O estudo “Observatório Escolar: Monitorização e Ação | Saúde Psicológica e Bem-estar” foi realizado este ano junto de 8.067 crianças e adolescentes que frequentam escolas portuguesas, desde o pré-escolar até ao 12.º ano.
“Penso que os alunos, tirando uma minoria, dentro de uns tempos estarão recuperados”, defendeu a coordenadora do estudo, Margarida Gaspar de Matos, da Equipa Aventura Social da Universidade de Lisboa.
Segundo os investigadores, os problemas de saúde mental agravam-se à medida que os alunos crescem, até chegarem ao 12.º ano, altura em que são relatados mais problemas.
Ao longo do percurso escolar surgem duas exceções, as crianças do 2.º ano e os jovens do 8.º, que aparecem também especialmente vulnerabilizadas.
Os estudantes do 5.º ano aparecem como os mais satisfeitos com a vida e com menos sintomas de mal-estar psicológico: São os mais otimistas, confiantes, com maiores índices de sociabilidade, criatividade, energia e menor ansiedade face aos testes.
Esta é a primeira vez que o Ministério da Educação pede um estudo nacional sobre a saúde psicológica e bem-estar da comunidade escolar que, segundo o ministro João Costa, passará a ser realizado periodicamente.
“É uma resposta a evidências [provas] científicas que nos dizem que o bem-estar se correlaciona muito positivamente com os resultados escolares dos alunos, com o seu desempenho académico e, por isso, não podemos deixar isto de foram da atividade da escola”, explicou João Costa.
No estudo hoje divulgado, os investigadores procuraram identificar sintomas emocionais, problemas de comportamento, hiperatividade, problemas relacionados com os colegas, mas também comportamentos prossociais entre as crianças do pré-escolar e 1.º ciclo.
Após os inquéritos realizados com a ajuda de professores e educadores, concluíram que cerca de um quarto das crianças são irrequietas (23,2%) e distraem-se com facilidade (24,9%), mas 88,6% dizem ter pelo menos um bom amigo.
Entre os alunos mais velhos, mais de um quarto disse sentir tristeza (25,8%), irritação ou mau humor (31,8%) e nervosismo (37,4%) várias vezes por semana ou quase todos os dias.
Embora a maioria refira que raramente ou nunca sente uma tristeza tão grande que pareça não aguentar (67,1%), quase um terço admitiu sentir essa tristeza pelo menos mensalmente (32,9%).
Na escala de perceção da qualidade de vida, sete em cada dez alunos (71,4%) disseram sentirem-se calmos e tranquilos pelo menos metade do tempo, mas quase metade (42,7%) admitiu que ficava muito tenso na altura dos testes.
Numa comparação entre géneros, os rapazes mostraram ter uma melhor perceção de bem-estar, satisfação com a vida e menor sintomatologia de mal-estar psicológico. Eles são mais otimistas, têm maior controlo emocional, mais confiança, sociabilidade, mas também sofrem mais de ansiedade face aos testes e são mais vezes vítimas de 'bullying'.
Os investigadores defenderam por isso que as raparigas carecem de “atenção redobrada à medida que se avança na escolaridade”.
O estudo surgiu na sequência da pandemia de covid-19, precisamente para perceber o efeito na comunidade escolar, concluindo que um em cada três alunos considerou que a vida na escola piorou, um quinto achou que a vida com os amigos também ficou pior e 28,4% referiu que a vida consigo mesmo também se agravou. Já a vida em família manteve-se inalterada para a maioria (56,7%).
Para Margarida Gaspar de Matos, os resultados não são dramáticos: “Isto não é uma catástrofe nacional, é apenas um período de vulnerabilidade nacional”, defendeu a coordenadora do estudo, realizado em parceria pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), Direção-Geral da Educação (DGE), Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE), e com a colaboração da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) e Fundação Calouste Gulbenkian.
O estudo encontrou também diferenças por regiões: Entre os mais pequenos, foram identificados mais problemas nas escolas das regiões do Douro e Tâmega e Sousa, nomeadamente no que toca aos sintomas emocionais, problemas de comportamento e problemas de relacionamento com os colegas.
Entre os mais velhos, os alunos das escolas do Alentejo aparecem como sendo os mais satisfeitos com a vida, por oposição aos algarvios que são os que se sentem pior, com menos confiança, sociabilidade e menor índice de relações positivas com os professores.
Os alentejanos são os que têm perspetivas mais positivas e dos que menos sofrem com os testes, por oposição aos alunos do Algarve e Norte que sentem maior pressão com o aproximar das provas.
Metade dos professores revelam sinais de sofrimento psicológico
“Pelo menos metade dos docentes acusa sinal de sofrimento psicológico em pelo menos uma das medidas consideradas”, conclui o estudo “Observatório Escolar: Monitorização e Ação | Saúde Psicológica e Bem-estar”, encomendado pelo Ministério da Educação, em que participaram 1.457 professores, na sua maioria mulheres (81,8%).
Apesar de o trabalho na escola ser motivo de satisfação para a maioria dos professores, o estudo indica, no entanto que são muitos os que se sentem nervosos, irritados ou de mau humor, havendo mesmo quem admita ter dificuldade em adormecer (48,5%).
Um em cada cinco professores (20%) disse sentir-se “tão triste que parece não aguentar”, segundo o trabalho realizado pela Equipa Aventura Social da Universidade de Lisboa, em parceria com a Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC), Direção-Geral da Educação (DGE), Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar (PNPSE), e com a colaboração da Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) e Fundação Calouste Gulbenkian.
Os investigadores concluíram que o ambiente da escola e a qualidade da gestão dos agrupamentos escolares parecem estar associados ao sofrimento psicológico dos docentes, uma situação também agravada pela idade e tempo de serviço.
A média de idades dos inquiridos foi de 51 anos e o tempo médio de serviço de 25,98 anos.
Os docentes com mais idade e mais tempo de serviço relatam menor qualidade de vida, mais sintomas de depressão e ansiedade, menor perceção de apoio por parte da direção do agrupamento e um ambiente escolar menos favorável.
“Os professores estão muitos doentes. A minha preocupação é muito com os professores, porque um professor perturbado com 30 alunos à frente não vai conseguir fazer um bom serviço nem para ele nem para os alunos”, disse a coordenadora do estudo, Margarida Gaspar de Matos.
Mais de metade dos docentes disse ter-se sentido nervoso (55,3%), triste (53,4%), irritado ou de mau humor (51,3%), com frequência semanal ou superior, nos últimos tempos.
No entanto, quando questionados sobre como se sentiam do ponto de vista da sua saúde psicológica no primeiro trimestre de 2022, mais de metade (54,6%) referiu uma satisfação com a vida igual ou superior a sete, numa escala em que zero representa “pior vida possível” e 10 “melhor vida possível”.
Sobre as últimas duas semanas antes da avaliação, mais de metade relatou ter-se sentido alegre e bem-disposto (61%), calmo e tranquilo (58,2%), ativo e enérgico (53,8%) pelo menos metade do tempo.
Mais de metade sentiu que realizou atividades de interesse (55,1%) pelo menos metade do tempo e mais de um terço (37,8%) disse ter acordado a sentir-se revigorado e descansado, pelo menos metade do tempo.
Já na semana anterior à avaliação, 72,5% apontaram dificuldades em relaxar, agitação (71,3%), queixaram-se de reagir de forma excessiva a determinadas situações (68,2%), sentiram-se demasiado suscetíveis ou irritáveis (65,9%).
Seis em cada dez disseram ter muita dificuldade em ter iniciativa para fazer coisas (60,1%), sentimentos de tristeza ou depressão (60%), sentirem que estavam a utilizar muita energia nervosa (59,1%) e dificuldade em acalmar-se (53%).
A maioria dos professores reconheceu o trabalho feito pela direção escolar, dizendo que esta apoia a manutenção de um ambiente de partilha e colaboração, inovação, diálogo e bem-estar assim como coesão na escola.
“Cerca de oito em cada 10 docentes refere estar satisfeito, no geral, com o seu trabalho na escola (78,5%) e mais de metade dos docentes refere ainda estar satisfeito com as oportunidades de desenvolvimento profissional contínuo no âmbito da promoção do desenvolvimento socioemocional e do bem-estar (54,1%)”, lê-se no estudo.
Segundo os professores, quase todas as escolas promoveram práticas para as competências socioemocionais e projetos para o desenvolvimento das competências sociais e emocionais.
Sobre o impacto da pandemia, mais de metade considerou que a sua vida ficou pior ou muito pior com os amigos (70,1%) e na escola (68,6%).
Na vida em família, cerca de metade refere que ficou na mesma e um pouco menos de metade 46% refere que ficou pior com a pandemia.
Olhando para as diferenças por regiões, a área metropolitana de Lisboa (à exceção dos níveis de stresse) e a zona Norte parecem privilegiadas em relação aos indicadores de saúde psicológica dos professores, enquanto a zona sul (Alentejo) aparece globalmente com uma situação menos favorável.
O Algarve e o Norte foram as regiões com melhores indicadores de um bom ambiente na escola, enquanto o Alentejo apresenta globalmente com uma situação menos favorável.
No entanto, a um nível mais pormenorizado de indicadores na região Norte, que aparecia beneficiada, surgem “focos problemáticos”, enquanto no Alentejo, que era penalizado, emergem situações muito favoráveis.
Para os investigadores este é também um sinal da importância do ambiente da escola e da qualidade da gestão da escola na saúde psicológica dos docentes.
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