Ouvido como testemunha no terceiro dia do julgamento do processo BES/GES, o primo direito de Ricardo Salgado, com quem entrou publicamente em rota de colisão no final de 2013, explicou que apenas chegou em 2012 ao Conselho Superior (CS) do Grupo Espírito Santo (GES), onde estavam representados os cinco clãs e que só se aperceberia da falsificação das contas da sociedade ESI no final de 2013.

“Na primeira vez que cheguei ao Conselho Superior estavam já quase todos os membros e o meu pai, que era o presidente, informou que o CS não podia começar porque Ricardo Salgado não estava. Em primeiro lugar, o meu espanto, porque Ricardo Salgado era um vogal como qualquer outro, mas tivemos de ficar todos à espera. Foi o começo de um certo desentendimento meu com Ricardo Salgado”, contou.

“Em vez de começarmos a discutir assuntos, Ricardo Salgado começou a debitar o que tinha sido feito e o que se ia fazer, tanto no setor financeiro, como não financeiro. E eu levantei o braço e perguntei se era para discutirmos os assuntos ou se era para ouvir Ricardo Salgado dizer o que íamos fazer… a partir daí começou a tomar-me de ponta, porque viu que eu não estava disposto a fazer a mesma figura dos outros no CS do grupo”, frisou.

José Maria Ricciardi, que admitiu logo no começo da audição que não era “nem amigo, nem inimigo” de Ricardo Salgado, explicou também os cargos que ocupou em diversas entidades do GES e o que fez quando detetou os problemas nas contas.

“Quando se percebeu que as contas estavam falsificadas, a 07 de dezembro de 2013, se não estou em erro, apresentei um papel para a ata do conselho a dizer que não tinha qualquer conhecimento daquilo e que queria uma auditoria e que se apurassem responsabilidades”, indicou.

O ex-presidente do BESI salientou também o momento em que percebeu que a ESI estaria em situação de insolvência, quando o antigo contabilista do GES, Machado da Cruz, assumiu que o ‘buraco financeiro’ seria muito superior.

“Havia um grupo de trabalho que descobriu isto e disse que as contas de 2012 tinham uma diferença de 1.200 milhões de euros no passivo e, mesmo assim, Machado da Cruz disse que em 2013 ainda havia por cima mais não sei quantos mil milhões, o que fazia que o passivo não fosse uns três mil milhões mas uns sete mil milhões. Para quem percebe a área, via que estávamos completamente insolventes”, reconheceu.

O antigo presidente do BES, Ricardo Salgado, é o principal arguido do caso BES/GES e responde em tribunal por 62 crimes, alegadamente praticados entre 2009 e 2014.

Entre os crimes imputados contam-se um de associação criminosa, 12 de corrupção ativa no setor privado, 29 de burla qualificada, cinco de infidelidade, um de manipulação de mercado, sete de branqueamento de capitais e sete de falsificação de documentos.

Além de Ricardo Salgado, estão também em julgamento outros 17 arguidos, nomeadamente Amílcar Morais Pires, Manuel Espírito Santo Silva, Isabel Almeida, Machado da Cruz, António Soares, Paulo Ferreira, Pedro Almeida Costa, Cláudia Boal Faria, Nuno Escudeiro, João Martins Pereira, Etienne Cadosch, Michel Creton, Pedro Serra e Pedro Pinto, bem como as sociedades Rio Forte Investments, Espírito Santo Irmãos, SGPS e Eurofin.

Segundo o Ministério Público, a derrocada do GES terá causado prejuízos superiores a 11,8 mil milhões de euros.