Argumentando que os empresários “têm de ser cada vez mais resilientes para os custos de contexto que têm”, Paulo Barradas Rebelo observou que este ano que agora se inicia “vem aumentar a incerteza”.
“Seria o ano já com mais eleições no mundo e agora há que somar, também, as de Portugal. Eu queria que as coisas funcionassem cada vez com menos intervenção política, porque não podemos confiar, infelizmente, nos políticos que nos governam. Este país, e os outros, têm de ter mecanismos de administração pública que não dependam tanto da política. Estando os processos em andamento, se tivermos uma administração pública de qualidade, isso não devia interferir com os ciclos políticos”, argumentou o responsável da farmacêutica sediada em Coimbra.
Apesar de a Bluepharma ter crescido em 2023 mais de 25% em faturação, conseguindo, de acordo com Paulo Barradas Rebelo, exportar mais (cerca de 89% do total) e alcançar bons resultados, “que vão permitir encarar o futuro com algum otimismo”, não deixou de ser “um ano muito difícil” para a indústria farmacêutica.
“A expectativa era negra, estamos num setor em que os custos não deixam de aumentar. Permanentemente, somos chamados a investir e, se queremos crescer, temos de investir”, frisou Barradas Rebelo, aludindo a aumentos a multiplicar por quatro nas taxas de juro e uma inflação estimada em 40% com a subida dos custos das matérias-primas, mão-de-obra ou energia, entre outros.
“O Estado, por um lado, diz que o setor é estratégico por razões de saúde pública e de economia do país, emprega mão-de-obra muito qualificada, fortemente inovador e exportador, é um modelo do que qualquer país quer ter em termos industriais e a indústria farmacêutica protagoniza isso. No entanto, o preço dos medicamentos não sobe e o medicamento não tem elasticidade para fazer traduzir todos estes aumentos, o que se traduz numa situação difícil, com escassez de medicamentos no mercado”, avisou.
Com o aumento de custos de contexto, Paulo Barradas Rebelo admitiu que, em 2023, ao nível do investimento, a Bluepharma optou por uma “travagem grande”, reduzindo uns e repensando outros.
Isto depois de ter cumprido “dois objetivos ambiciosos que estão concretizados”, a reabilitação e a expansão da unidade industrial de São Martinho do Bispo, sede da empresa fundada em 2001, no valor de cerca de 50 milhões de euros, e a nova fábrica de Eiras, um investimento de cerca de 30 milhões.
Um dos projetos que está a ser repensado é o do chamado Bluepharma Park, em Cernache, a sul de Coimbra, um investimento de 150 milhões de euros, a concretizar a 10 anos, e que inclui uma unidade de investigação e desenvolvimento dos chamados injetáveis complexos, uma fábrica para industrializar esses medicamentos – que poderá, por exemplo, produzir vacinas – e uma plataforma logística para acomodar os produtos que a farmacêutica exporta de Portugal para todo o mundo.
“A prudência tem sido a nossa característica. Em Cernache, estamos aqui num momento de espera para ver o que é possível fazer”, resumiu o presidente da Bluepharma.
Já na génese da fábrica de Eiras esteve o trabalho do grupo farmacêutico, ao longo de mais de uma década, em parceria com duas empresas alemãs, no desenvolvimento de medicamentos oncológicos potentes, direcionados ao mercado hospitalar, resultando num “portfólio muito interessante, talvez dos mais interessantes que existem nas empresas europeias” para combater o cancro.
Paulo Barradas Rebelo explicou que a unidade de Eiras está destinada à produção de medicamentos sólidos de alta potência e que 90% da capacidade da nova fábrica será para esses medicamentos oncológicos.
Cerca de 98% da produção da nova unidade industrial destina-se à exportação, já que a nova fábrica possui uma capacidade instalada de 300 milhões de unidades e o mercado português nos hospitais apenas absorve cerca de 40 milhões.
“Estamos sobredimensionados para o nosso mercado e o objetivo é aumentar as exportações”, sublinhou o empresário.
Atualmente, a farmacêutica de Coimbra exporta para 45 países, com um foco de maior dimensão na Europa e EUA, mas chegando também à Austrália, Vietname, Arábia Saudita, África (Angola e Moçambique) e América Latina.
Uma das vantagens competitivas da Bluepharma tem sido os seus recursos humanos, que se cifram em cerca de 750 pessoas: “Temos gente muito boa a trabalhar, muito bem preparada, mas será o desafio dos próximos anos, quer para nós, quer para todas as empresas da nossa dimensão. A guerra de talentos existe no mercado e hoje o mercado globalizou-se na área dos recursos humanos, é possível em Coimbra trabalhar para Berlim ou Nova Iorque, e esse é o desafio do futuro em Portugal”, notou Paulo Barradas Rebelo.
“Não me canso de repetir que nós já pagamos salários justos para as pessoas receberem salários injustos. Temos um Estado que não para de engordar e os portugueses não param de emagrecer. Temos de trabalhar no sentido de ter um Estado mais parcimonioso nos custos que tem, sob pena de isto não dar para tudo. Não é elástico, os orçamentos não são elásticos, e enquanto o Estado gastar como gasta, falta a alguém, e falta às pessoas”, disse o presidente da Bluepharma.
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