“Eu sou ministro do Estado, para além de ser ministro dos Negócios Estrangeiros, portanto tenho especiais responsabilidades em pautar a minha conduta pelo sentido de Estado. E julgo que os líderes políticos, incluindo o líder do maior partido da oposição, devem fazer o mesmo. Nós devemos ser estadistas quando estão em causa questões de Estado”, declarou, em Bruxelas, à margem de uma reunião dos chefes de diplomacia da UE.

Um dia após o presidente do PSD, Rui Rio, ter sugerido que a realização de eleições legislativas em 30 de janeiro influenciou a detenção de João Rendeiro, no sábado, na África do Sul, Augusto Santos Silva, questionado sobre se esse comentário então representou falta de sentido de Estado, limitou-se a dizer que já tinha respondido à questão.

“Já respondi à sua pergunta, não tenho mais nada a aconselhar”, declarou.

No domingo, Rui Rio questionou o ‘timing’ da detenção do ex-banqueiro numa publicação na sua conta na rede social Twitter. “O diretor da PJ [Polícia Judiciária] deu uma conferência de imprensa de manhã. Depois esteve na RTP às 13h, na CMTV às 17h, na CNN às 19h e, exibindo o seu dom da ubiquidade, conseguiu estar às 20h, ao mesmo tempo, na SIC e na TVI. Pelos vistos, o azar de João Rendeiro foi haver eleições em janeiro”, escreveu.

A posição do líder social-democrata diverge dos elogios que foram feitos à Polícia Judiciária (PJ) ao longo do espetro político-partidário, pelo primeiro-ministro, António Costa, pelo secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, pela coordenadora do BE, Catarina Martins, pela direção do Chega e pelo presidente da Iniciativa Liberal, João Cotrim Figueiredo.

Sobre o processo em si, Augusto Santos Silva disse hoje esperar que “continue a desenrolar-se no quadro em que se tem desenrolado até agora, isto é, de uma cooperação exemplar entre as autoridades judiciárias dos dois países, Portugal e a República da África do Sul”.

“Tenho, como ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, a agradecer à Republica da África do Sul a forma exemplar como tem respondido aos nossos pedidos, à luz dos mecanismos internacionais de cooperação aplicáveis”, declarou.

Questionado sobre um eventual apoio consular a João Rendeiro, o ministro disse que, “quanto à pessoa em causa, como qualquer outro português no estrangeiro sujeito a um processo judicial, ele pode beneficiar de proteção consular”, mas, tanto quanto sabe, “não a requereu até agora”.

“De qualquer forma, a embaixada portuguesa em Pretória fez deslocar para Durban o conselheiro da embaixada, portanto um diplomata português, para acompanhar o processo, e o nosso cônsul honorário em Durban também esteve hoje no tribunal para que possamos ter todas as informações indispensáveis o mais rapidamente possível”, apontou.

João Rendeiro foi hoje presente no tribunal na cidade costeira de Durban, na província sul-africana do KwaZulu-Natal, depois de ter sido detido no passado sábado, numa operação que resultou da cooperação entre as polícias portuguesa, angolana e sul-africana.

A audição do ex-banqueiro João Rendeiro no tribunal Verulam Magistrates foi hoje adiada para as 11:00 (09:00 em Lisboa) de terça-feira após pedido da defesa, segundo a decisão do juiz, isto depois de a sua equipa de advogados ter pedido ao tribunal a libertação sob fiança.

O ex-banqueiro estava fugido à justiça há três meses e as autoridades portuguesas reclamam agora a sua extradição para cumprir pena em Portugal.

O ex-presidente do extinto Banco Privado Português (BPP) foi condenado em três processos distintos relacionados com o colapso do banco, tendo o tribunal dado como provado que João Rendeiro retirou do banco 13,61 milhões de euros.

O colapso do BPP, em 2010, lesou milhares de clientes e causou perdas de centenas de milhões de euros ao Estado.