“Os vários conselhos de administração implementaram atos de gestão de eficácia à partida duvidosos e outros até danosos”, aponta o relatório numa das conclusões aprovadas por consenso dos deputados que compuseram a comissão.
O relatório concluiu também pela “ingerência dos sucessivos governos dos períodos de 2001 a 2015 nas decisões de gestão da TACV” e “pelo apoio às estratégias gizadas pelos vários conselhos de administração que se revelaram erradas e com enormes prejuízos” para a empresa.
A Comissão Parlamentar de Inquérito foi criada por proposta do Movimento para a Democracia (MpD), no poder, para investigar a gestão da companhia aérea pública cabo-verdiana desde 1975 a 2017, mas as conclusões deixaram de fora as decisões do atual executivo de ceder as rotas domésticas à Binter e de assinar um acordo de gestão da parte internacional com a Icelandair.
O relatório foi disponibilizado hoje na página Internet do parlamento cabo-verdiano e será discutido na sessão parlamentar do mês de junho.
Das 55 conclusões apresentadas no relatório, 22 foram aprovadas por consenso, tendo as demais sido aprovadas com os votos a favor dos deputados do MpD e contra dos do PAICV.
O Partido Africano da Independência da Cabo Verde (PAICV), cujos governos são visados em boa parte das conclusões, absteve-se na votação final do relatório “por respeito” às 57 pessoas e entidades ouvidas, entre antigos governantes, administradores, pilotos e pessoal navegante de cabine.
Na análise às gestões dos anos 1990 da empresa, os deputados concordaram que os custos “elevadíssimos” das operações domésticas constituíram “a maior hemorragia financeira” e penalizaram “severamente a performance económica geral da empresa”.
Os deputados verificaram que entre 1994 e 1999, a TACV perdeu quatro aviões na sequência da venda de dois aviões CASA, com prejuízos para a empresa, e de dois acidentes, em Santo Antão e na cidade da Praia.
O relatório concluiu igualmente que, no final da década de 1990, foi impedida, por decisão governamental, a execução de um plano de expansão que tinha como objetivo o mercado da África Ocidental.
À exceção do ano de 1997, a companhia gozava de “boa saúde financeira” e credibilidade junto dos credores, tendo conseguido adquirir nessa altura o seu primeiro Boeing sem recurso a aval do Estado, concluiu ainda a comissão.
Apontaram que, em 2002, a empresa encerrou o ano pela primeira vez em “falência técnica”, tendo registado em 2003 “uma recuperação ténue” e agravado a situação desde aí até 2015, ano considerado “o pior de sempre” com a empresa em “acentuado processo de falência técnica” e com o “maior prejuízo de sempre”, 3,4 mil milhões de escudos (cerca de 31,1 milhões de euros).
O relatório aponta igualmente que a empresa registou no ano 2000 “muitas dificuldades de tesouraria” que a impediram de cumprir vários compromissos com fornecedores e levaram à suspensão de condições de crédito acordadas.
No mesmo ano, houve uma injeção de capital para evitar a descapitalização da companhia.
O relatório indica ainda que não foi encontrada qualquer prova documental de interesse de operadoras internacionais na privatização da TACV, nem de ilegalidade nas nomeações dos órgãos sociais da empresa, na contratação da empresa Sterlin Merchant para assumir a gestão ou na operação de venda e retoma dos aviões nos finais de 2014 e 2015.
A empresa de Transportes Aéreos de Cabo Verde (TACV) deixou de fazer voos domésticos entre as ilhas cabo-verdianas que, desde agosto, passaram a ser assegurados pela Binter Cabo Verde.
Paralelamente, o Governo assinou um acordo com o grupo Icelandair para a gestão da operação internacional da companhia e reestruturação da empresa com vista à sua privatização, sendo que nenhum dos acordos foi divulgado publicamente.
A empresa pública cabo-verdiana acumula mais de 100 milhões de euros de passivo e os dois maiores partidos cabo-verdianos, MpD e PAICV, que têm alternado na governação do país desde 1975, responsabilizam-se mutuamente pela situação da companhia.
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