A Rússia prepara-se para eleições presidenciais, que vão ter lugar em março. Vladimir Putin, claro, é o favorito na corrida. Mas há uma nova personagem a ter em conta: Ksenia Sobchak, uma estrela da televisão russa. Aos 36 anos, Sobchak tem milhões de seguidores nas redes sociais e inspira-se no feito de Trump para cativar os russos nesta corrida — que admite ser impossível de ganhar.
Numa entrevista à rádio pública norte-americana, a candidata russa exemplifica quão “chocantes” são os apelos à liberdade de expressão e ao cumprimento da lei: “as coisas liberais que digo são tão chocantes como se dissesse [nos Estados Unidos], ‘tu és uma mulher nojenta’, ou ‘vão para casa, imigrantes’”.
“Não, não acho que tenho quaisquer hipóteses de ganhar, porque estas eleições são, para mim, uma espécie de eleições falsas”, atira a jovem candidata na entrevista à NPR, esta quarta-feira, em Washington. “Elas não são reais”, diz. “Não podes ganhar num casino — o casino ganha sempre. Da mesma forma, Putin ganha sempre”.
E são “eleições falsas” porque, diz Ksenia Sobchak, “nem todos os candidatos podem participar, não [há] igualdade na cobertura mediática a todos os candidatos e não [podem] controlar totalmente o voto em si”.
Apesar disso, a filha do antigo presidente da autarquia de São Petersburgo e mentor de Putin avança com a candidatura “para ser a voz das pessoas que partilham valores liberais”. Porque, acusa, “há muita gente ainda sem acesso à Internet” e que “não vê canais independentes — a sua única fonte de informação são canais federais, que são muito propagandísticos, porque todos pertencem, mais uma vez, a Putin”, explica.
Assim, participar nas eleições é uma oportunidade para usar os tempos de antena previstos na lei russa e “falar por todos aqueles que não querem que a situação dure para sempre”.
Apesar de ser filha de um antigo mentor do líder e mais bem posicionado candidato destas eleições, Sobchak diz que sofre ‘bullying’ político, com pessoas a ligar-lhe durante a noite a fazer ameaças de morte e rusgas a casa, por exemplo. Ainda assim, diz que vale a pena.
“Tem de perceber”, diz Sobchak, “que na Rússia sou uma pessoa muito famosa. Sou famosa há muitos anos pelos meus programas de entretenimento, através das minhas atividades no mundo do espetáculo”, exemplifica. “Todos os russos sabem quem sou. Por isso, uso isto para fazer o bem, porque é muito difícil calar-me — porque sou demasiado brilhante e sou muito visível há muitos anos para toda a gente”.
E é aqui que entra Donald Trump — o presidente norte-americano, há um ano à frente dos destinos dos Estados Unidos da América e cuja vitória apanhou muita gente desprevenida. Ksenia Sobchak diz querer colher o “feito Trump”. O que é isso?
“Muita gente gostaria de fazer um voto de protesto. Muita gente votou em Trump só para dizer ‘não’ ao sistema; eles não gostavam do sistema e Hillary [Clinton] era obviamente uma das líderes do ‘establishment’ [sistema político estabelecido]. Por isso, [o voto] foi do género, ‘olhem, nós já não gostamos disto, não queremos o ‘establishment’, por isso, vamos votar em Trump para mostrar o nosso ‘não’ ao sistema’”, explica a candidata russa.
É disso, aliás, que fala a assinatura da campanha de Ksenia Sobchak: “Contra todos”, que a candidata diz ser o “não” a um sistema protagonizado por Putin há quase duas décadas. É uma campanha para dizer que os russos estão “fartos daqueles tipos, fartos de Putin, fartos dos amigos do presidente que corrompem o país”.
Estrela da televisão e jornalista, a jovem admite sem problemas que não seria “a melhor presidente”, mas apela ao voto de protesto. “Os candidatos são tão aborrecidos, estamos cansados deles, é tudo tão injusto que a candidata Ksenia Sobchak acaba por ser a melhor opção”, diz a jovem à rádio norte-americana.
No início do ano, para não ficar atrás de Putin, Sobchak, que sempre se declarou uma pessoa “crente, mas não religiosa”, protagonizou um mergulho em águas gélidas — -40 ºC, marcava o termómetro. A façanha surgiu a propósito da festividade do batismo de Cristo, que os fiéis ortodoxos celebram em 19 de janeiro.
“Fi-lo! A primeira vez na minha vida! Obrigado, Tomsk pelos 40ºC!” negativos, escreveu Sobchak na sua página na rede social Instagram.
Sobchak, que está em campanha eleitoral nesta cidade siberiana, mostrou o termómetro do seu caro, que marcava 40 graus Celsius abaixo de zero na pequena localidade de Kornilovo.
Numa das fotos que acompanham a mensagem pode ver-se Sobchak a tiritar de frio e a entrar na água vestida apenas com um fato de banho. Noutra imagem vê-se a candidata sorridente, completamente molhada e a preparar-se para subir por uma escada coberta de gelo.
A iniciativa de Sobchak aconteceu depois de o Kremlin ter divulgado fotos de Putin a banhar-se a propósito da Epifania no lago Seliguer, na região de Tver, na parte europeia da Federação Russa.
Putin aparece nas imagens com água por cima da cintura, a benzer-se e na companhia de vários religiosos com ícones e cruzes.
Fonte do Kremlin explicou que este ano as temperaturas registadas na parte central da Rússia não são tão extremas como as habituais nesta altura do inverno e que “não fazia mais de seis ou sete graus negativos” na zona do banho.
Estatísticas oficiais apontam para que cerca de 1,8 milhões de pessoas tenham participado no rito ortodoxo em todos os cantos da Federação. Segundo a crença popular, esta água gélida, em tanques, lagos e rios, benzida por padres ortodoxos, tem propriedades curativas e é capaz de aliviar todos os males.
Aliviar a grande Rússia dos males é também o objetivo de Sobchak para depois das eleições. Quer formar um movimento e entrar no parlamento russo. A jovem acredita que “a única forma que podemos tentar para mudar as coisas agora, sem ir para a prisão, é a via evolucionária”. “Não somos a favor de uma revolução, não somos aqueles que têm confrontos com a polícia. Somos os que vão tentar insistentemente mudar a situação através de medidas pacíficas”.
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