O estudo sobre as perceções dos psiquiatras portugueses sobre o papel dos jornalistas na cobertura noticiosa do suicídio e nos preconceitos sobre saúde mental em Portugal, publicado na revista científica Journal of Community Health, baseou-se em 128 respostas a um questionário ‘online’ e em 10 entrevistas semiestruturadas a psiquiatras de todo o país.
Em declarações hoje à agência Lusa, Eudora Ribeiro, investigadora e primeira autora do artigo, disse tratar-se do primeiro estudo com esta abordagem a nível nacional e internacional.
“Foi nossa intenção contribuir para o debate sobre como melhorar a cobertura noticiosa do suicídio com um objetivo preventivo e estimular a reflexão sobre o papel que os especialistas em saúde mental, como os psiquiatras, podem assumir”, adiantou.
O estudo, que contou com o apoio do Colégio da Especialidade de Psiquiatria da Ordem dos Médicos, concluiu que mais de 95% dos médicos acredita que os jornalistas podem ser aliados na prevenção do suicídio e que os media podem promover o diálogo e a consciencialização sobre problemas de saúde pública como o suicídio.
Apenas 24% avalia a sua relação com os jornalistas como sendo de cooperação, enquanto 14% a qualificou como conflitual e 62% como neutra.
Vários especialistas falaram em barreiras ou dificuldades na comunicação, nomeadamente um “vício” dos psiquiatras “para comunicarem de certa forma” sem ajustarem o seu discurso de modo a serem mais bem compreendidos.
A maioria deu nota negativa à cobertura noticiosa do suicídio em Portugal, considerando-a sensacionalista (67%), irresponsável (68%), incumpridora das recomendações para as melhores práticas (75%) e sem um papel preventivo (85%).
Também deixaram críticas aos media, nomeadamente a perceção de que os jornalistas não explicam certos conceitos corretamente, ou transmitem apenas a parte mais chamativa da informação, em vez de tudo o que é importante para definir um conceito ou doença, referem os autores do estudo, Eudora Ribeiro e António Granado, investigadores do Instituto de Comunicação da NOVA.
Cerca de dois terços consideram que os suicídios não devem ser noticiados e, para quase 59%, o risco de potenciais comportamentos de imitação, após a cobertura noticiosa, deve pesar mais na decisão de publicar ou não suicídios.
Já para os restantes 41%, é a consciencialização da população que deve ser decisiva. Contudo, apesar desta divisão, cerca de 84% dos médicos responderam que o silêncio não ajuda a resolver problemas de saúde pública.
Mais de 74% dos participantes consideram que o suicídio deve ser comunicado para transmitir informação útil enquanto problema de saúde pública e para contribuir para a sua prevenção.
Os psiquiatras entrevistados defenderam que falar sobre suicídio não deve ser um tabu na comunicação social pelo potencial efeito preventivo que notícias responsáveis podem ter sobre indivíduos em risco.
Entre estas orientações, foram destacadas a inclusão de contactos de apoio, sinais de alerta e fatores de risco.
“Os resultados sugerem que existe um longo caminho a percorrer para que exista uma parceria entre psiquiatras e jornalistas com vista à melhoria da qualidade das notícias sobre suicídio e esperamos que este estudo inspire estudos semelhantes em outros países, uma vez que o suicídio é um problema de saúde pública internacional” e esta colaboração pode ajudar a preveni-lo à escala global”, salientou.
A Organização Mundial de Saúde recomenda os profissionais dos media a procurarem o aconselhamento de especialistas em saúde mental quando preparam peças sobre suicídio.
Os autores do estudo tiveram, desde o início da investigação, o objetivo de também incluir o contributo dos psicólogos portugueses, mas a Ordem dos Psicólogos não se mostrou disponível.
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