorar a parentalidade sem se prejudicar a si mesmo; abordar o comportamento antissocial; salvar vidas; ser feliz, humilde e rico; construir uma comunidade e economizar recursos; e mais.
As soluções não farão do mundo um lugar melhor de forma mágica e por si só. Se está à espera de varinhas mágicas ou de milagres, vou encaminhá-lo para o corredor da ficção. (Não que haja algo de errado com a ficção.) A segunda melhor opção, e a melhor que podemos esperar de forma realista, é encontrar soluções sustentadas por evidências. É isso que a economia oferece. A evidência dá-nos motivos para agir e motivos para pensar que as nossas ações farão a diferença. Obviamente, o aconselhamento económico precisa de ser implementado com cautela e cuida- do. Tem, acima de tudo, de estar aliado a uma ética decente. Isso inclui uma visão da boa vida e uma boa sociedade. Eu diria que também precisa de ser aplicado tendo em vista a estética. Já que estamos a construir um mundo melhor, podemos torná-lo bonito, com a ajuda de poetas, pintores e artistas.
As soluções podem surpreendê-lo. Algumas pessoas esperam que os economistas «solucionem» todos os problemas através de privatizações, desregulamentação ou liberalização. Os economistas, de facto, às vezes sugerem essas medidas, mas, por vezes, opõem-se veementemente a elas. A assessoria específica dependerá do problema a ser resolvido, bem como do contexto em que se insere — incluindo os valores das pessoas envolvidas. Existem problemas que os economistas desejam resolver aumentando os impostos, dando dinheiro aos pobres, promovendo a igualdade, estimulando a humildade ou capacitando as comunidades. Uma coisa que essas soluções tendem a ter em comum é que estão longe de ser conservadoras, no sentido de defender o statu quo. As soluções económicas são discretamente radicais — e frequentemente libertadoras. Muitas vezes, são concebidas para promover os interesses dos menos favorecidos, não dos ricos e poderosos.
Pode ficar tentado a perguntar: «Isto é realmente economia?» A série de problemas que os economistas abordam e as soluções que propõem é realmente vasta, mas a resposta será um entusiástico: «Sim!» Deve recordar-se de que a economia trata de tudo e qualquer coisa relacionada com o bem-estar humano. Às vezes, as pessoas queixam-se do «imperialismo» dos economistas — o que é uma forma de dizer que se queixam porque não são convidados nem bem-vindos. Mas, em grande medida, o alegado imperialismo da economia é apenas um reflexo do seu amplo escopo. Isto é um recurso — não um erro. Então, mais uma vez, a economia mais impressionante hoje em dia é a interdisciplinaridade. É economia, mas não é só economia, e baseia-se numa grande gama de influências da psicologia, neurociência e outras, até à literatura e à teologia.
As ferramentas da economia
Como é que os economistas sabem o que funciona? É uma pergunta jus- ta, especialmente agora, que as redes sociais e tradicionais estão repletas de «especialistas» em todos os tópicos concebíveis. Vou dar-lhe uma ideia do que torna a economia séria e diferente disso. As soluções dos economistas — ao contrário das de alguns formadores de opinião que podia citar — não são simplesmente tiradas do nada. Não conseguirei rever todo o registo empírico subjacente às várias soluções, mas irei descrever de onde vêm as soluções dos economistas e o que os faz pensar que as suas propostas irão funcionar.
A chave é entender as ferramentas que os economistas utilizam para investigar e melhorar a realidade económica. Existem muitas ferramentas. Experiências de laboratório, estudos de campo, experiências de campo e inquéritos permitem que os economistas recolham dados sobre as crenças, preferências e comportamentos das pessoas numa ampla gama de circunstâncias. A econometria — estatística para economistas — faz os números falarem por si. A teoria e os modelos ajudam o economista a criar um quadro do mundo, fornecendo estrutura para os dados empíricos e oferecendo orientação ao fazer inferências. O número e a sofisticação das ferramentas que os economistas usam para investigar o mundo continuam a aumentar. O kit de ferramentas padrão inclui agora técnicas futurísticas de imagem cerebral emprestadas da neurociência. Estas técnicas permitem-nos espreitar, por assim dizer, o cérebro a fazer escolhas.
O kit de ferramentas do economista também inclui uma certa maneira de ver o mundo. É a forma económica de pensar. A forma económica de pensar é uma coleção de heurísticas ou regras práticas. As heurísticas, por si, não nos dizem nada sobre o mundo. Em vez disso, dizem-nos como o abordar. Uma heurística central diz-nos para pensar nos fenómenos sociais como o resultado não intencional e talvez imprevisto de escolhas individuais. Algumas pessoas veem conspirações em todo o lado. O teórico da conspiração parte do princípio de que tudo o que acontece deve refletir algum desígnio tortuoso ou algo do género, mas o economista sabe que muitos fenómenos sociais surgem sem que haja nenhum projeto. Outras heurísticas dizem-nos para tratar as pessoas como fundamentalmente iguais, pensar à margem, procurar custos de oportunidade, pensar no longo prazo, resolver o equilíbrio, e assim por diante. Falaremos sobre o que estas heurísticas significam na prática, porque elas apresentam a maneira certa de pensar sobre os muitos desafios que enfrentamos e o que nos dizem sobre a melhor maneira de os enfrentar.
As ferramentas da economia — especialmente a forma económica de pensar — ajudam a explicar o que é a economia, o que os economistas fazem e o que torna as soluções dos economistas distintas. Pode pensar em estudar economia como quem pretende conhecer as ferramentas na caixa de ferramentas. Pode pensar num economista de pleno direito como alguém que as domina. A aplicação consistente das ferramentas da economia é o que torna as propostas económicas reconhecíveis como economia — em oposição à psicologia, sociologia, literatura ou qualquer outra coisa. Quando terminar de ler este livro, também estará a caminho de se tornar uma espécie de economista — se ainda não o é. (E isso não é uma coisa má.)
Porquê importar-se?
Porque devemos importar-nos? Porquê prestar atenção à economia? A razão mais óbvia é que nos preocupamos connosco, com outros seres humanos, comunidades e o mundo em que vivemos. Não é como se a economia pudesse responder a todas as perguntas e resolver todos os problemas — certamente não por si só. Não espero que isso resolva a sua vida amorosa ou remova as nódoas chatas das suas calças. Mas na medida em que a economia pode nos pode ajudar a melhorar, às nossas vidas, às nossas comunidades e ao mundo à nossa volta — e pode! —, todos os que se importam têm motivos para tentar aprender o que a economia pode ensinar.
Pode não se importar com todos os desafios de que falo neste livro. Talvez não tenha interesse em ser feliz e rico, preferindo outros objetivos e atividades. Tudo bem. Não lhe estou a dizer quais devem ser os seus objetivos e propósitos finais, mas tenho a certeza de que se importa com alguns dos desafios. Se se preocupa com qualquer um destes problemas, deve preocupar-se com as suas soluções reais, exequíveis e baseadas em evidências. Se não se preocupa com nenhum dos desafios — nem as alterações climáticas, nem a felicidade, nem a comunidade, etc. —, é provável que tenha problemas maiores do que aqueles que podem ser abordados num livro.
O facto de a economia oferecer soluções — e não apenas entendimento — é particularmente importante numa época em que somos bombardeados com informações sobre os problemas que a humanidade enfrenta. A economia pode oferecer uma certa esperança onde a esperança é desesperadamente escassa. Existe um termo para a forma específica de desamparo ou torpor que as pessoas vivenciam depois de ouvir os factos sobre as alterações climáticas. O termo é «desespero climático». Algumas relatam sentir-se igualmente desanimadas ao ler sobre fome, desigualdade, poluição, discriminação, etc. Isto é alarmante. Sermos mais informados sobre um desafio não nos deve deixar menos motivados a fazer algo em relação a isso. Se os cientistas comunicam o seu conhecimento sobre um problema de uma forma que torna as pessoas menos suscetíveis a resolvê-lo, os cientistas falharam. Não estou a dizer que devemos deixar de falar sobre os problemas, estou a dizer que devemos estruturar a nossa discussão, se possível, de uma maneira que inspire a ação. O leitor pode nunca ter pensado em economia como algo edificante, no entanto, enquanto disciplina totalmente orientada para a política e focada no problema, pode sê-lo.
Saber mais sobre economia é bom por outro motivo: permite que melhore as suas soluções, para se tornarem mais adequadas às necessidades humanas. A política económica requer contribuições da comunidade e de outras partes interessadas. A ciência económica, por si só, não nos pode transmitir os problemas que são mais urgentes. Isso é algo para fazer com o coração (e a reflexão filosófica). A economia também não nos pode dizer que soluções são moralmente permissíveis. Não nos pode dizer os valores que são mais importantes ou que considerações devem ser feitas nas suas análises de custo-benefício. Para ser o melhor possível, a economia requer contribuições da comunidade. Mesmo uma política económica bem pensada não funcionará na prática sem uma certa adesão das pessoas que a recebem. E se for implementado, precisa de ser endossado pelos decisores políticos e pela população perante a qual eles prestam contas.
Saber mais sobre economia é igualmente útil, independentemente da sua ala política. Se se considera de direita, vai encontrar sugestões que vão ao encontro de conceções preexistentes. Mas também vai perceber que pode haver algo a ser dito sobre intervenções que pode associar à esquerda — dar dinheiro aos pobres, por exemplo. A mesma coisa se aplica se for de esquerda. Uma sociedade de esquerda decente não pode ser comandada por ideias estapafúrdias. Ainda precisa de resolver problemas de produção e distribuição. Se houver recursos que possam ser usados para ajudar os pobres e oprimidos, alguém tem de produzir esses recursos. Gerir uma sociedade decente — uma sociedade na qual se orgulharia de viver — exige economia.
Há boas notícias. Dado o ponto em que nos encontramos, um pouco de estudo pode resultar num grande aumento da compreensão. Se ainda não teve a oportunidade de saber o que os economistas têm feito, a sua curva de aprendizagem será íngreme. Mesmo um pequeno investimento de tempo e esforço pode dar-lhe muito novo conhecimento. Como diriam os economistas: na margem, o seu retorno sobre o investimento será sólido.
E aqui está um último motivo para se importar. Saber mais sobre o que a economia é permite-nos avaliá-la como uma disciplina. A economia sempre teve mais do que a sua quota-parte de críticos. Desde o início, foi perseguida por um movimento que denunciava os seus praticantes, atacava as suas suposições, rejeitava as suas conclusões e protestava contra a sua influência. O historiador de economia William Oliver Coleman dá ao movimento o nome de antieconómico. Os antieconomistas não discordam apenas ou criticam teorias ou práticas específicas dentro da economia. Eles querem dispensar todo o empreendimento e começar tudo outra vez. Mas o que se passa é o seguinte: se a economia é boa ou má, depende do que ela faz; que desafios pode enfrentar e que problemas pode resolver. Até termos a resposta a essas perguntas, não estamos em posição de responder à questão se a economia é boa ou má.
Olhar em frente
Ao longo de dez capítulos, vai conhecer maneiras pelas quais a economia pode ajudar a tornar o mundo um lugar melhor — um lugar mais adequado para o ser humano prosperar. Vai aprender soluções para proble- mas grandes e pequenos. Vai perceber que a economia pode restaurar o mundo da mesma forma que a medicina pode curar o corpo. Vai ficar a saber por que razão os antieconomistas estão completamente enganados. Vai aprender as ferramentas da economia e, no processo, tornar-se-á uma espécie de economista. Para o ajudar a dominar a linguagem técnica, vai encontrar um glossário na página 233. (O aperto de mão secreto vou ter de lhe ensinar pessoalmente.)
Pigou e os seus companheiros de viagem tinham razão. A economia não é perfeita, mas confiar nela é melhor do que não confiar. A economia é uma ciência — sim, como a física. Chamá-la de «ciência moral» não é um oxímoro. Ela ajuda a explicar e a prever coisas que, de outra forma, seriam confusas. E não é só isso. Mantém a promessa de melhorar as nossas próprias vidas e de tornar o mundo um lugar mais feliz, melhor e mais justo para nós e para os nossos filhos. Isto verifica-se especialmente quando se trata dos pobres e espoliados — as pessoas cuja miséria levou Pigou e os seus companheiros de viagem à revolta há um século.
A economia realmente pode salvar o mundo.
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