Com a demissão da presidente da instituição que apoia pessoas com doenças mentais e raras, Paula Brito Costa, sobre a qual recaem suspeitas de gestão danosa, denunciadas no sábado por uma reportagem da TVI, o acesso às contas bancárias está para já bloqueado a quem continua a manter a Casa dos Marcos, na Moita, a funcionar.
“Estamos a funcionar com toda a regularidade e normalidade. Os problemas que temos são ao nível das decisões que não são tomadas por ninguém e que têm que ser tomadas”, disse à Lusa, Manuela Duarte Neves, falando em nome dos trabalhadores.
“A preocupação mais imediata é a necessidade de haver dinheiro para comprar bens como medicação e alimentação para o funcionamento da casa”, disse à Lusa, mostrando-se, contudo, convencida de que os apoios solicitados “irão chegar em breve”.
A coordenadora do departamento jurídico da associação, que acolhe cerca de 200 utentes, reiterou que “é uma questão muito facilmente solucionável, assim haja vontade”.
“Basta que os poderes públicos nomeiem uma comissão de gestão ou uma direção temporária que tenha poder e possa tomar decisões”, disse.
Pais de utentes da Casa dos Marcos, que preferiram não ser identificados, afirmaram à Lusa que estão preocupados, sobretudo “com os funcionários e com os meninos, que lhes faltem os cuidados de que precisam”.
A mãe de uma criança utente da instituição afirmou que “os terapeutas são pessoas muito capazes”, pelo que mantém confiança total ao entregar o seu filho na Raríssimas.
“Quando isto se soube, os responsáveis pelos terapeutas tiveram o cuidado de falar com os pais, porque são excelentes profissionais, e fizeram questão de separar as águas”, contou.
No entanto, os pais estão preocupados porque, se alguma coisa acontecer à Raríssimas, “não há alternativa”.
A mãe de outra utente, adulta, partilhou que é o único recurso disponível a que pode aceder: “se não for aqui, onde é que a posso pôr?”, interrogava-se, frisando que há um espírito familiar entre todas as pessoas que recorrem à Raríssimas e que a sua preocupação ultrapassa a sua situação pessoal.
“Repare, eu não tenho aqui só a minha filha, tenho os outros todos. E os que não têm ninguém. Esses também são nossos”, referiu.
Manuela Neves, que soube ao início da tarde da formalização da demissão de Paula Brito Costa, indicou que o marido e filho desta, que também desempenham cargos na Raríssimas, não foram hoje trabalhar.
Paula Brito e Costa também não foi vista na instituição ao longo do dia de hoje e, segundo Manuela Duarte Neves, mantém um contrato de trabalho como diretora-geral da Raríssimas, funções que acredita que não irá conseguir exercer “dadas as circunstâncias”.
Apesar de já não ser presidente da instituição, a sua figura está bem marcada na entrada da Casa dos Marcos, com uma fotografia gigante a cobrir uma porta dupla e nas paredes, imagens emolduradas de Paula Brito Costa com o papa Francisco, Paula Brito Costa com a rainha espanhola, Letizia, e Paula Brito e Costa com Letizia e Maria Cavaco Silva, madrinha da instituição.
Pelo átrio de entrada, batizado em 2015 com o nome do atual ministro da Segurança Social, José António Vieira da Silva, em “reconhecimento pelo apoio incondicional”, como se lê numa placa, passaram hoje também inspetores da Segurança Social, que estão a “apurar eventuais infrações e ilícitos, referiu Manuela Duarte Neves.
“Não enterrem isto”, é o apelo final de uma das mães que depende da Raríssimas para dar qualidade de vida a uma filha com incapacidade total.
Uma reportagem divulgada no sábado pela TVI deu conta de alegadas irregularidades nas contas da Raríssimas, tendo apresentado documentos que colocam a agora ex-presidente da associação, Paula Brito e Costa, como suspeita de utilizar fundos da Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) para fins pessoais.
Entre as irregularidades apontadas, conta-se a compra de vestidos de alta costura, de bens alimentares caros e o pagamento de deslocações, apesar de ter um carro de alta gama pago pela Raríssimas. Além disso Paula Brito e Costa terá também beneficiado de um salário de três mil euros, de 1.300 euros em ajudas de custos e de um Plano Poupança Reforma que rondava os 800 euros mensais.
A associação tinha ainda entre os seus funcionários o marido da ex-presidente e o filho, ao qual Paula Brito e Costa chamava “o herdeiro da parada”.
A TVI avançou ainda que o agora ex-secretário de Estado da Saúde Manuel Delgado colaborou com a associação como consultor em 2013 e 2015.
Na terça-feira tanto Paula Brito e Costa como Manuel Delgado apresentaram a demissão dos cargos.
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