Os estudantes estranharam ouvir um segundo alarme de incêndio. O primeiro tinha sido um ensaio, planeado, mas o segundo causou estranheza. Todavia, começaram a dirigir-se para a saída. Eram 14h30 (hora local).
"As pessoas iam a meio das escadas e simplesmente parou, o alarme parou. E ouvimos tiros a vir do primeiro andar e vimos as pessoas a correr para o segundo andar. Subimos todos as escadas e fomos para a sala de aula. No momento em que a minha professora estava a fechar a porta foi baleada ali mesmo e morreu. A porta ficou aberta o tempo todo, ele [o atirador] podia ter entrado, a porta estava aberta. Ele podia ter entrado em qualquer momento". O relato é de uma aluna, citada pela BBC, identificada apenas como Alex.
"Eu estava a meio das escadas e o administrador bloqueou-me o caminho e disse: 'voltem para trás, voltem para trás'. Depois de ele dizer isso ouvi quatro ou cinco tiros e escondemo-nos numa sala de aula que estava aberta. Ouvimos imensos pop, pop, pop. Então, se não eram tiros reais era pelo menos um ensaio de emergência, de qualquer forma, pareceu-nos muito sério", conta Zaphena Jasmin à CNN, adiantando que se refugiou com um colega no canto de uma sala de aula e rezaram juntos.
"Ouvimos tiros e corremos para a rua. Ninguém sabia nada do que se estava a passar, o alarme [de incêndio] já tinha disparado nesse dia, então estava toda a gente descontraída. Quando ouvimos os tiros corremos para a rua. Fomos para as nossas zonas, nós temos certas zonas para onde temos de ir. Comecei por ouvir uns seis tiros bastante longe, mas ainda assim conseguia ouvir claramente. Assim que terminaram disse a toda a gente que tínhamos de fugir, tínhamos de correr", contou um alunos, citado pela ABC.
No meio do desespero, alguns alunos começaram a contactar os pais, a fazer transmissões em direto através das redes sociais.
"Se eu não sobreviver, amo-vos e estou grata por tudo o que fizeram por mim", escreveu Sarah Crescitelli para os pais. "Não fales assim. A polícia está cima da situação", responderam os progenitores. A troca de mensagens foi partilhada no Twitter por uma jornalista do Miami Herald.
Sarah esteve escondida numa casa de banho durante duas horas e acabou por ser resgatada.
"Está tudo bem? O Ben diz que ouviu uns tiros vindos do liceu Stoneman Douglas", questionou o pai. "Sim, também ouvi uns quantos", respondeu o filho. "Ok. Já acabou? A mãe quer ir buscar-te agora. É isso sequer possível?", questionou o pai. "Não acabou, estamos em lockdown [tudo encerrado]. Não é possível, vocês podem magoar-se". "Ok, amigo. Fica a salvo. Amo-te. Fica a salvo. Esconde-te ou finge-te de morto se estiver um atirador ativo", recomendou o progenitor. Esta foi outra das aflitivas conversas entre pais e filhos partilhada nas redes sociais por uma outra jornalista do mesmo jornal local.
Também neste caso o rapaz de 14 anos foi resgatado e reuniu-se com a família mais tarde.
Joel Leffler, especialista em segurança, estava em viagem quando recebeu uma chamada do seu filho de 16 anos. "Telefonou-me quando estava a fugir para fora da escola. Estava em pânico, ele ouviu uns oito tiros, estava muito assustado", contou o pai ao The Wall Street Journal.
O filho disse-lhe que os tiros pareciam vir do edifício onde a irmã de 14 anos tinha aulas. Ele queria ir procurá-la, o pai insistiu que não o fizesse. Novo telefonema. "Ela estava a sussurrar, estava escondida, depois o telemóvel desligou-se porque ela não queria que ninguém a ouvisse. Passaram 35 minutos até voltar a ter notícias dela, foi um terror", conta Leffler, adiantando que, quando finalmente teve notícias, a filha contou-lhe que uma professora sua tinha sido morta.
Os dois filhos estão bem, em choque, vão precisar de tempo, diz o pai.
Um rapaz de quinze anos, ao ver o atirador, decidiu fingir-se de morto, relatou Sivan Odiz, residente local, ao The Guardian, que falou com o rapaz pouco depois do ataque. "Quando ele se levantou, estavam duas pessoas mortas", acrescentou.
Uma outra rapariga, citada pelo jornal britânico conta que se refugiou debaixo da secretária de uma sala de aula com alguns colegas. O atirador, relata, estava a tentar que saíssem do esconderijo. "Ele estava a provocar-nos e dizia: Hey! Hey! Mas nós não saímos".
À televisão WSB um pai lê uma mensagem desconcertante.
"Estamos em code red [código de emergência] de verdade, vem buscar-me assim que for possível. Não é um ensaio, eu oiço tiros. Acabámos de receber uma notificação de code red, então vem buscar-me assim que for possível. Há tiros na nossa escola. Inferno, uma pessoa morreu, vem já".
Enquanto muitos fugiam, alguém se meteu entre o atirador e a sua próxima vítima. Aaron Feis, treinador assistente de futebol americano no liceu Stoneman Douglas, foi baleado depois de se ter colocado em frente a um estudante para o proteger.
O atirador suspeito foi identificado como Nikolas Cruz, de 19 anos, ex-aluno da escola. Quando parou de disparar, o atirador saiu do liceu e começou a dirigir-se para a escola básica Westglades, que partilha o campus com Stoneman Douglas. Aí desapareceu, tendo sido detido mais tarde pela polícia numa casa em Coral Springs, depois de ser identificado por um professor, relata o The Guardian.
"Não houve confronto. Ele foi detido sem incidentes", contou Scott Israel, xerife do condado de Broward, acrescentando que Cruz tinha consigo várias revistas sobre munições. Investigadores que vasculharam as redes sociais do suspeito dizem que estas eram "muito, muito perturbadoras". No mesmo sentido, Cruz foi descrito pelos outros estudantes como um jovem perturbado, que falava várias vezes de armas e violência. Escreve a CNN que o jovem era órfão e havia sido expulso do liceu por razões disciplinares. Atualmente, trabalhava numa loja perto do estabelecimento de ensino.
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, lamentou o sucedido: "As minhas orações e condolências às famílias das vítimas do tiroteio da Florida. Nenhuma criança, professor ou qualquer outra pessoa devia sentir-se inseguro numa escola americana. (...) Acabo de falar com o governador Rick Scott. Estamos a trabalhar de perto com as forças de segurança sobre o terrível tiroteio na Florida".
Todavia, nas redes sociais, sob as hashtags #StonemanShooting, #PrayforDouglas e #ParklandShooting há quem recorde Trump que orações não chegam para resolver um problema antigo, o controlo sobre o uso e porte de armas de fogo nos Estados Unidos.
Neste ataque 17 pessoas perderam a vida. Segundo ativitas, trata-se do 18.º incidente do género numa escola nos Estados Unidos desde o início deste ano.
Há em média um tiroteio por semana numa escola, segundo a organização Everytown for Gun Safety, que defende o endurecimento das regras para a posse de armas individuais.
A normalização acaba por ditar que muitos dos tiroteios ocorridos em escolas norte-americanas nunca cheguem às primeiras páginas dos jornais nacionais.
Há três semanas, a 23 de janeiro, um aluno levou uma arma para o liceu, no estado de Kentucky, e começou a disparar à hora do início das aulas. Matou um rapaz e uma rapariga, ambos de 15 anos, como ele.
Na véspera, um adolescente tinha sido ferido a tiro na cantina do liceu, no Texas, e outro, de 14 anos, foi atingido a tiro no pátio da escola, em Nova Orleães.
Nos dias antes, tiros foram disparados contra autocarros ou estabelecimentos escolares no Iowa, Seattle, Califórnia.
Alguns casos passados provocaram forte comoção no país pelo elevado número de vítimas e a sua reduzida idade. Colombine, em 1999, Virginia Tech, 2007, ou o massacre de Sandy Hook, 2013, onde 20 crianças de 6 e 7 anos foram abatidas.
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