“Na nossa Constituição reafirma-se que o Partido Comunista de Cuba [PCC] continua a ser a força suprema da sociedade cubana. Reafirma o Partido Comunista como a força principal”, referiu em entrevista à Lusa a embaixadora Mercedes Martinez Valdés.
“Em Cuba, se surgisse outro partido, seria um partido financiado pelos Estados Unidos e isso nós, cubanos, não queremos. No passado já tivemos muitos partidos, e alguns deles financiados pelos Estados Unidos”, salientou.
Em 31 de outubro, o Governo de Havana volta a apresentar uma nova resolução na Assembleia geral da ONU contra o “embargo económico, comercial e financeiro” imposto à ilha pelos EUA em 1960, um ano após a Revolução cubana, e depois reforçado.
Uma iniciativa que se tem repetido anualmente e com um texto sem grandes alterações, acompanhado por um relatório que atualiza as consequências do bloqueio entre 2017 e 2018.
“Desde abril de 2017 até março de 2018 o bloqueio contra Cuba foi reforçado, agravado e aplicado com mais rigor. E a injusta política de aplicação do bloqueio é o principal obstáculo para o desenvolvimento da economia cubana, e do pleno desfrute de todos os direitos humanos do povo”, assinalou a diplomata, numa referência às medidas adicionais adotadas pela administração do atual Presidente dos EUA, Donald Trump, e que interromperam o período de relativo desanuviamento decidido por Barack Obama.
“Em novembro de 2017, os departamentos do Tesouro, do Comércio e o Departamento de Estado impuseram obstáculos às limitadas oportunidades que tinha o setor empresarial nos Estados Unidos para investir e fazer negócios em Cuba. E reforçou as medidas restritivas impostas aos cidadãos norte-americanos para viajar a Cuba”, acrescentou Martinez Valdés.
A resolução contra o embargo não é vinculativa, mas tem recebido o apoio sistemático da generalidade dos mais de 190 países com assento no fórum mundial, à exceção dos Estados Unidos e Israel.
“Vamos continuar a apresentar a resolução enquanto se mantiver o bloqueio contra Cuba”, assegurou.
“É importante termos o apoio da comunidade internacional e mantemos o interesse em prosseguir o diálogo com os Estados Unidos, a cooperação bilateral, sempre na base do respeito mútuo e igualdade”, disse ainda.
No final de setembro, o Presidente cubano Miguel Díaz-Canel, 58 anos e indigitado em abril, referiu que o seu Governo de partido único pretende uma “relação civilizada” com os EUA.
“Sempre utilizámos esse termo, quando dois Estados falam civilizadamente podemos chegar a um entendimento comum na base da igualdade, do respeito pela nossa independência e soberania”, acrescentou a diplomata.
A aprovação de uma nova Constituição, que deverá ser submetida a referendo nacional em 24 de fevereiro de 2019 após a adoção pelo parlamento de um anteprojeto em julho, é outra das iniciativas do novo poder em Havana, liderado pela primeira vez por uma geração que nasceu após a “revolução castrista”.
“Temos de mudar a nossa Constituição porque a anterior é de 1976, e Cuba tem de adaptar-se às novas condições, às novas mudanças efetuadas antes da eleição do novo Presidente, e depois da sua posse”, especificou a representante diplomática de Havana.
“Temos um processo de aplicação dos vetores económicos e sociais, e dos acordos dos últimos congressos do partido, que temos de inserir na Constituição porque existem muitas mudanças”, afirmou.
No entanto, Mercedes Martinez Valdés assegura que a linha política do novo Governo “será a continuidade” do processo que nasceu “com a vitória de 1959” e esclarece que o processo de alteração constitucional tem participação nacional e será promovido pelo parlamento.
“Depende da vontade do povo. Em Cuba existe sempre uma consulta popular para a análise do anteprojeto e do projeto da Constituição. O processo está a decorrer nos locais de trabalho, nos bairros, nas escolas… É um processo de consulta popular”, assegurou.
O novo texto, e no artigo 68.º, define-se o casamento como “a união consentida voluntariamente entre duas pessoas”, mas sem precisar o sexo, com a diplomata a confirmar que poderá significar a admissão do casamento homossexual.
A ilha de Cuba, 11 milhões de habitantes, confronta-se com problemas económicos graves, apesar dos reconhecidos progressos sociais na educação, na saúde, na atividade desportiva, registados desde a revolução.
“Existem muitos problemas por resolver, mas têm se ser resolvidos por todos os cubanos e não através de ingerências externas”, insistiu.
“O bloqueio é o principal obstáculo para o desenvolvimento económico, mas temos os nossos problemas. Como a existência de duas moedas. O ex-Presidente Raúl Castro, agora o primeiro secretário do PCC, antes de deixar o cargo falou da necessidade de resolver esse problema, mas não é fácil de resolver”, sustentou.
Mercedes Martinez Valdés recusa a ideia de um novo “isolamento” de Cuba, sublinha o reforço das relações com a União Europeia na sequência do histórico acordo de “diálogo político e cooperação” em vigor desde novembro de 2017, e garante que o seu país “vai continuar a apoiar a Venezuela e a Nicarágua”, em nome de “um dever histórico”.
E numa referência às relações com Portugal, a embaixadora cubana sublinha as boas relações, o reforço da cooperação económica e cultural, do intercâmbio entre instituições, e ainda alguma sintonia no campo político.
“Agradecemos imenso o apoio de Portugal contra o bloqueio, mas também a vontade de desenvolver as relações entre os dois países”, afirmou.
“O desenvolvimento das relações entre Portugal e Cuba é um exemplo das relações com respeito, na base da igualdade, o direito à independência, à soberania, questões que estão na Carta das Nações Unidas e nas nossas Constituições”, concluiu.
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