O pedido foi entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU) pelo subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, com base numa reportagem difundida pelo jornal O Estado de S. Paulo no domingo.

Em causa está um alegado esquema montado pelo Presidente, Jair Bolsonaro, no final do ano passado, para aumentar a sua base de apoio no Congresso, tendo criado um orçamento paralelo de três mil milhões de reais em emendas (instrumento garantido aos parlamentares brasileiros face ao orçamento), e que, na maioria, foi destinado à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo Governo.

Trata-se de dinheiro paralelo ao previsto nas tradicionais emendas individuais a que todos os senadores e deputados têm direito. Secretamente, esses recursos extra foram concentrados num grupo de parlamentares que apoiava o Governo.

Com o orçamento secreto, o executivo negociou apoio para as candidaturas, em fevereiro, de Arthur Lira à presidência da Câmara dos Deputados e de Rodrigo Pacheco para comando do Senado, candidatos apoiados por Bolsonaro e que saíram vencedores.

“A situação requer, a meu ver, a atuação do TCU no cumprimento de suas competências constitucionais de controlo externo de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da Administração Pública federal, a fim de que sejam apurados os atos do Poder Executivo que porventura venham — contrariando as regras isonómicas previstas para a aprovação e liberação de emendas parlamentares individuais — favorecendo determinados parlamentares, em retribuição a apoio aos projetos do Governo”, frisou o procurador, citado pelo Globo.

“Esses recursos ‘extras’ ocorreriam, em princípio, à margem de todo as regras constitucionais, legais e regulamentares, em ofensa ao princípio da isonomia que orienta a distribuição de recursos orçamentários entre os parlamentares no regime das emendas individuais e sem a transparência que requer o uso de recursos públicos”, acrescentou Furtado.

Além do procurador, também o deputado federal Marcelo Freixo deu entrada de um pedido no TCU para investigar esse orçamento paralelo.

De acordo com o jornal O Estado de S. Paulo, o Ministério do Desenvolvimento Regional e a empresa estatal Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) têm sido o atalho preferencial de deputados e senadores para direcionar essas verbas para obras, como pavimentação e instalação de poços, e para a compra de máquinas pesadas, como tratores, retroescavadoras e camiões-cisterna, para municípios considerados estratégicos.

“É um absurdo que o Governo Federal continue a patrocinar os seus aliados, incluídos antigos e atuais presidentes das casas parlamentares, para manejo de interesses particulares com evidente desvio de finalidade e sobrefaturamento. Tais verbas poderiam ter sido utilizadas no combate à pandemia, sobretudo na compra de vacinas”, indicou Freixo no documento entregue ao TCU.

Numa investigação ao longo de três meses, o jornal O Estado de S. Paulo teve acesso a 101 ofícios e descobriu que Bolsonaro alegadamente atribuiu a um grupo de deputados e senadores o direito de impor onde seriam aplicados milhares de milhões de reais, provenientes de uma nova modalidade de emendas, chamada RP9.

Contudo, oficialmente, Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de definir a aplicação dos recursos das emendas RP9. O Presidente considerou que isso contrariava o “interesse público” e estimulava o “personalismo”, mas foi exatamente esse esquema que adotou, ignorando o seu próprio ato, segundo a investigação de O Estado de S. Paulo.