A provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, apontou hoje como "grande falha" do Estado o atraso na construção no novo centro de instalação temporária de imigrantes, prometido em 2018. Na sequência das críticas, o Ministério da Administração Interna justificou atrasos aos quais diz ser "totalmente alheio".

Em comunicado enviado às redações, o Ministério da Administração Interna disse manter a "firme intenção" de construir o Centro de Acolhimento Temporário em Almoçageme, que resulta da "necessidade de haver espaços distintos para acolhimento", já que "o Espaço Equiparado a Centro de Instalação Temporária (EECIT) do Aeroporto Humberto Delgado deve instalar, apenas, os cidadãos estrangeiros com recusa de entrada em território nacional e que aguardam voo de regresso ao seu país de origem, bem como cidadãos abrangidos por decisões judiciais de afastamento de território nacional, deixando de alojar requerentes de asilo".

O ministério da Administração Interna justifica os atrasos com a seguinte cronologia:

- Em 2017 foi celebrado o contrato de arrendamento com a Ordem Hospitaleira de S. João de Deus, proprietária do imóvel, e foi efetuada uma candidatura a financiamento comunitário, no âmbito do Fundo para o Asilo, Migração e Integração (FAMI), para recuperação do imóvel;

- Durante o arranque da empreitada, em 2018, a Associação dos Amigos e Moradores da Freguesia de Colares apresentou um requerimento, tendo o Ministério Público endereçado ao SEF um Pedido de Análise à obra, o qual veio suspender imediatamente a execução da mesma;

- O processo viria a ser decidido favoravelmente ao SEF, através de despacho de arquivamento de 20 de julho de 2020;

- Apesar da referida decisão, a empresa que se encontrava a desenvolver a empreitada intentou uma ação judicial contra o SEF, visando a resolução do contrato;

- No sentido de evitar um maior retrocesso no processo, nomeadamente a necessidade de abertura de um novo procedimento de concurso público para retomar a construção, o SEF alcançou um acordo extrajudicial com a empresa, de forma a prosseguir a obra;

- Atendendo aos atrasos verificados, motivados pelas ações administrativas e judiciais, o SEF comunicou à Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna a desistência da candidatura ao financiamento através do FAMI, devolvendo o valor recebido a título de adiantamento – 580.460,95 euros - conforme previsto na Convenção de Subvenção.

De acordo com Maria Lúcia Amaral, “na primavera de 2018”, o ministro Eduardo Cabrita disse que “Almoçageme, a alternativa em Lisboa, ofereceria ainda melhores condições do que as existentes no Porto, e estaria pronta meses depois”.

“Estamos em 2020 e ela não existe e, para mim, esta é a grande falha do Estado português, a grande frustração sistémica”, apontou ao ser ouvida hoje no Parlamento, na Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, à qual foi chamada a pedido do Partido Socialista, na qualidade de Mecanismo Nacional de Prevenção da Tortura, para falar sobre “condutas atentatórias dos direitos humanos” no Centro de Instalação Temporária de imigrantes do aeroporto de Lisboa.

 A provedora de Justiça voltou hoje ainda a criticar as condições do Centro de Instalação Temporária do aeroporto de Lisboa, apontando que faltou sensibilidade para o problema da sobrelotação.

Aos deputados, a provedora de Justiça lembrou que este é um tema para o qual alerta desde que tomou posse no cargo, em 2017, tendo feito uma primeira visita ao Centro de Instalação Temporária (CIT) do aeroporto de Lisboa logo em novembro desse ano, onde encontrou um surto de varicela, com “pessoas amontoadas, mulheres e crianças, postas em quarentena numa das alas”.

Maria Lúcia Amaral recordou que, na sequência dessa visita, onde encontrou “condições materiais insustentáveis”, reportou e debateu o problema como o ministro da Administração Interna da altura, Eduardo Cabrita, e o então diretor do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, Carlos Moreira.

“Concordámos que a situação era terrível, era insustentável e que só a salvaria, independentemente do que achemos da própria conceção do centro de instalação temporária, só a salvaria a existência em Lisboa de um centro de instalação temporária à semelhança do que existe no Porto, oferecendo às pessoas outras possibilidades de existência em espaço confinado e que era absolutamente urgente”, apontou a provedora.