Passou pouco mais de um ano desde que o Partido Comunista Português (PCP) assinou a Posição Conjunta com o Partido Socialista. Que balanço faz?

Foi determinante a decisão do PCP em interromper um caminho do Governo PSD/CDS. Depois do resultado eleitoral, constituíram-se possibilidades de travagem de um caminho que era inaceitável e que significou um grande retrocesso na vida das pessoas. O PCP foi determinante.

Jerónimo de Sousa falou em algumas limitações. Não foram tão ouvidos quanto queriam?

Limitações relativamente às imposições da União Europeia, às próprias imposições a que o PS se obriga. Nunca a imposições nossas. Há limitações que resultam desses condicionalismos, mas que da parte do PCP devem ser ultrapassadas.

A renegociação da dívida foi um desses condicionalismos.

A questão da dívida e da renegociação é uma questão determinante para o desenvolvimento do país. O PS, neste ponto, não tem a mesma abordagem que nós, mas nós temos sempre esta visão independentemente daquilo que o PS possa achar.

Essa dictomia fica bem assente quando se fala, por exemplo, da União Europeia (UE).

A UE impõe constrangimentos ao desenvolvimento do país. Pela sua posição de ingerência na política nacional, pelo que significa a imposição do tratado orçamental, pelo que significa a limitação ao investimento público em áreas fundamentais do serviço público. É, de facto, pela sua natureza, um obstáculo. 

Jerónimo de Sousa disse que este não é um Governo de esquerda. Não é?

Este é um governo do PS e de iniciativa do PS, não é um governo de esquerda.

Ainda assim, tem permitido pequenas conquistas por parte do PCP.

É um ponto de partida, mas não pode ser ainda um ponto de chegada para a recuperação de direitos e de rendimentos.

O entendimento atual permite esperar que a Posição Conjunta se mantenha durante os 4 anos?

Nós entendemos que é preciso concretizar na integra a Posição Conjunta, com aspectos que podem e devem ser aprofundados. Na Posição Conjunta havia uma matéria relativamente ao descongelamento das pensões e ao aumento do valor real das pensões. Foi a nossa posição que em 2015 nos permitiu estar em 2016 a defender o aumento do valor real e não apenas um descongelamento.

Neste Orçamento essa foi uma das conquista. Até onde quer ir o PCP?

O PCP teve sempre uma posição muito importante em todos os Orçamentos de Estado. Houve Orçamentos em que discutimos alternativas a um caminho de retrocesso. Neste, assim como no de 2016, discutimos a possibilidade de integrar propostas concretas na vida das pessoas, em contribuir com soluções para a vida das pessoas.

Neste continuamos a fazer isso, no combate à precariedade, na estratégia que ficou definida de vinculação de trabalhadores precários na administração pública, no aumento do abono de família, no aumento do número de crianças abrangidas pelo abono, pelo aumento do valor real das pensões… Isto prova que vale a pena lutar.

Considera que este Governo está a provar que havia um caminho alternativo ao reivindicado pela direita?

Volto a dizer: o que a atual situação política permite comprovar é que valeu e vale a pena lutar. E se hoje há outra correlação de forças na Assembleia da República é porque os trabalhadores e o povo português, ao longo de 4 anos, fizeram por isso. A reposição de direitos não é uma oferta de nenhum governo, é o resultado da luta de 4 anos duríssima que povo português travou.

Há pouco tempo foi divulgada uma sondagem na qual o PS se aproxima da maioria absoluta e o PCP desce 1% nas intenções de voto.

Nós dormimos descansados com as sondagens. Esse não é o nosso critério. O que nos preocupa é o nosso compromisso de todos os dias com os trabalhadores e com o povo.

Este era para ser o Congresso da sucessão. Com a Posição Conjunta parece que, mais uma vez foi adiada. 2020 será o ano em que Jerónimo de Sousa abandona a liderança do partido?

Eu não faço essa ligação entre Posição Conjunta e sucessão. É normal na vida do PCP existir uma prática de encontrar soluções diferentes. Jerónimo de Sousa tem todas as condições para continuar como secretário-geral do PCP e acho que está perfeitamente à altura; como tem estado ao longo dos últimos anos para desenvolver esse trabalho.

A Rita Rato é uma das caras da nova geração do PCP. Acha que há nomes suficientemente fortes para dar continuidade à linha marcada por Jerónimo de Sousa?

Há sobretudo um grande coletivo partidário. Um partido muito unido e muito coeso para enfrentar os desafios que temos pela frente, ao contrário dos outros partidos, o PCP não se constitui só com o seu grupo parlamentar ou com meia dúzia de militantes.

Que PCP vai sair daqui no domingo?

Um PCP com muita ligação aos problemas dos portugueses e dos trabalhadores. Com muita reflexão acerca das medidas que temos que enfrentar como prioridade de valorização do trabalho e dos trabalhadores. A importância da renegociação da dívida e de ter uma política patriótica e de esquerda, que cumpra a Constituição de Abril. Estamos em melhores condições para as tarefas e decisões do momento histórico em que vivemos.

É um momento histórico. Pela primeira vez o PCP está no arco da governação.

O PCP está pela primeira vez a contribuir para um alteração da correlação de forças na Assembleia da República para as propostas de sempre terem hoje possibilidade de serem discutidas com a importância que isso tem na vida das pessoas. E é de facto importante que muitos portugueses percebam que se hoje estamos a defender e a discutir medidas de reposição de direitos é porque o PCP tem lutado por isso. Este é um novo momento da vida do partido.

Acha que o PCP depois deste ano de Posição Conjunta não perdeu a sua identidade?

Pelo contrário, mais uma vez digo que o que provou este processo é que valeu e vale a pena lutar. É a reposição de direitos e de conquistas. Hoje estamos em condições de ter um pequeno papel decisivo na reposição desses direitos.

O PCP no Governo em 2019 é uma possibilidade?

Depende da vontade dos portugueses. Se houver vontade de certeza que o PCP estará à altura de todas as responsabilidades.